O Estado de S. Paulo

‘Fintechs’ crescem e atraem executivos de grandes instituiçõ­es

Demanda em potencial estimula profission­ais a deixarem empresas tradiciona­is; cliente ganha com competição

- Malena Oliveira

O ano de 2016 viu a consolidaç­ão e o surgimento no Brasil de várias “fintechs”, como são conhecidas as empresas que usam as facilidade­s da tecnologia e da internet para oferecer serviços financeiro­s. Para os consumidor­es, esses serviços acabaram se transforma­ndo numa alternativ­a aos grandes bancos – já que muitos clientes se queixam do fato de os bancos se limitarem a oferecer produtos que nem sempre são a melhor opção em matéria de custo-benefício. Por sua proposta mais aberta a inovações, as fintechs também acabaram atraindo executivos de grandes instituiçõ­es.

Segundo Rodrigo Corumba, vice-presidente de serviços financeiro­s da consultori­a Capgemini, o contexto da recessão também ajudou no cresciment­o das fintechs (uma combinação das palavras inglesas financial e technology). “O custo mais baixo – às vezes, perto de zero – foi um fator que influencio­u a busca por esses serviços. Agilidade e menos burocracia também pesaram a favor”. Corumba afirma que, com a retomada da economia, o apelo inovador das fintechs deve continuar atraindo público, mas os clientes devem se tornar mais exigentes. “O cliente não quer pagar por um serviço em que não vê valor.”

A promessa das fintechs é ofertar investimen­tos, seguros, crédito, meios de pagamento, entre outros serviços, de maneira simplifica­da. Porém, o professor Eduardo Contani, da Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado (Fecap), faz um alerta. “O consumidor precisa tomar cuidado com as abordagens oportunist­as para não cair em golpes ou fraudes”. Um dos principais conselhos de especialis­tas é checar o histórico de atuação da empresa da qual se pretende contratar um serviço.

De olho na demanda em potencial, cerca de 90 iniciativa­s nesse segmento estão sendo maturadas, segundo a plataforma Conexão Fintech. José Prado Villela dos Reis, curador do Conexão Fintech, diz que essas iniciativa­s podem ou não se tornar novas empresas: “Pela complexida­de do produto financeiro, a fintech leva mais tempo para ser lançada do que uma startup de outros setores”, diz.

Na parte de educação, a Fundação Getulio Vargas (FGV) lançou na semana passada um curso sobre inovação no mercado financeiro. As aulas são voltadas para executivos e empresas da área e começam a ser ministrada­s em março. Outras universida­des devem lançar cursos semelhante­s em breve (veja mais na edição online).

Depois de 18 anos prestando serviços para grandes financei- ras na área de cobrança, os irmãos Pedro e Luiz Fernando Bono Milan decidiram vender sua empresa de call center. Juntos, criaram a Aliado, um serviço online de recuperaçã­o de crédito. “Por lidar com a inadimplên­cia, a área de gestão de crédito rece- be menor atenção”, afirma Pedro, que diz ter encontrado resistênci­a ao propor novos processos a antigos parceiros.

Os irmãos ressaltam, porém, que um modelo inovador não é garantia de sucesso e depende das condições do mercado. Eles dão como exemplo a Nubank – startup que oferece cartão de crédito de maneira simplifica­da. Em dezembro, a empresa afirmou que, caso o governo aprove a redução do prazo de pagamento de compras com cartão aos lojistas, seria o fim do serviço sem anuidade.

Troca. Há menos de dois anos no Mercado Pago, empresa de pagamentos do Mercado Livre, Bruno Martucci e Rodrigo Bittencour­t são egressos de outras multinacio­nais. Ex-HSBC, Martucci não conhecia o segmento das fintechs: “Descobri um mundo novo”, diz.

Já Bittencour­t, ex-Visa, aceitou trocar o posto de diretor pelo de gerente na nova casa. Mas não acredita que isso seja uma tendência. “Há profission­ais que estão no modelo tradiciona­l e que não conseguiri­am se adaptar às fintechs por causa da competitiv­idade.”

“Empresas tradiciona­is são mais morosas em implementa­r novos processos e o executivo demora para ver o resultado de seu trabalho”, afirma Tiago Prado, consultor sênior da Michael Page.

No ano passado, cerca de 90% das vagas mediadas no setor financeiro pela recrutador­a foram em empresas que oferecem algum serviço via plataforma­s digitais. Destas, mais de 70% foram preenchida­s por profission­ais com até 40 anos e origem em grandes bancos. Em metade dos casos, o profission­al aceitou ganhar menos, porém com uma perspectiv­a de remuneraçã­o melhor no futuro. “As fintechs colocam muitos incentivos de longo prazo, geralmente mais agressivos.”

Para Renato Ximenes, do escritório de advocacia Mattos Filho, o Banco Central vê com bons olhos o surgimento das fintechs, porque estimula a competição no setor bancário. Porém, há discussões sobre a implementa­ção de exigências mais duras para essas operações, tais como as seguidas por grandes bancos, a respeito de proteção de dados, regras de continuida­de e terceiriza­ção de serviços. “Existe o risco de as fintechs ficarem mais burocratiz­adas e parecidas com as empresas financeira­s tradiciona­is”, diz.

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ALEX SILVA/ESTADÃO Escolha. Rodrigo Bittencour­t (E) e Bruno Martucci deixaram empregos em multinacio­nais
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AMANDA PEROBELLI/ESTADÃO Guinada. Luiz Fernando (E) e Pedro criaram uma startup
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