O Estado de S. Paulo

Para economista, teto nos gastos do governo vai ajudar na mudança

Aloisio Araujo diz que parte dos futuros superávits pode ser usada para reduzir carga tributária, a partir de 2021

- Vinicius Neder /

Os superávits que passarão a ser gerados com o teto no cresciment­o das despesas do governo federal podem ser usados para viabilizar a reforma tributária. A sugestão é do economista Aloisio Araujo, professor da EPGE, a escola de pós-graduação da Fundação Getulio Vargas (FGV). A ideia é usar parte da economia de recursos gerada pelo teto para reduzir a carga tributária e, ao mesmo tempo, ampliar a participaç­ão de Estados e municípios na divisão das receitas com impostos. As condições ideais para fazer isso estarão colocadas a partir de 2021, quando, nas projeções do pro- fessor, o Brasil terá seu segundo ano de superávit primário, estabiliza­ndo o cresciment­o da dívida pública como proporção do Produto Interno Bruto (PIB).

Para Araujo, o teto para as despesas públicas cria oportunida­de única. A aprovação do limite de gastos no Congresso e a apresentaç­ão da proposta de mexer na Previdênci­a mostram que há “espaço político” para avançar nas reformas estruturai­s, considerad­as por economista­s como necessária­s para o País crescer de forma sustentada.

O economista considera as reformas microeconô­micas fundamenta­is para melhorar o ambiente de negócios no Brasil. Nos rankings que medem isso, como o Doing Business, do Banco Mundial, o País tem ficado nas últimas posições. “Se existir, como está existindo agora, um espaço político para se fazer essas reformas, a gente deve aproveitar e não brincar com a sorte”, diz Araujo, doutor em es- tatística pela Universida­de da Califórnia.

Consenso. Na sua avaliação, há certo consenso entre especialis­tas sobre como reformar o sistema tributário. O problema é que uma reforma sempre foi barrada por causa da resistênci­a de dois grandes grupos: Estados e municípios, que temem perder receita com as mudanças, e o setor privado como um todo, que teme uma elevação da carga tributária.

A proposta ataca justamente essas resistênci­as. A carga tributária de 2016 encerrou em 33% do PIB, conforme estudo dos economista­s José Roberto Afonso e Kleber Pacheco de Castro. Nas contas do estudo, que será publicado online pelo Instituto Brasiliens­e de Direito Público (IDP) amanhã, a carga de tributos da União, incluindo a Previdênci­a, é de 19,56% do PIB, ou seja, mais da metade dos 33% totais.

Nas projeções de Araujo, é possível reduzir a parte que cabe à União, aos poucos, de 2022 em diante. A meta seria chegar a 2027, quando a regra do teto das despesas federais completará dez anos, com 2 pontos porcentuai­s do PIB a menos para a União – 1,5 ponto de redução efetiva na carga total, para 31,5% do PIB, e 0,5 ponto de redistribu­ição entre União e demais governos. Assim, as duas resistênci­as históricas seriam “pacificada­s”. “Com o controle da relação entre dívida e PIB, o governo central pode abrir mão dos tributos em benefícios desses dois objetivos”, afirma.

As contas do professor estimam que o governo federal começará a ter superávits primários daqui a três anos. Em 2020, será modesto, de 0,38% do PIB, mas, em 2027, chegará a 3,29% (veja mais no gráfico acima). Isso ocorrerá porque as receitas subirão com a retomada do cresciment­o do PIB, enquanto as despesas estarão congeladas pelo teto. Consequent­emente, a dívida pública, que subirá até o ano que vem, começará a cair.

A redução da carga seria positiva para todos, especialme­nte para empresas e consumidor­es. Já a redistribu­ição da receita de impostos entre União e demais esferas de governo, além de convencer governador­es e prefei- tos a apoiar a reforma, contribuir­ia para evitar novas crises fiscais nos Estados.

Araujo volta à Constituiç­ão de 1988 para explicar a crise atual. Foi então que os Estados ficaram responsáve­is por vários serviços públicos, mas receberam poucos impostos.

Sem CPMF. O professor prefere não discutir os detalhes de uma possível reforma. As linhas gerais da proposta discutida na Comissão Especial de Reforma Tributária da Câmara dos Deputados são consensuai­s entre os especialis­tas, segundo o economista. Como revelou o Estado há uma semana, a ideia é extinguir sete tributos federais, um estadual e um municipal, e substituí-los por três novos.

Araujo é contra a recriação de uma espécie de CPMF, incluída na proposta da comissão parlamenta­r, mas defende a criação do Imposto sobre Valor Agregado (IVA), cobrado no Estado de destino. Segundo ele, é o sistema usado na maioria dos países.

“Se a União Europeia consegue ter impostos unificados, e são países com línguas distintas, como é que o Brasil não consegue ter ICMS unificado? Os ganhos são tão óbvios que a gente fica se perguntand­o por que não chegamos lá”, questiona.

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MARCOS ARCOVERDE/ESTADÃO - 24/1/2017 Tributação. Araujo defende impostos unificados no País

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