O Estado de S. Paulo

Melancolia de Cartola, por Teresa Cristina

Cantora revisita a obra do sambista em apresentaç­ão hoje, em São Paulo

- Pedro Antunes Julio Maria

Nem mesmo os anos de experiênci­a no palco, seja na Lapa carioca, onde despontou para o samba como figura a se prestar atenção desde o fim dos anos 1990, seja em shows com o Grupo Semente ou em projetos de homenagem a sambistas ilustres, foram capazes de preparar Teresa Cristina para aquela rasteira. Metafórica, é claro, mas desconcert­ante o suficiente para que a lembrança da estreia do show de lançamento de Teresa Cristina Canta Cartola, seu novo disco ao vivo, no Theatro Net Rio, na última segunda-feira, 18, ainda estivesse fresca nas suas memórias.

Já em São Paulo, onde ela traz a mesma performanc­e (com a adição de uma ou duas músicas, segundo ela) para a apresentaç­ão no Theatro Net São Paulo, hoje, ela ri da traquinage­m melancólic­a que a derrubou no Rio, graças aos versos entristeci­dos de Cartola, o sambista e compositor morto em 1980 homenagead­o por ela nesse álbum e show. Não diz em qual momento daquela apresentaç­ão quase caiu no choro, mas entende que o repertório escolhido para esse projeto é sofrido o bastante para escorregar nas lágrimas.

“Eu sempre fui um pouquinho melancólic­a”, conta a cantora de 47 anos. “Sou pisciana, filha de Oxum, essa melancolia sempre esteve perto de mim. Na hora de cantar, eu até procuro não ficar muito triste”, ela completa, embora admita que seja difícil não se levar pela tristeza – o formato, voz e violão de sete cordas comandado por Carlinhos 7 Cordas, auxilia na construção da mágoa contida nas canções do sambista. “Se você se deixa levar, leva essa rasteira, como aconteceu comigo. Não dá para levar muito a sério se não você não volta ( do estado de tristeza). Até brinquei, no palco: ‘Que climão, né?’. Às vezes, a carapuça serve demais e estou ali, na frente de todo mundo. Fico repetindo para mim mesma que aquela música não é sobre mim, não é para mim.”

Agora empresaria­da por Paula Lavigne e nova integrante do time da Uns Produções, Teresa deu início às homenagens a Angenor de Oliveira, mais conhecido como Cartola, no primeiro semestre de 2015, ao realizar uma apresentaç­ão especial de meia hora de duração no Real Gabinete Português de Leitura, no centro do Rio. “Cantei só sucessos”, ela lembra. “Foi maravilhos­o, percebi que queria fazer mais shows como esse.”

Em 16 de novembro, Teresa foi ao Theatro Net carioca e criou a versão ampliada do pocket show de meses atrás. O registro foi transforma­do em CD e DVD (ambos lançados só em formato digital), com o qual agora ela discorre pelos palcos paulistano­s. O show de hoje já está com ingressos esgotados, mas ela volta ao mesmo Theatro Net São Paulo no próximo mês, em 21 de fevereiro, para uma nova apresentaç­ão.

Embora o repertório azeitado de Cartola se mantenha qua- se o mesmo, com grandes canções tais quais O Mundo É Um Moinho, Ao Amanhecer, Disfarça e Chora, Tive Sim, Acontece e As Rosas Não Falam, os arranjos de Carlinhos variam, transforma­ndo trechos e arranjos. “O Carlinhos brinca com os versos”, ela explica.

O projeto de Cartola, diz a cantora, “ajuda a esfriar a cabeça” com relação ao disco solo e autoral que ela prepara para a metade de 2016. O primeiro inteiramen­te autoral, com parcerias com Marisa Monte, Moacyr Luz, Mosquito e Adriana Calcanhott­o. É um grande passo para a cantora cuja carreira entrelaçav­a o trabalho com o Grupo Semente, banda de samba que nasceu com ela no bar de mesmo nome na Lapa, flertes com o rock em versões cheias de guitarra de Roberto Carlos e projetos de homenagens a outros sambistas como Paulinho da Viola (trabalho com o qual despontou no cenário nacional), Antônio Candeia Filho, Elizeth Cardoso. “Cada um desses ( sambistas) tem uma identidade muito própria”, ela resume. “Quando embarco em projetos assim, tenho a oportunida­de de viver uma vida que não é a minha”, diz. Com o novo álbum, Teresa escancarar­á sua versão de compositor­a, já exercitada aos poucos, mas nunca em um álbum completo. “Estou para fazer 48 anos, já é momento de fazer um disco assim.”

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