Cardeal fica preso em meio a tiroteio no centro do Rio
Confronto entre PMs e traficantes obrigou D. Orani Tempesta a sentar na calçada para escapar dos tiros; um homem morreu
O arcebispo do Rio de Janeiro, cardeal d. Orani Tempesta, teve de saltar às pressas do carro em que estava para se proteger de um tiroteio entre policiais militares e criminosos em Santa Teresa, na região central do Rio, por volta das 9 horas de ontem. O religioso seguia do Cristo Redentor, no Cosme Velho, para o Aeroporto Santos Dumont, no centro. Sentado na calçada, ele aguardou o fim do confronto por cerca de dez minutos, ladeado por pessoas que também correram em busca de proteção.
O tiroteio confrontou PMs do 5.º Batalhão e da Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) dos Morros da Coroa, Fallet e Fogueteiro e traficantes de drogas da Favela do Fallet. De acordo com a versão policial, os criminosos atacaram os PMs, que reagiram. Dois suspeitos foram baleados e encaminhados para o Hospital Municipal Souza Aguiar, no centro. Carlos Eduardo Nogueira da Silva, de 20 anos, morreu após ser socorrido.
Depois do confronto inicial, um grupo de moradores da favela interditou, à tarde, a Rua Itapiru, no Catumbi (bairro da região central na parte baixa de Santa Teresa). Os manifestantes criticavam a ação da polícia e chegaram a incendiar um ônibus. Por volta das 16h45, a polícia liberou o tráfego na rua.
No vizinho Morro do Querosene, na área da UPP São Carlos, no Estácio, também na região central, foi encontrado o corpo de um homem sem documentação. A Polícia Civil investiga se a morte teve relação com as trocas de tiros.
“Sociedade doente”. Em meio aos conflitos, o cardeal e as pessoas que estavam na área trataram de se proteger. D. Orani estava no banco traseiro do carro quando o trânsito parou. No site da Arquidiocese do Rio, o cardeal divulgou uma foto dele aguardando o fim do tiroteio – sentado na calçada e mexendo no celular – e o seguinte texto: “( Estava) voltando do ( Cristo) Redentor e indo para o aeroporto. Junto com muitos outros passageiros de ônibus e outros veículos. Ficamos uns dez minutos. Quando amainou um pou- co, demos marcha a ré e pegamos outra rua. Os ônibus à frente continuaram parados. Não sei como terminou.”
O religioso seguiu para Valinhos, no interior paulista, e voltou a falar sobre o caso. “São essas coisas que acontecem no mundo de hoje, bastante complexo. A sociedade está doente e precisamos construir uma nova, mais justa, humana e solidária, em que as pessoas possam viver com dignidade. Onde está o povo do Rio, eu estou. Compartilho das suas aflições.” A Polícia Militar fracassou ontem na tentativa de prender criminosos que atuam no complexo de favelas do Morro São José Operário, zona oeste, onde nos dias 21 e 22 de maio uma adolescente de 16 anos foi estuprada, no caso que ganhou repercussão internacional. Os PMs terminaram a operação sem prender ninguém nem apreender armas ou drogas.
A agressão sexual sofrida pela jovem aconteceu em duas casas abandonadas no Morro da Barão, que integra o complexo. A delegada que investiga o crime, Cristiana Onorato Bento, da Delegacia da Criança e Adolescente Vítima (DCAV), pediu a prisão de três traficantes locais acusados de envolvimento no estupro e foragidos: o chefe do tráfico, Sérgio Luiz da Silva Júnior, o Da Russa; Moisés de Lucena, o Canário; e um homem conhecido como Perninha.
A ação no complexo foi feita por policiais militares do Grupo de Ações Táticas (GAT), do 9.° Batalhão (Rocha Miranda, zona norte) e do 18.° Batalhão (Jacarepaguá, zona oeste). Segundo a corporação, a ação teve o objetivo de “proporcionar maior sensação de segurança aos moradores da região e prevenir os crimes de roubo de veículos, de cargas, de rua e o tráfico de drogas”.
Conclusão. De acordo com policiais da DCAV, as investigações sobre o estupro deverão ser encerradas na próxima semana. A única possibilidade de as apurações prosseguirem é se os resultados das perícias nos celulares e nos locais de crime revelarem novos fatos.
A delegada deverá indiciar pelo estupro os acusados Raí de Souza, de 22 anos; Raphael Assis Duarte Belo, de 41; o traficante Moisés Lucena, o Canário; e Perninha. Raí e Belo já estão presos. Uma perícia preliminar no primeiro vídeo detectou quatro vozes diferentes no quarto onde a adolescente foi violentada.