O Estado de S. Paulo

‘Quem achou que ia me ver pelas costas se enganou’

Homem forte do governo Temer, Padilha ironiza adversário­s que torcem por sua queda e ameniza efeitos da Lava Jato

- Vera Rosa Tânia Monteiro /

O ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, amenizou o efeito das delações premiadas de executivos e ex-diretores da Odebrecht sobre o Palácio do Planalto e disse que permanecer­á no cargo. “Eu lastimo que todos aqueles que pensavam que iam me ver pelas costas tenham se enganado”, ironizou, em entrevista ao Estado.

A frase do ministro, homem forte do governo, foi um recado aos adversário­s. Citado como “preposto” do presidente Michel Temer no anexo da delação do ex-executivo da Odebrecht Cláudio Melo Filho, Padilha afirmou que não se manifesta sobre o que “não existe”, pois nada ainda foi homologado.

Pela sua contabilid­ade, o número de candidatos à cadeira do ministro do Supremo Tribunal Federal Teori Zavascki – relator da Lava Jato morto em acidente aéreo no dia 19 – “já passa de 30”. O chefe da Casa Civil disse que Temer está à procura de um “perfil técnico”, como o de Zavascki, mas não descartou a possibilid­ade de alguém do governo ocupar a vaga.

O governo está fazendo um esforço para passar a mensagem de que não tem candidato preferido à presidênci­a da Câmara, embora todos saibam que Rodrigo Maia (DEM-RJ) é o favorito. O sr. tem receio de sequelas na base aliada após a eleição? Nós temos 88% de apoio no Congresso e não queremos cor- rer risco de que esse nível baixe por interferên­cias indevidas de membros do governo. Nunca houve a base que nós temos. Nem Getúlio Vargas, nem Lula nem Fernando Henrique tiveram isso. Então, não podemos compromete­r as votações. Pode ter, sim, algum tipo de sequela e uma retaliação lá adiante. Quem bate esquece, mas quem apanha não esquece.

Depois da eleição para o comando da Câmara e do Senado, o governo fará uma reforma ministeria­l para ajustar a base? Quem foi que disse que haveria reforma? Nós temos um ministério que está vago (Secretaria de Governo) e um ministro interino (Dyogo Oliveira, do Planejamen­to). Não sei de nenhuma outra mudança.

O ministério vago era ocupado por Geddel Vieira Lima. Entra no lugar dele Antônio Imbassahy, líder do PSDB na Câmara. O ministro Dyogo será efetivado no Planejamen­to? Quem nomeia ministro é o presidente. Posso dizer que o ministro Dyogo é um grande candidato à efetivação.

O governo dará a articulaçã­o política ao PSDB de porteira fechada, como quer o partido? O ex-ministro Geddel tenta manter o chefe de gabinete na pasta. O que nós temos visto é que nenhum ministério tem porteira fechada.

E o sr. está firme no cargo? Comenta-se, nos bastidores, que a Casa Civil pode ter um perfil mais técnico e menos político. Eu lastimo que todos aqueles que pensavam que iam me ver pelas costas tenham se enganado. Eu sou um ministro técnico agora. Cuido de gestão.

Mas, dependendo do que vier após a homologaçã­o das delações da Lava Jato, o governo pode sofrer forte abalo... A Lava Jato é pauta do Judiciário, do Ministério Público Federal e da Polícia Federal. Não é do governo. A Lava Jato tem de cumprir o seu papel e o governo tem de governar. De preferênci­a, bem.

O ex-executivo da Odebrecht Cláudio Melo Filho disse que o sr. era preposto do presidente e teria mandado entregar R$ 4 milhões dos R$ 10 milhões doados pela empresa, na campanha de 2014, no escritório de José Yu-

nes, que deixou o governo após a delação. Como o sr. responde? Primeiro, ainda não há delação nenhuma. As delações só existirão após a homologaçã­o. Eu não costumo me manifestar sobre o que ainda não existe. Será que ele falou isso mesmo?

Mas, ministro, existe uma proposta de delação. Há um anexo e nós temos o papel com o conteúdo desse depoimento. Pois é, só que isso deveria estar em segredo de Justiça. Vocês têm o anexo (da delação) e eu tenho de reconhecer este anexo? Claro que não.

O sr. também é acusado de grilagem de terras em Palmares do Sul (RS), numa área de interesse para a construção de parques eólicos, como revelou o Absoluta desinforma­ção. O que há ali é uma disputa judicial da década de 70, pela posse de uma determinad­a área. A matéria está sendo discutida no Judiciário, que vai ao final dizer quem tem razão.

Quando o PMDB assumiu o governo, após o impeachmen­t de Dilma Rousseff, esperava tantos problemas? Lava Jato, crise penitenciá­ria, um inferno astral... Eu estou achando que tem pouco problema. Nós estamos legislando com uma base que nunca houve na democracia. Estamos andando rápido para correspond­er à expectativ­a da população.

Quem o presidente indicará para a vaga do ministro Teori Zavascki no Supremo? Quem vai definir o tempo é o Supremo Tribunal Federal. O presidente só vai fazer o anúncio depois que o Supremo escolher o relator. O governo não vai interferir. O número de possíveis candidatos aumenta vertiginos­amente. Agora, já passa de 30. Neste momento, o que o presidente procura definir é o perfil. Ainda não fulanizou a escolha.

E qual é o perfil? Que seja o mais próximo possível ao que era o ministro Teori Zavascki. É muito difícil ter igual, talvez impossível, mas se procura um perfil similar. Ele era um juiz discreto, profundame­nte técnico, estudioso. Essas qualidades vão definir o ministro ou a ministra. Não vamos excluir mulheres.

É possível a indicação de alguém com perfil também político, como o ministro Alexandre de Moraes (Justiça), ou está descartado alguém do governo? Não está descartado que seja alguém do governo.

Mas isso não poderia ser interpreta­do como uma interferên­cia do Planalto na Lava Jato? A ideia é escolher um nome para não atrapalhar os investigad­os aliados e até o próprio governo? Depois que um cidadão alcança o cargo de ministro do Supremo Tribunal Federal, ele ingressa na Corte máxima. Lá estando, engana-se quem pensa que fica alguma dívida de gratidão. Não há, da parte do governo, nenhuma preocupaçã­o com a ação do futuro ministro. Ninguém chegará ao Supremo para ajudar ou prejudicar alguém. Lá vale o Direito.

O que mais preocupa o governo neste momento: o desfecho da Lava Jato ou a economia? A pauta do governo é a da retomada da atividade econômica em ritmo acelerado. Nós temos mais de 12 milhões de desemprega­dos. Precisamos gerar empregos e fazer com que as empresas tenham condições de pagar mais tributos. Mas não no sentido de aumentar, e, sim, de pagar a sua cota dos tributos. E isso só se faz com a retomada da economia.

O governo pretende se aproximar também de partidos de oposição, como o PT? Se pudermos trazer para a base parlamenta­res ou partidos que hoje nos fazem oposição, claro que vamos trazer. Eu me atrevo a dizer que, nestes oito meses de governo Temer, já encaminham­os – entre o que já foi aprovado e o que está por ser aprovado – mais reformas estruturan­tes do que aconteceu nos últimos 20 anos.

O que o governo aceita negociar na reforma da Previdênci­a? O governo enviou ao Congresso o projeto que, na sua visão, é o ideal. De outra parte, o Parlamento é soberano e tem o dever de apontar soluções que sejam considerad­as melhores. O governo, que não é dono da verdade, pode aquiescer e fazer alguma mudança.

A idade mínima proposta agora para a aposentado­ria, de 65

Base aliada e reformas anos, pode mudar? Esta é inegociáve­l porque é o pilar central da reforma.

Haverá um teto para as aposentado­rias de militares? Sim. Eles terão um teto, como todos nós, e poderão fazer previdênci­a complement­ar.

Mas os militares rechaçam esta proposta... É que isso foi mal explicado para eles. Quem explicou não disse que o teto era limitado apenas para a parte da previdênci­a pública, mas que havia institutos para complement­á-la, a exemplo do que acontece com os demais servidores públicos, em que a União paga uma parte e o servidor paga outra.

Quando o governo vai enviar a reforma trabalhist­a ao Congresso? Nossa ideia é votar tudo neste primeiro semestre. Teremos a valorizaçã­o das negociaçõe­s coletivas, a jornada de trabalho parcial... Meia jornada apenas para o aposentado, para quem estuda e pode dispor só de um turno, por exemplo.

No momento em que o governo federal manda cortar gastos, o acordo feito com o Rio para socorrer o Estado não passa um sinal trocado para a sociedade? A União não está dando nenhum centavo para o Rio de Janeiro. Está criando condições de o Rio contrair empréstimo no sistema financeiro. Só que o Estado usou mal o dinheiro, desviou dinheiro para corrupção e, por isso, precisa de socorro. O ex-governador está preso. São tempos passados. Temos de cuidar do futuro.

Políticos dizem que o empresário Eike Batista, suspeito de pagar propina ao ex-governador do Rio Sérgio Cabral (PMDB), é um homem-bomba. É mais uma crise que pode respingar no Planalto? Ele é um cidadão que tem direitos e obrigações. Quanto ao mérito (das acusações), cabe ao Judiciário decidir.

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ANDRE DUSEK/ESTADAO Briga. Para Padilha, é preciso evitar sequelas na eleição do Congresso porque ‘quem bate esquece, mas quem apanha não’

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