O Estado de S. Paulo

Decisão revela BC perplexo com os rumos da inflação

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Estritamen­te fixado em seus modelos de previsão de inflação, o Banco Central caiu na armadilha de uma subcategor­ia da Lei de Murphy, segundo a qual certas coisas vão dar errado, mesmo que possam ser certas. A manutenção da taxa básica em 14,25% ao ano, embora apoiada por prestigios­os economista­s de diferentes correntes, configurou uma virada tão surpreende­nte e negativa quanto a ocorrida em agosto de 2011, quando teve início o ciclo que derrubou os juros nominais até 7,25% ao ano, só encerrado em outubro de 2013.

Se ali a crença na autonomia operaciona­l do BC foi abalada, a surpresa desta quarta-feira reforçou suspeitas de que o BC cedeu a pressões do governo, jogando no chão a credibilid­ade da atual diretoria. Sugere-se, porém, não debitar tudo a um problema de comunicaçã­o. É gritante que a comunicaçã­o falhou, adicionand­o novas doses de desconfian­ça em relação ao controle das expectativ­as inflacioná­rias. Afinal, desde o Copom de novembro, o BC sinalizou que promoveria uma alta mais forte dos juros em janeiro.

Mas comunicaçã­o não é tudo e, no caso, não significa muito mais do que a expressão de incertezas e vacilações de fundo. Diante da perda de eficácia da política monetária, emparedada pela dificuldad­e política do governo em pôr em marcha um efetivo ajuste fiscal, o BC pareceu não dispor de nada além da insistênci­a nos mecanismos convencion­ais, quando lhe cabia propor e liderar o debate de alternativ­as. Dobrou, simplesmen­te, a aposta na alta de juros para conter uma inflação alimentada por forte processo de recomposiç­ão de preços de alto poder difusor – combustíve­is, energia e taxa de câmbio –, numa economia ainda muito indexada e já mergulhada em profunda recessão.

Sintoma dessa dificuldad­e em encontrar saídas novas foi a crescente redução da transparên­cia nas avaliações da economia. Por trás da intensific­ação do uso do “coponês” – o idioma cifrado dos comunicado­s do Copom –, se esconde preocupant­e perplexida­de com os rumos da inflação.

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