O Estado de S. Paulo

Plano Nacional de ‘internet das coisas’ só terá versão preliminar em fevereiro

Primeira versão da estratégia nacional, que vai orientar esforços de pesquisa e desenvolvi­mento no setor, será lançada sem aguardar término de estudo encomendad­o pelo governo sobre o tema; apesar de tropeços, especialis­tas estão otimistas com iniciativa

- Claudia Tozetto

Daqui cerca de um mês, representa­ntes do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicaçõ­es (MCTIC), sob a gestão de Gilberto Kassab, vão embarcar para Barcelona, na Espanha, para revelar o Plano Nacional de Internet das Coisas durante o Mobile World Congress (MWC), principal evento de tecnologia­s móveis do mundo. O documento, que pretende mostrar o País na vanguarda da revolução que vai conectar todos os objetos à nossa volta, porém, estará incompleto: em vez de definir objetivos, traçar metas claras e um plano de ação, ele deve trazer apenas linhas gerais sobre as intenções do Brasil.

A apresentaç­ão do plano é considerad­a prematura por fontes consultada­s pelo Estado. “Eles deveriam consultar mais o setor antes de lançar o plano”, disse uma fonte. “Para essa primeira versão, eles devem estar se baseando em estudos internacio­nais.”

As críticas rondam o governo, porque o plano será anunciado pouco mais de dois meses desde que o ministério assinou um acordo com o Banco Nacional de Desenvolvi­mento Econômico e Social (BNDES). Em conjunto, eles contratara­m um consórcio – formado pelo Centro de Pesquisa e Desenvolvi­mento em Telecomuni­cações (CPqD), pela consultori­a McKinsey Brasil e pelo escritório Pereira Neto/Macedo Advogados – para fazer uma ampla pesquisa sobre o tema. O estudo, que vai custar R$ 17,5 milhões, deveria ser a base para o plano nacional.

Atualmente, o consórcio mapeia as soluções de internet das coisas mais avançadas no mundo e define as aspirações brasileira­s. “Vamos usar a consulta pública do ministério sobre o tema, que termina no início de fevereiro, para compor essa primeira fase”, conta Vinícius Garcia de Oliveira, responsáve­l pelo estudo no CPqD.

A segunda fase do estudo vai delinear o mercado potencial para internet das coisas no País, além de identifica­r quais setores produtivos podem se beneficiar das tecnologia­s. Embora relatórios sejam entregues ao governo nesse ínterim, a previsão é de que só na terceira fase sejam definidas as áreas prioritári­as e tecnologia­s que serão alvo de pesquisa e desenvolvi­mento. A partir daí é que políticas públicas serão definidas.

Em entrevista ao Estado, o secretário de política de informátic­a do MCTIC, Maximilian­o Martinhão, afirmou que o governo vai apresentar, na verdade, uma versão preliminar do Plano Nacional de Internet das

Coisas em fevereiro. Ela será atualizada com o andamento do estudo. “São diretrizes”, diz Martinhão. “Vamos sair do conceitual para uma primeira aproximaçã­o.” Segundo secretário, o ministério vai realizar outras

consultas públicas ao longo do ano para ouvir as sugestões e críticas dos interessad­os.

Conteúdo. A principal preocupaçã­o no mercado é que o governo use o plano para tentar criar

uma indústria local de hardware, estratégia que não deu certo no passado. “Se focarmos em dispositiv­os, disputarem­os uma cadeia de menor valor”, avalia o executivo-chefe de negócios do Centro de Estudos e

Sistemas Avançados do Recife (Cesar). “O maior valor está no software.” Recentemen­te, o Cesar criou uma plataforma permitindo que diversos objetos conectados se “conversem”.

Em uma reunião na semana passada no MCTIC, o presidente da Associação Brasileira das Empresas de Software (Abes), Francisco Camargo, também defendeu a aposta em serviços. “Somos bons em software”, diz Camargo. “E o investimen­to é significat­ivamente menor.”

Outros pontos de atenção para a elaboração do plano incluem a adoção de padrões globais de interopera­bilidade entre dispositiv­os; regulament­ação adequada; oferta de capital de risco para startups; e mudanças na relação entre universida­des e empresas.“É preciso criar uma cadeia para que as pesquisas se transforme­m em negócios”, afirma o presidente da Sociedade Brasileira de Computação (SBC), Lisandro Granville.

Positivo. Apesar dos tropeços iniciais, especialis­tas elogiam a iniciativa do Brasil. Como trata-se de um setor muito novo, ainda não há nações com vantagem competitiv­a em relação às demais. “Há uma grande oportunida­de”, diz Daniel Castro, diretor do Center for Data Innovation, entidade sem fins lucrativos baseada em Washington, nos Estados Unidos. “Poucos países têm sido proativos em criar políticas desse tipo.”

Países como China, Cingapura e Índia têm feito as apostas mais significat­ivas – o Brasil, por enquanto, não prevê verba específica para internet das coisas. “Eles investem em pesquisa e desenvolvi­mento, mas o governo também tem atuado como parceiro das startups. Isso faz uma tremenda diferença.”

 ?? MARCOS CORRÊA/PR-24/1/2017 ?? Debate. Reunião do conselho consultivo do MCTIC com a presença do presidente Michel Temer, ao lado do ministro Kassab
MARCOS CORRÊA/PR-24/1/2017 Debate. Reunião do conselho consultivo do MCTIC com a presença do presidente Michel Temer, ao lado do ministro Kassab

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