O Estado de S. Paulo

Para mercado, credibilid­ade fica abalada

Segundo analistas, súbita mudança de rumo em relação aos juros pode fazer com que próximas declaraçõe­s do BC caiam em descrédito

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Para o mercado financeiro, a súbita mudança de rumo do Banco Central em relação aos juros – até a terça-feira, todos os sinais apresentad­os eram de que haveria uma elevação da Selic – deixou no ar a impressão de que houve ingerência política na decisão. Por isso, analistas avaliam que será difícil recuperar a confiança nos próximos comunicado­s feitos pelo banco.

Para Luiza Sampaio Loss, economista-chefe da Somma Investimen­tos, se o Banco Central tivesse elevado a Selic em 0,25 ponto porcentual, a sua credibilid­ade teria sido menos afetada. “Depois da mudança de sinalizaçã­o nesta semana, de elevação da taxa básica para manutenção, uma alta de 0,25 ponto porcentual mostraria que o BC não está tão ‘dovish’ (suave, mais inclinado a baixar ou manter os juros) nem tão ‘hawkish’ (agressivo, com tendência a subir os juros)”, disse.

Segundo ela, com a manutenção da Selic em 14,25%, o Copom perde credibilid­ade na sua comunicaçã­o para as próximas reuniões e reforça a percepção de que está sem prazo para convergir a inflação para o centro da meta, de 4,5%. “Antes, eles falavam em convergir a inflação para a meta em 2016, depois passaram para 2017 e agora nem falam mais em 2017. Parece que não tem prazo para atingir a meta”, afirmou.

“Se a manutenção da Selic fosse uma decisão independen­te, não seria ruim. Mas ela veio de- pois de uma comunicaçã­o desastrosa de Tombini sobre o FMI, quando ele praticamen­te telegrafou a decisão de hoje (ontem)”, disse Adriano Gomes, sócio da Méthode Consultori­a e professor de finanças da ESPM. Ele fez referência ao comunicado do presidente do BC, Alexandre Tombini, na terça-feira, dizendo que a forte deterioraç­ão nas expectativ­as do FMI para a economia brasileira seria levada em conta pelo Copom .

Segundo Gomes, a forma como a decisão foi tomada só confirmou o temor dos mercados em relação à falta de independên­cia da instituiçã­o. “Além disso, aumenta a antipatia do mercado com Tombini, já que ele mudou a comunicaçã­o do BC entre a última reunião e esta. Há o risco de todas as declaraçõe­s da autoridade monetária caírem em descrédito”, disse.

A opinião do economista-chefe da Garde Asset Investimen­tos, Daniel Weeks, vai no mesmo sentido. Segundo ele, a mudança na comunicaçã­o do Banco Central às vésperas da reunião Copom deu uma conotação de interferên­cia política na

Mensagem decisão de manutenção dos juros. “Havia dúvidas genuínas para não subir os juros. A questão foi o jeito como a decisão foi feita, principalm­ente após a nota do Tombini sobre o FMI. Acabou dando uma conotação de interferên­cia política no Comitê, o que é péssimo para a credibilid­ade do BC”, afirmou.

Para Weeks, o BC vinha dando sinalizaçõ­es “hawkish” desde a ata da última reunião, o que fez com que os investidor­es se posicionas­sem para um novo ciclo de alta dos juros. “Mas o BC mudou o tom e sinaliza para um período de manutenção da Selic. Agora, vai acabar interferin­do na expectativ­a de inflação e provocando uma maior inclinação da curva de juros”, disse.

Na avaliação do economista, a decisão também abala a imagem da instituiçã­o. “Mas, politicame­nte, Tombini está forte, já que ele fez o que a base de sustentaçã­o do governo queria”, disse.

Autonomia. A decisão anunciada ontem pelo BC, depois de vários ruídos na comunicaçã­o, vai elevar a percepção do mercado de que o BC perdeu a autonomia operaciona­l, disse Italo Lombardi, economista-sênior do banco Standard Chartered em Nova York. “Para o mercado, o Brasil já não tinha mais a âncora fiscal e agora pode ter perdido a última âncora que restava, que era a política monetár i a ” , c o mentou.

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