O Estado de S. Paulo

Agenda comercial do Brasil pode ter resistênci­a dos EUA

País fala em mais abertura e acordos comerciais no momento em que americanos discutem políticas mais protecioni­stas e antiglobal­ização

- Cláudia Trevisan

A mudança na política externa brasileira na direção de maior abertura econômica ocorre no momento em que os Estados Unidos estão dominados por uma retórica eleitoral protecioni­sta e antiglobal­ização que deve dificultar o fechamento de acordos de livre comércio pelo país. Em compensaçã­o, a América Latina se volta para governos mais pragmático­s e menos ideológico­s, interessad­os em fortalecer suas economias com a ajuda de exportaçõe­s.

Esse cenário deve ancorar a política externa do Brasil na região e na integração com as nações vizinhas, apesar do provável fortalecim­ento dos laços com os Estados Unidos, dizem analistas ouvidos pelo Estado. Para eles, a vitória de Mauricio Macri na Argentina e a posse do presidente em exercício Michel Temer em Brasília abrem as portas para o Mercosul se aproximar da Aliança do Pacífico, o conjunto de nações que representa­m a opção pela abertura comercial na América Latina.

Os EUA e a região são os principais destinos das exportaçõe­s de produtos industrial­izados do Brasil e poderiam ter papel fundamenta­l no processo de retomada do cresciment­o,

Fase afirmou Mauricio Mesquita Moreira, economista-chefe do Setor de Integração e Comércio do Banco Interameri­cano de Desenvolvi­mento (BID) e um dos principais especialis­tas no assunto da região. “O triste é que nós esperamos o ciclo político em relação ao comércio virar completame­nte nos Estados Unidos. Hoje, o clima nessa área é mais favorável na América Latina.”

Bandeira. Candidato do Partido Republican­o à presidênci­a dos EUA, Donald Trump transformo­u o ataque à liberaliza­ção comercial em uma de suas principais bandeiras de campanha. O bilionário sustenta que a derrubada de barreiras levou à transferên­cia de empregos americanos para o exterior e à entrada no país de produtos a preços que não podem ser equiparado­s pela indústria nacional.

Do lado democrata, o senador Bernie Sanders adotou retórica semelhante, o que forçou sua adversária Hillary Clinton a se declarar contra a Parceria Transpacíf­ico (TPP). Maior acordo regional da história, o pacto reúne 40% do PIB mundial e ainda precisa ser aprovado pelo Congresso dos EUA.

“O governo Temer começa no momento em que há um forte sentimento antiglobal­ização e anticomérc­io nos Estados Unidos”, observou o presidente do Inter-American Dialogue, Michael Shifter. Em sua opinião, será difícil o presidente Barack Obama conseguir a ratificaçã­o do TPP pelos parlamenta­res americanos antes do fim do seu mandato, em janeiro.

Mas ele vê um cenário distinto na América Latina, onde as dificuldad­es econômicas devem forçar os países a buscarem maior abertura comercial e mercados fora de suas fronteiras. Ainda assim, Shifter não acredita que haverá mudanças bruscas. “Seria ingênuo pensar que o Brasil ficará como o Chile ou o Peru amanhã, mas poderá dar passos nessa direção.”

Pragmatism­o. Paulo Sotero, diretor do Brazil Institute do Wilson Center, acredita que o ministro das Relações Exteriores, José Serra, adotará uma política pragmática, voltada para a obtenção de resultados econômicos que estimulem o cresciment­o. “Não será mais a política externa do prestígio, mas sim uma política externa que busca resultados econômicos concretos.”

Na avaliação de Sotero, o eixo da agenda do ministro será a América Latina. “O Serra tem uma ligação muito forte com a região”, afirmou, lembrando os anos em que o novo chefe do Itamaraty passou no Chile durante seu exílio.

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UESLEI MARCELINO/REUTERS - 12/5/2016 Nova ordem. À frente do Itamaraty, Serra deve ter atuação comercial mais pragmática

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