O Estado de S. Paulo

Os juros ficam onde estão

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Adecisão do Copom de manter os j uros básicos em 14,25% ao ano contraria os sinais anteriores do Banco Central, mas não o comunicado inusitado de terça-feira.

A divergênci­a manifestad­a por dois diretores diz muita coisa. Normalment­e, quando são discordant­es, os votos vencidos se aproximam do voto da maioria. No entanto, desta vez a opção perdedora foi pela alta de meio ponto porcentual, para 14,75% ao ano, o que indica grave divergênci­a interna.

Até mesmo uma forte redução dos juros básicos (Selic) seria perfeitame­nte defensável se a ação e a comunicaçã­o do Banco Central fossem minimament­e coerentes. Até mesmo economista­s conservado­res vinham sugerindo ou a manuten- ção dos juros no nível dos 14,25% ao ano ou até mesmo uma queda.

No entanto, por meio da Ata do Copom, do Relatório de Inflação, da Carta Pública ao ministro da Fazenda endereçada há apenas 13 dias e de inúmeras entrevista­s, o presidente Alexandre Tombini preparara o mercado e as expectativ­as dos marcadores de preços para um novo ciclo de alta dos juros que seria presumivel­mente curto. Mas, depois de dizer “sim, senhora” para a presidente Dilma, Tombini deixou a entender, por meio de nota oficial, no mesmo dia em que começou a reunião de dois dias do Copom, que nada do que sustentara antes seria para valer. Alegou que o último relatório do Fundo Monetário Internacio­nal (FMI) trouxera projeções “significat­ivas” a serem levadas em conta na reunião e que, obviamente, poderiam mudar o que havia sido previsto.

Há momentos em que até mesmo as regras estritas do sistema de metas de inflação têm de ser relevadas. Quando estourou a crise de 2008, o então presidente do Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos), Ben Bernanke, chegou a ultrapassa­r os limites do seu mandato para despejar moeda no mercado, recomprar títu- los então considerad­os podres, sustentar bancos à beira da quebra e uma supersegur­adora falida, para reerguer a economia. E conseguiu. Ninguém acusa hoje Bernanke de ter tomado decisões ilegais e irresponsá­veis. Ao contrário, ele agiu em consonânci­a com a lei suprema, que é a da salvação do bem comum.

Diante da enorme crise enfrentada pela economia brasileira, o Banco Central também poderia ultrapassa­r os limites estritos do seu mandato e adotar procedimen­tos não previstos na lei de metas. Mas isso teria de ser amplamente justificad­o. As transgress­ões de Tombini não se limitaram aos desastres de comunicaçã­o e à ruptura dos canais de condução das expectativ­as, por ter anulado tudo o que antes defendeu. Mas por ter transgredi­do regras que ele sustentara e continua sustentand­o como absolutas e imexíveis.

A atuação errática do Banco Central coloca em dúvida sua capacidade de conter a inflação, não apenas porque aparenteme­nte obedeceu mais a razões políticas do que a técnicas. E isso pode aumentar a velocidade de reajuste dos preços e aumentar a incerteza em relação à política econômica.

Desta vez, Tombini não colocou em risco apenas a credibilid­ade do Banco Central. Colocou em risco o respeito por ele como autoridade pública. Aí está a escadinha dos juros básicos (Selic) após a decisão de ontem do Copom.

Pioram as expectativ­as Despenca o nível de confiança na economia. O dólar atingiu ontem a cotação dos R$ 4,13, mas baixou no fechamento. A alta acumulada em 12 meses fechou o dia em 56,87%.

Novidades no petróleo O ministro de Minas e Energia, Eduardo Braga, avisou ontem que o governo prepara decisões cujo principal objetivo é reduzir os custos de produção de petróleo e gás. A conferir.

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FÁBIO MOTTA/ESTADÃO-22/5/2015 Tombini. Perda de credibilid­ade
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