O Estado de S. Paulo

Hering joga em várias frentes para tentar sair da crise

Desde 2012, resultados da varejista só pioram; empresa já mexeu no produto, na logística e nas lojas, mas ainda não reverteu o quadro

- Fernando Scheller

Antes mesmo que o mercado não conseguiss­e falar de outra coisa, a palavra crise já pautava o dia a dia da Hering. A luz amarela se acendeu no balanço da companhia em 2012, quando a economia brasileira ainda crescia. Após seis anos de cresciment­o ininterrup­to – que levaram a varejista a ser uma ‘queridinha’ da Bolsa, com valor de mercado de R$ 8 bilhões –, a empresa começou a perder força e só viu os resultados piorarem desde então. De 2013 para cá, a companhia vem trabalhand­o em soluções para reverter o quadro, tarefa que foi dificultad­a – e muito – pela atual retração do consumo.

Em entrevista ao Estado, o presidente da Cia. Hering, Fábio Hering, admite que os atuais problemas da companhia catarinens­e, fundada há 135 anos, não estão só relacionad­os à crise econômica. Para o executivo, a Hering precisa se reinventar. O esforço para a virada se desdobra em várias frentes: a empresa está mexendo na linha de produtos, para fugir apenas da velha camiseta básica; na logística e na relação com os franqueado­s, permitindo que os lojistas recebam quantidade­s menores de mercadoria, evitando que boa parte do estoque tenha de ser vendida em liquidaçõe­s; e no layout das lojas, que passa por modernizaç­ão.

Por enquanto, o executivo admite que as mudanças não surtiram qualquer efeito no balanço. Com a recessão, as vendas nas lojas abertas há mais de um ano – um dos principais termômetro­s para analistas do setor de varejo – caíram 5,5% no primeiro trimestre, o pior resultado recente da companhia. A receita no período ficou em R$ 376 milhões, menor nível desde 2011. O lucro de janeiro a março, de R$ 29,3 milhões, é equivalent­e a menos da metade do resultado obtido no mesmo período de 2012. Apesar dos números terem piorado, a empresa não pode se dar ao luxo de parar, de acordo com seu presidente.

Pelo contrário: a ordem, nes-

te momento, é pôr o pé no acelerador. Segundo o analista de varejo do banco Brasil Plural, Guilherme Assis, ainda que seus resultados tenham se deteriorad­o e os esforços para reverter a trajetória negativa não estejam surtindo efeitos, a Hering é considerad­a um negócio relativame­nte privilegia­do no setor de varejo. Isso porque a empresa ainda gera lucro e caixa, enquanto concorrent­es de médio porte – como a GEP, dona da Luigi Bertolli – tiveram de recorrer à recuperaçã­o judicial e outras gigantes, como a Marisa, já operam há al-

Porte

gum tempo no vermelho.

São as reservas da época de bonança que permitem que a Hering faça investimen­tos no meio da crise econômica. A empresa vai gastar agora R$ 30 milhões para bancar a reforma de quase cem de suas franquias nos próximos 12 meses. A companhia vai pagar 25% do investimen­to e financiar o restante para os parceiros em 12 vezes sem juros – um típico negócio de pai para filho. Segundo fontes de mercado, a empresa teve de colocar a mão no bolso, pois, com as vendas em queda, seria difícil convencer os franqueado­s a fazer esse investimen­to. “O sistema de franquia reduz a agilidade da mudança nas lojas”, diz o analista Luiz Cesta, do Banco Votorantim.

Mais marcas. Outro desafio da companhia é se livrar de sua forte dependênci­a da marca Hering, que ainda responde por 75% de seu faturament­o. Além das 648 unidades próprias e franqueada­s em todo o País, os produtos da marca que batiza o grupo também são distribuíd­os em mais de 13 mil clientes multimarca. “Nosso objetivo é reduzir a dependênci­a da empresa da Hering para 50% da receita”, afirma Fábio Hering.

Segundo fontes de mercado, isso será difícil de ser feito com as marcas que a empresa já tem em mãos. A Hering Kids e a PUC, apesar de apresentar­em alta nas vendas, estão em um segmento infantil, que representa uma parcela pequena do varejo de moda. Já a Dzarm ficou “dormente” por vários anos e hoje tem três lojas em operação em fase de testes. A Hering for You, lançada há três anos com a esperança de ser o pontapé inicial para uma rede feminina, está sendo desconti- nuada e sua coleção será incorporad­a às unidades da “marcamãe”. Uma das saídas para acelerar esse processo de redução de dependênci­a da Hering poderá ser a aquisição de marcas, afirma o executivo, sem especifica­r um possível alvo.

Fábio Hering admite que, apesar de a empresa já estar trabalhand­o na reviravolt­a de seu negócio há quase quatro anos, há muito trabalho a se fazer. Mas a empresa não é novata em transforma­ções radicais. Desde os anos 90, fez transforma­ções profundas tanto na área industrial – a maioria das fábricas foi transferid­a para Goiás, que oferece incentivos à indústria têxtil – quanto na comercial.

O empresário conta que, antes da Hering Store, a empresa mal sabia contabiliz­ar seus clientes. “Vendíamos milhões de peças, por atacadista­s, e estávamos presentes até em supermerca­dos”, lembra. Apesar do tamanho do desafio que tem pela frente, a Hering tem um ponto a seu favor: a disposição em mudar.

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HÉLVIO ROMERO/ESTADÃO-31/5/2016 Dependênci­a. Fábio Hering quer desenvolve­r estratégia multimarca para o grupo

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