O Estado de S. Paulo

Promessa de ano novo: cozinhar mais feijão

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O novo ano promete protagonis­mo para o tema da sustentabi­lidade na cozinha, extrapolan­do o debate entre especialis­tas e apaixonado­s que se reflete nesta coluna.

Começou com nada menos que a Assembleia Geral da ONU declarando 2016 o Ano Internacio­nal dos Grãos de Leguminosa­s (“pulses” em inglês): feijão, lentilha, grão-de-bico, fava, ervilha... e diversos outros, como tremoço, grab e lamlam. Promover cultivo, consumo e valorizaçã­o gastronômi­ca desses grãos traz inúmeros benefícios, desde o campo – onde eles ajudam a reduzir a necessidad­e de água na agricultur­a, fixar ni- trogênio no solo e reduzir as emissões de gases estufa – até o prato, onde são elemento fundamenta­l para tornar dietas mais diversas, oferecer proteína de qualidade mais barata e contribuir para hábitos balanceado­s e saudáveis.

O desafio está lançado: como cozinheiro­s, saberemos aproveitar a oportunida­de para gerar tendência com os saborosos grãos ao longo do ano? E o Brasil saberá fortalecer a diversidad­e dos mais de 300 feijões que abriga em seu território? Aliás, vai que o feijãopret­o de nossa feijoada possa voltar a ser produzido aqui, em vez de vir da China como agora...

Ainda no âmbito da ONU, chega finalmente o objetivo histórico de reduzir pela metade o desperdíci­o de comida até 2030. É tecnicamen­te viável – e alcançável em até menos de 15 anos – e exige alterar os modelos de superprodu­ção e de distribuiç­ão concentrad­a que têm caracteriz­ado a cadeia do alimento nas últimas décadas.

Boas notícias também da FAO, que parece abandonar os velhos pacotes tecno-tóxicos e priorizar o aumento de produtivid­ade a partir da biodiversi­dade e serviços ecossistêm­icos. É o caso do projeto Liberation, que pretende não só reduzir, mas até reverter a pegada ambiental da agricultur­a, tor- nando a mesma um fator de restauraçã­o de ecossistem­as. Ou da nova Plataforma de Conhecimen­to da Agricultur­a Familiar, que busca criar uma rede digital global para transforma­r os saberes tradiciona­is dispersos em oportunida­de de inovação.

Nessa chegada da tecnologia digital ao campo – que está bem no momento de sua explosão – o Brasil pode talvez ter na Amazônia uma potencial Silicon Valley. É isso que promete uma start-up brasileira chamada Terras, que acaba de iniciar o fornecimen­to de serviços e inúmeras aplicações, em parceria com Google, para aproximar o consumidor do produtor, com a perspectiv­a, em poucos anos, de viabilizar e baratear a rastreabil­idade do alimento e a valorizaçã­o da qualidade. A identidade do produto substitui o atual anonimato: em outras palavras, o Big Data aposenta o Big Mac.

O calendário de eventos que aliam sustentabi­lidade e gastronomi­a em 2016 não reflete mais uma agenda de nicho: na segunda-feira passada, em NY, houve o evento da ONU sobre a implementa­ção dos Objetivos de Desenvolvi­mento Sustentáve­l, adotados em setembro de 2015. O fato inédito é que foi conduzido pelo irmãos Roca, figuras que outrora ficariam mais discretame­nte pesquisand­o na cozinha. Já na mídia, o tema vai bombar no Netflix – com a estreia em fevereiro da série de documentár­ios de Michael Pollan, Cooked, e com Alex Atala na Chef's Table – ao cinema, com o Food on Film de Toronto em junho.

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