Traficantes que se autointitulam ‘Bandidos de Jesus’ destroem mais um terreiro de Candomblé
Mãe de santo foi ameaçada por traficantes que dizem ser ‘bandidos de Jesus’
APolícia Civil e o Ministério Público Federal (MPF) investigam um caso de intolerância religiosa contra um terreiro de Candomblé, no Parque Paulista, em Duque de Caxias, na Baixada Flumense. Criminosos, que se intitulam “bandidos de Jesus”, invadiram e destruíram o templo, dando ordens para que o espaço fosse fechado. Este é o 16º caso de ódio a crenças africanas registrado no município neste ano. De acordo com dados da Comissão de Combate à Intolerância Religiosa (CCIR), até agora foram contabilizados 40 ações criminosas na capital, 20 em São Gonçalo e 15 em Campos dos Goytacazes.
“A gente vem fazendo um esforço muito grande para tentar estancar este cenário de violência. Estamos em contato com o governo, prefeituras e municípios, além das comunidades, terreiros e pastores. É um problema de difícil resolução”, destacou o procurador da República Júlio Araújo.
No momento do ataque em Duque de Caxias, a mãe de santo, uma idosa de 85 anos, estava presente e sofreu várias ameaças sob a mira de uma arma. Os bandidos são apontados
como traficantes que tomaram conta do Parque Paulista, ligados à facção Terceiro Comando Puro (TCP). Foi a primeira vez que o terreiro, há mais de 50 anos no bairro, sofreu um ataque, apesar de já ter recebido ameaças.
“Já fecharam quatro espaços religiosos. Nunca passamos por situação parecida. Não vamos voltar, a segurança dela (a mãe de santo) em primeiro lugar”, contou um familiar da mulher, que não quis se identificar.
O babalaô Ivanir dos Santos, da Comissão de Combate à Intolerância Religiosa (CCIR), vai auxiliar os membros do terreiro no encaminhamento do caso no Ministério Público do Rio. O líder religioso fez críticas ao governo do estado que, segundo ele, não tem adotado as medidas prometidas durante reunião com a CCIR e o Ministério Público Federal.
“O mais triste é a inércia das autoridades. Conversei com o governador Witzel para fazermos uma agenda, mas até hoje nada foi feito. Está na hora de o governador chamar para si essa responsabilidade. Se fosse uma igreja cristã ou uma sinagoga, a solução seria imediata. Não dá para fingir que nada aconteceu”, criticou Ivanir.
O governo do Estado respondeu, através da Polícia Civil, que o caso foi registrado por uma integrante do terreiro na Delegacia de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância (Decradi) na manhã de ontem. A especializada faz diligências para apurar as circunstâncias e os responsáveis pelo ataque. A investigação está em sigilo.
Em resposta aos ataques, uma caminhada inter-religiosa será realizada amanhã em Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense, em protesto contra a intolerância religiosa. A concentração será na Rua D’Walmor, às 9h. “O importante nesse momento é a mobilização para que as autoridades comecem a se movimentar. Isso que aconteceu é uma ameaça ao estado laico e à democracia. Precisamos de medidas efetivas”, destacou Ivanir.