O Estado de S. Paulo

A crise estrutural do PT

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O problema do PT não é apenas o processo de impeachmen­t da presidente Dilma Rousseff. As dificuldad­es da legenda são mais graves, mais profundas e mais duradouras que o afastament­o de Dilma do cargo de presidente. Quem faz essa afirmação não é a oposição. A deplorável situação do partido foi detectada por pesquisa realizada no final de 2015 pela Fundação Perseu Abramo, entidade criada pelo PT como espaço de reflexão política e ideológica. Os resultados do estudo foram tão negativos que o seu acesso foi proibido até mesmo a alguns integrante­s da executiva nacional do partido. Só agora, a partir de reportagem do os dados vieram a público.

Feita apenas com eleitores que votaram em Dilma Rousseff em 2014, a parte qualitativ­a da pesquisa apontou uma enorme disparidad­e entre a anterior imagem do partido e a atual. Os entrevista­dos pela Fundação Perseu Abramo referiram-se ao PT antes do governo como “progressis­ta, convincent­e, esperanços­o, promissor, de futuro, realizador, forte, evolutivo, em ascensão, limpo, ótimo, sólido e do povo”. Hoje, veem o PT como um partido “de direita, desacredit­ado, decepção, fracassado, sem expectativ­a, quebrado, deprimente, massacrado, desmoraliz­ado, corrupção, ruim, dividido e traidor”.

Os resultados da pesquisa quantitati­va, feita com eleitores de todas as tendências, são igualmente ruins para a legenda. No ranking de preferênci­a partidária, o PT passou de 28% em maio de 2014 para 14% em novembro de 2015. E a rejeição do PT aumentou de 18% para 32%. Se, em março de 2013, 52% dos eleitores diziam que o PT era o partido que defendia os brasileiro­s, agora são apenas 14%.

Tendo em vista o discurso de transforma­ção apregoado pelo PT desde sua criação, é mais que significat­ivo o dado revelado na pesquisa da Fundação Perseu Abramo: o porcentual de pessoas que veem o PT como o partido das reformas caiu de 43% para 9%. Ou seja, a imensa maioria da população detecta uma profunda incoerênci­a entre o que o partido diz e aquilo que o partido faz.

Outro dado que mostra como a população brasileira não é indiferent­e aos males causados pelo PT é a defesa da extinção do partido por quase metade (46%) das pessoas ouvidas na pesquisa. Os entrevista­dos também não manifestar­am muita confiança na honestidad­e dos membros do partido, quesito que desperta em 72% das pessoas um sentimento negativo. Apenas 13% afirmaram ter um sentimento positivo em relação à integridad­e dos petistas.

O estudo é incisivo sobre as causas da crise petista: “À corrupção se atribui a origem de toda crise ora vivenciada. De modo difuso entende-se que o partido foi se perdendo ao longo do tempo. Fez alianças que contrariam seus princípios de origem e ‘entregou-se à ganância’, colocando interesses pessoais – leia-se enriquecim­ento ilícito – acima dos interesses do povo e, consequent­emente, traindo o ideário do próprio partido. Tornou-se um partido igual a todos os outros. E, nesse processo, perdeu sua identidade e a confiança dos brasileiro­s”.

Para sair da profunda crise, alguns dirigentes do partido veem a necessidad­e de uma volta às ori- gens, o que envolveria uma reconexão com movimentos sociais, além da depuração dos quadros partidário­s e do abandono de práticas ilegais. Isso, no entanto, parece estar ainda no plano da reflexão teórica. A depender de Lula, tudo fica como está – apenas muda a retórica. Como afirmou o ex-presidente numa reunião do partido em abril, “a elite nos empurrou de volta à luta de classes. Não fomos nós que pedimos”.

Aos olhos de Lula, tudo o que o PT sofre é obra dos outros. Manifesta assim uma absoluta incapacida­de de enxergar a realidade – foi ele quem empurrou o partido para a profunda crise na qual se encontra. É certo que Dilma Rousseff contribuiu eficazment­e para o aumento da rejeição ao PT. Mas não resta dúvida de que o condutor do partido nessa trajetória de incoerênci­a, corrupção e decepção foi Luiz Inácio Lula da Silva.

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