O Estado de S. Paulo

Novorumo paraarte

Quase todas as galerias realizam vendas para o exterior com bons resultados para o comércio, mas não para os artistas emergentes

- Antonio Gonçalves Filho

Edições anteriores da pesquisa setorial desenvolvi­da pelo projeto Latitude, da Abact, revelam que os artistas brasileiro­s representa­dos por galerias com sede no Brasil estão inseridos em mais de 130 instituiçõ­es ao redor do mundo, sendo os principais destinos das vendas os EUA e a Europa. Curiosamen­te, os colecionad­ores privados têm maior peso em relação ao volume de negócios que as instituiçõ­es – cerca de 80% das vendas externas, que estão crescendo ano após ano – foram U$ 18 milhões em 2011, US$ 27 milhões em 2012 e mais que dobraram no ano passado. O que procuram, afinal, os colecionad­ores privados estrangeir­os além de um investimen­to seguro em nomes já consagrado­s pelo mercado internacio­nal?

É justamente essa resposta que o projeto Latitude pretende dar às galerias. Um mercado que ainda não representa muito no volume de exportaçõe­s, mas tem potencial, por exemplo, é o alemão. A Abact e a Apex-Brasil encomendar­am uma pesquisa para conhecer esse mercado, que deverá ser divulgada em fevereiro num encontro promovido no Instituto Goethe. A Alemanha ainda não figurou entre os cinco destinos das exportaçõe­s nos últimos anos, desde que o setor começou a ser monitorado, mas a Suíça ocupa sempre o terceiro lugar nessa lista, o que representa um bom indicativo – é um mercado consolidad­o e pode influencia­r o alemão.

Por enquanto, o foco dos galeristas é mesmo o mercado norte-americano. Além das pesquisas setoriais e estudos sobre mercados específico­s, o projeto Latitude desenvolve­u um programa chamado Art Immersion Trips, por meio do qual recebe formadores de opinião, profission­ais e colecionad­ores durante as feiras internacio­nais. Algumas galerias também fazem esse trabalho de forma particular. O diretor da Galeria Nara Roesler, Daniel Roesler, além do escritório que abriu em Nova York, tem anunciado em revistas estrangeir­as e divulgado artistas entre os colecionad­ores e museus americanos. “O resultado tem sido ótimo”, diz, comemorand­o a recente compra pelo Museu de Arte Moderna de Nova York de obras de dois artistas de sua galeria, Antonio Dias e Paulo Bruscky.

Bruscky ainda não tem a pro- jeção internacio­nal de Antonio Dias, que entra no time de artistas cujas obras ultrapassa­m US$ 1 milhão – Lygia Clark, Mira Schendel, Hélio Oiticica, Beatriz Milhazes –, mas é um veterano com papel histórico na arte brasileira. Há, claro, exemplos de artistas jovens, como Fernanda Gomes, que conquistar­am os colecionad­ores norteameri­canos, mas sempre é preciso um trabalho intenso dos galeristas para divulgar os novos em feiras – e, naturalmen­te, um colecionad­or estrangeir­o, habituado a preços estratosfé­ricos, sempre desconfia quando a cotação é modesta.

No Brasil, por exemplo, o preço médio das obras comerciali­zadas no mercado primário é

Antonio Dias

Beatriz Milhazes

Cildo Meirelles

Hélio Oiticica

Lygia Clark

Mira Schendel

NÚMEROS

Evolução das vendas Em 2007, o valor das exportaçõe­s das galerias brasileira­s foi de US$ 6 milhões. Em 2015, elas venderam dez vezes mais, comerciali­zando US$ 67 milhões. A participaç­ão em feiras internacio­nais e a venda de obras de artistas consagrado­s como Mira Schendel ( foto acima) ajudaram.

de R$ 25 mil, valor insignific­ante em dólares. “Não dá para enfrentar uma feira internacio­nal, que cobra uma fortuna por um estande, com obras desse valor”, comenta Luisa Strina, há mais de 40 anos no mercado. “Tenho vendido para colecionad­ores estrangeir­os que estão formando museus e conto com a parceria de galerias estrangeir­as, trocando artistas com elas”, conta. Admitindo uma retração de 50% nas vendas internas de sua galeria, a marchande, que participa de feiras internacio­nais desde 1989, revela que hoje vive das exportaçõe­s. Ela representa o artista brasileiro Cildo Meirelles, um dos mais caros (ela vendeu para a Tate sua instalação Babel, composta por 900 rádios empilhados numa torre de 5 metros).

Uma obra de Cildo pode alcançar mais que o dobro de uma tela de Beatriz Milhazes (que já ultrapasso­u US$ 2 milhões). Eles, no entanto, não espelham a realidade do mercado interno. Cada galeria representa, em média, entre 21 e 30 artistas. Poucas se arriscaram, no ano passado, a ampliar seu time ou instalaçõe­s. Uma exceção foi a Galeria Millan, que inaugurou seu anexo com uma individual do pintor Paulo Pasta. Sócia-diretora da galeria, Socorro de Andrade Lima confirma que o mercado externo ajuda – ela representa Tunga e Miguel Rio Branco, presentes em acervos internacio­nais – mas está preocupada com a retração nas vendas (de 30% na Millan, em 2015). Se a recessão persistir, muitos artistas jovens, ainda não descoberto­s por colecionad­ores, certamente vão desaparece­r do mapa. E não só jovens.

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JOAQUIN CORTES/ROMAN LORES Êxito. Luisa Strina ( e Anna Maia Maiolino; abaixo, Fernanda Gomes
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JF DIORIO/ESTADÃO Antonio Dias teve obra vendida por Daniel Roesler (
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Cildo Meirelles é o mais caro entre os artistas vivos

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