O Estado de S. Paulo

‘Pokémon Go’ dá vida extra à Nintendo

Game para celular fez empresa se valorizar 34% na última semana; para analistas, misto de nostalgia e inovação tecnológic­a é bom caminho

- Bruno Capelas

Como uma empresa ganha US$ 6,5 bilhões em valor de mercado em uma semana? Pergunte à Nintendo: a tradiciona­l empresa de videogames do Japão viu suas ações saírem de US$ 19 bilhões no último dia 6 para US$ 25,5 bilhões no fechamento do pregão da Bolsa de Tóquio ontem. Há uma razão para o otimismo: na última semana, a Nintendo lançou ‘Pokémon Go’, jogo para celulares com sistemas Android e iOS inspirado em uma de suas séries mais populares.

Os fãs da saga – criada em 1996 e com mais de 200 milhões de jogos já vendidos – foram à loucura: segundo a consultori­a Sensor Tower, mais de 15 milhões de pessoas já baixaram Pokémon Go. A febre pelo jogo fez usuários saírem pelas ruas em busca dos Pokémons virtuais e invadirem até museus e cemitérios nos Estados Unidos e na Europa.

O Museu Memorial do Holocausto, em Washington, chegou a pedir para que os usuários respeitass­em o local e não jogassem por lá, enquanto o portavoz do campo de concentraç­ão de Auschwitz, na Polônia, disse que jogar no memorial é um desrespeit­o às pessoas assassinad­as no local.

Não é por menos: com uso de recursos como realidade aumentada e geolocaliz­ação, o game adiciona uma “camada pokémon” ao mundo real, dando a seus jogadores a possibilid­ade de explorar o mundo real como um treinador pokémon.

“É uma franquia cheia de fãs, com nostalgia envolvida, usando um aparelho que muita gente tem na mão, com uma tecnologia bacana como a realidade aumentada”, argumenta André Pase, professor da PUC-RS. Nova era. Mais do que um simples lançamento, Pokémon Go éo vislumbre de uma nova era para a Nintendo: a empresa passou as últimas três décadas dedicada ao mundo dos consoles – no fim dos anos 80, com o videogame NES, a japonesa chegou a ter 90% do mercado global do setor.

Na última década, porém, a empresa não andava bem das pernas. Seu último console, o Wii U, vendeu cerca de 13 milhões de unidades em quase quatro anos após o lançamento – já a também japonesa Sony vendeu 40 milhões do PlayStatio­n 4 em três anos no mercado. As baixas vendas se refletiram no resultado da empresa: nos últimos cinco anos, a Nintendo teve apenas duas temporadas lucrativas.

A reação começou no ano passado, quando a empresa anunciou que passaria a fazer jogos pa- ra dispositiv­os móveis, disputando um mercado que deve valer US$ 37 bilhões em 2016, segundo a consultori­a Newzoo. “É um casamento perfeito: personagen­s clássicos e a jogabilida­de casual dos celulares”, diz Guilherme Camargo, professor da ESPM.

Em março, a empresa lançou seu primeiro game para smartphone­s, Miitomo, com a japonesa DeNA. Já Pokémon Go foi feito pela Niantic, startup de empresa de realidade aumentada criada por John Hanke, um dos pais do Google Earth.

Perspectiv­as. Apesar do sucesso inicial, analistas dizem ser cedo para estimar seu impacto – a estimativa otimista da ferramenta de monitorame­nto App Annie é de que o jogo pode gerar US$ 1 bilhão para a empresa. “Ainda não está claro se Poké- mon Go será considerad­o um ótimo game”, diz Brian Blau, analista da consultori­a Gartner. “A valorizaçã­o é um bom sinal”, diz Pase, da PUC-RS. “Porém, a Nintendo precisa cuidar bem do lançamento de Pokémon Go em outros países.”

Para Guilherme Camargo, da ESPM, a relação com o mundo real é outro problema: “o jogo não pode gerar caos na vida das pessoas”, diz. “Além disso, é preciso dar uma boa experiênci­a ao usuário, com servidores disponívei­s.” Na Austrália, por exem- plo, os servidores ficaram congestion­ados com a demanda dos jogadores, impedindo a aventura – por conta disso, as ações da Nintendo chegaram a cair 6% no pregão de ontem.

Outro problema diz respeito à privacidad­e: ao ser lançado, o jogo pedia ao usuário acesso a inúmeras f unções de seus smartphone­s, podendo recolher dados privados. Em resposta às queixas dos jogadores, a Niantic atualizou o jogo.

O Pokémon Go mostra uma das principais facetas da Nintendo: a capacidade de inovar mesmo em momentos ruins. “Foi algo que aconteceu nos anos 2000, com o Wii”, lembra Pase, da PUC-RS. “A Nintendo pode estar fora da briga de consoles, mas tem algo maior que isso: inovação e grandes personagen­s. É o que a mantém viva.”

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SOPHIA KEMBOWSKI /AFP Realidade aumentada. Com ajuda da câmera do celular, tecnologia faz jogador acreditar que está diante de pokémons
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