Conservador argentino quer lei de delação inspirada na do Brasil
Opositor cita exemplo brasileiro para combater casos de corrupção, um dia após histórico debate na televisão
O candidato conservador à presidência da Argentina, Mauricio Macri, afirmou ontem à noite que pretende, caso vença a eleição de domingo, aprovar uma lei de delação premiada inspirada na brasileira. Em um balanço do debate do dia anterior diante do governista Daniel Scioli, o opositor disse que a “lei do arrependido” permitiria capturar um grupo inteiro de corruptos a partir da detenção de um deles.
“No Brasil deu bons resultados”, disse ao jornalista Joaquín Morales Solá. Macri acredita que uma legislação assim permitirá, além do combate à corrupção, fortalecer a independência e a autonomia dos organismos de segurança.
Questionado sobre por que o tema de política externa teve pouco espaço no debate, Macri afirmou que defendeu a suspensão da Venezuela do Mercosul caso o país não libere presos políticos. Também propôs a revogação do acordo entre Argentina e Irã, firmado em 2013, para ouvir acusados de praticar o atentados contra a Associação Mutual Israelita-Argentina (Amia) em 1994, que matou 85 pessoas.
O promotor Alberto Nisman, encontrado morto com um tiro na cabeça em janeiro, acusara a presidente Cristina Kirchner de usar este pacto para conseguir vantagens comerciais com Teerã. “Temos de ficar do lado dos países que de-
Alfinetada fendem os direitos humanos”, afirmou Macri.
O dia seguinte ao primeiro debate entre dois candidatos à presidência da Argentina foi de análise do desempenho de ambos. Embora ambos não tenham se declarado vencedores, seu militantes se encarregaram de fazê-lo e usaram as redes sociais para “viralizar” os melhores momentos de cada um.
Macri aparece em vantagem nas pesquisas, que o colocam entre 3 e 11 pontos à frente de Scioli, que no encontro de domingo não conseguiu se ater aos tempos determinados. O momento de maior brilho do kirchnerista foi ao responder sobre a expansão do narcotráfico em sua província. “Se você não consegue resolver o problema dos flanelinhas em Buenos Aires, acha que o povo vai acreditar que pode combater o narcotráfico?”
Um grupo de jovens peronistas fez um vídeo caseiro de 25 segundos em que celebra como um gol este trecho do encontro. Quando Scioli termina a frase, exibida em uma gravação, todos correm para lados diferentes fazendo sinais de que Scioli “exterminou” o rival. O vídeo divulgado no Twitter teve mais de 200 mil visualizações ontem.
Macri obteve efeito semelhante ao dizer que Scioli tinha se transformado em participante de um programa ultrakirchnerista e brincar com a fama de não encarar objetivamente perguntas da imprensa. “Você não me respondeu. Bom, não responde a nenhum jornalista na Argentina, então não vou me sentir mal por isso”, disse Macri depois de questionar o adversário sobre o dado governista de que no país há 5% de pobres.
O grande trunfo do candidato opositor nas redes sociais foi o beijo que deu no fim do encontro em sua mulher, Juliana Awada. A expressão de Scioli diante da cena tornou-se o meme do dia. As montagens recortam o governista constrangido e o colam diante de beijos históricos do cinema.
“Macri levou alguma vantagem porque esteve mais seguro e Scioli transpareceu nervosismo. O candidato opositor deixou o confronto com um ar de ganhador. Dito isso sobre a forma, não houve grande troca de ideias e conceitos”, disse ao Estado o consultor político Fede- rico González.
Ambos fugiram das respostas e usaram alguns dados falsos para fundamentar suas perguntas. O site chequeado.com, que se dedica a verificar informações, apontou dezenas de imprecisões. Entre elas, a premissa de Macri de que os aposentados perderam poder de compra com a inflação no período kirchnerista (a pensão mínima aumentou mais que os preços).
Sobre o mesmo tema, Scioli exagerou ao dizer que 3 milhões de aposentados foram incorporados ao sistema de previdência desde 2003 (foram 2,3 milhões). “Dependendo da checagem, somos acusados de ser pagos pelo kirchnerismo ou pela oposição”, disse Laura Zommer, diretora do site.
A campanha termina na quinta-feira. Se usarem a mesma estratégia do debate, Scioli insistirá em vincular Macri a um ajuste econômico a partir da desvalorização do peso. Macri tende a associar o rival aos 12 anos de governo kirchnerista.