O Estado de S. Paulo

‘Podemos ter números começando a ficar azuis no fim do ano’

Avaliação de Vale é que retomada da confiança deve levar economia a crescer 2% em 2017

- Márcia De Chiara

O economista-chefe da MB Associados, Sergio Vale, melhorou as projeções para a economia brasileira até 2018. Agora, espera cresciment­o de 2% para 2017, ante uma estimativa anterior de avanço de apenas 0,6%. As novas projeções consideram a saída definitiva da presidente Dilma Rousseff e a melhora na confiança por conta da nova equipe econômica do presidente em exercício Michel Temer. Os fatores de risco seriam a volta de Dilma ao governo e algum respingo político em Temer da operação Lava Jato. Neste último caso, a situação ficaria politicame­nte mais complicada, diz. Já a volta de Dilma jogaria a economia “novamente no buraco”. A seguir, os principais trechos da entrevista.

O que mudou nas expectativ­as desde a posse do presidente em exercício Michel Temer? Mudou bastante coisa. Temos uma perspectiv­a mais positiva do que tínhamos alguns meses atrás. Um grande elemento de dificuldad­e, que era a presidente Dilma Rousseff, com a toda a dificuldad­e que tinha de negociar com o Congresso, de co- locar um ritmo relevante de política econômica. Isso saiu do radar. Ao mesmo tempo, o Temer montou uma equipe excepciona­l, colocando algumas regras que foram, especialme­nte na política fiscal, dando um sinal mais importante ainda de se conseguir aprovar medidas no Congresso. Isso dá uma perspectiv­a positiva para um governo que está começando. Mas há alguns entraves. A primeira coisa é que temos de ter a certeza de que a presidente vai sair. Trabalhamo­s com o cenário que ela saia e não volte.

Qual foi o fator que levou a essa mudança de expectativ­a: a saída da presidente Dilma Rousseff ou alguma decisão que o presidente em exercício Michel Temer tomou? Acho que são as duas coisas. A saída dela em si foi extremamen­te importante. Quando se olha em momentos do passado da economia brasileira, é possível observar uma reação. Com a saída do presidente Fernando Collor (1990-1992) houve uma reação. No momento da crise mais profunda, entre abril e setembro de 1992, a produção industrial caía 10% ao mês. Com a sua saída, dois meses depois estava crescendo 10%, sem ter tido nenhuma grande mudança de política econômica. Apenas por uma questão de confiança, de mudança da liderança política.

Entre as medidas que estão mudando as expectativ­as, qual o sr. destacaria? Acho que a mais importante para dar o sentido de recuperaçã­o da economia à frente foi a regra que prevê que o cresciment­o do gasto público seja igual ao cresciment­o da inflação do ano anterior. É essencial ter regras fiscais e começar a implementa­r isso agora.

Consideran­do o seu cenário básico de que a presidente não retorne, o sr. mudou projeções de cresciment­o do PIB? Nesse cenário que ela não volte, teremos uma queda de 3,3% de PIB este ano, em 2017 sobe 2% e em 2018 cresce 1,7%. O cresciment­o um pouco maior em 2017 seria por conta do efeito rebote, após dois anos e meio de recessão.

Quais eram as projeções? Queda de 4,1% este ano, cresciment­o de 0,6% em 2017 e de 0,3% em 2018. O ponto central é que tanto em 2017 como em 2018 podem ocorrer surpresas positivas. Justamente se olharmos a história. O Collor é um exemplo bastante importante nesse sentido. O efeito confiança da saída de uma presidente que não funcionava é muito grande. Agora, para isso dar certo, primeiro a presidente não pode voltar. Seria retomar um ciclo de caos na economia que estávamos até o começo deste ano. Outra coisa é não ter mais nenhum respingo político em cima do presidente Temer. Se aparecer alguma coisa da Lava Jato envolvendo especifica­mente o nome dele, a situação fica politicame­nte mais complicada.

Há indicadore­s mostrando recuperaçã­o da economia? Alguns indicadore­s de confiança começaram a melhorar gradativam­ente. Mas nos dados de atividade ainda não deu tempo de aparecer. Não teremos reversão drástica nos próximos meses porque justamente há o risco político. Até o 3.º trimestre, vamos ter uma recuperaçã­o muito lenta. Não vai ocorrer um movimento drástico, como no Collor. Naquela época, em dois meses houve uma virada, pois ele saiu imediatame­nte.

O sr. acha que a economia bateu no fundo do poço? O resultado do PIB do 4.º trimestre de 2015 provavelme­nte foi o pior momento. Tivemos um 1.º trimestre melhor do que se imaginava. Se a saída da presidente se confirmar, o 2.º trimestre tende a ser ainda melhor. E confirmand­o que ela não volte, no 3.º trimestre, a chance de ter uma recuperaçã­o importante será muito grande. Podemos chegar ao final de 2016, no 4.º trimestre, com números começando a ficar azuis. Apesar de eu acreditar que essa mudança é mais para o começo de 2017.

O sr. está otimista? Eu estava bastante pessimista antes, com a presidente Dilma Rousseff. Agora estou num momento realista. E o realismo vem pelas condições dadas.

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