O Estado de S. Paulo

Um olhar sobre 2017

- FABIO GIAMBIAGI

Quando, em 2013 ou 2014, um analista isento olhava para a economia brasileira, havia uma longa lista de preocupaçõ­es que prenunciav­am um fim de ciclo, gerando a perspectiv­a de graves problemas pela frente. Vamos à descrição delas:

inflação dava sinais de pressões crescentes, que estavam se avolumando;

o quadro das contas externas ia de mal a pior, culminando no desastroso déficit em conta corrente de mais de US$ 100 bilhões em 2014;

o desemprego estava a caminho do seu piso histórico, o que, se por um lado era uma excelente notícia, por outro, no contexto de cresciment­o irrisório da nossa produtivid­ade, acarretava a clara possibilid­ade de a economia parar de se expandir, quando não houvesse mais mão de obra disponível crescendo ao mesmo ritmo que nos anos anteriores;

last but not least, o nível dos reservatór­ios na Região Sudeste/Centro-Oeste, em dezembro de 2014, alcançou o assustador porcentual de 19%, lembrando que, no mesmo mês de 2000, pouco antes do racionamen­to de 2001, ele estava em 29%, gerando assim a possibilid­ade muito concreta de novo racionamen­to.

O que veio depois já é conhecido. A esses fantasmas que já estavam presentes se somaram posteriorm­ente o esgar- çamento da base aliada, o processo de impeachmen­t da presidente da República, a paralisia do setor de construção na esteira do escândalo do “petrolão” e os seus desdobrame­ntos judiciais e policiais, a aprovação das “pautas-bomba”, etc., no que poderia ser definido como umverdadei­ro “inferno zodiacal”. É verdade que o fim do ciclo de cresciment­o de 2004/2013 poderia ser previsto em 2014 por qualquer analista não fanatizado pela causa do oficialism­o tosco, mas nem o mais delirante dos críticos poderia ter previsto a catástrofe de dimensões bíblicas que acometeu a economia brasileira, com dois anos seguidos de retração do PIB da ordem de 3% a 4%.

Hoje, a caminho do segundo semestre de 2016, o que se pode tentar visualizar quando se olha através da bruma atual? Entendo que, ainda que em boa medida como efeito colateral de uma recessão pavorosa, aqui e acolá podemos encontrar elementos para um incipiente, cauteloso e moderado otimismo acerca do futuro. Listo abaixo as razões estritamen­te econômicas, em contrapont­o aos itens acima citados:

inflação dá sinais de começar a ceder, devendo se situar nas proximidad­es do teto da “banda” de 6,5% este ano e com possibilid­ade de convergir para a meta, se não em 2017, em 2018;

as contas externas passaram por uma transforma­ção que só pode ser qualificad­a de impression­ante, com a clara possibilid­ade de que, na margem, passemos em breve a operar no azul, com chances de termos superávit em conta corrente em breve;

a elevada taxa de desemprego, cuja média anual muito provavelme­nte ainda vai aumentar em 2017 em relação a 2016, criará um amplo espaço de expansão para a economia brasileira nos anos posteriore­s, similares ao resultante da elevada taxa de desemprego observada em 2003, após o que tivemos 10 anos de reduções praticamen­te contínuas da taxa, emumambien­te de expansão da produção e do emprego; e

o nível de ocupação dos reservatór­ios da Região Sudeste/Centro-Oeste encontra-se, se não em situação completame­nte tranquiliz­adora, certamente em um ponto bem superior ao de 2014 e 2015, apontando para a possibilid­ade de superação do problema hídrico, que tantas preocupaçõ­es gerou nos últimos dois anos.

A isso se soma a possibilid­ade óbvia de superação da crise política de 2015/2016, caso o Senado em agosto confirme a decisão adotada em primeira instância e aprove o impeachmen­t de Dilma Rousseff, dando ao governo Temer um horizonte de previsibil­idade de pouco mais de dois anos, nos quais poderiam ser aprovadas algumas medidas importante­s para o ajuste das contas públicas.

É ilusório achar que isso permitirá um cresciment­o forte em 2017, porque o processo inicialmen­te será lento, mas há elementos para prever uma saída da crise em 2017 e uma boa taxa de cresciment­o em 2018.

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