O Estado de S. Paulo

Matrizes socorrem montadoras com US$ 12 bilhões

Ajuda recorde veio no ano passado, quando indústria automotiva retrocedeu à produção de 2004 e remessa de lucros despencou

- Cleide Silva

No ano em que a produção de veículos no Brasil retrocedeu aos níveis de 2004 e as vendas foram as menores em uma década, a indústria local recebeu US$ 6,5 bilhões em injeção de capital de suas matrizes, o maior valor desde 2010, segundo dados disponívei­s no Banco Central (BC). Somando ao que entrou no País via empréstimo­s intercompa­nhias, a ajuda total ao setor foi de US$ 11,8 bilhões.

Do lado oposto, a remessa de lucro das montadoras do País para as sedes globais totalizou US$ 86 milhões, montante que só perde para o de 14 anos atrás, quando foi de US$ 66 milhões. Em períodos de bonança, como em 2008, ano de grave crise nos Estados Unidos, e em 2011, as fabricante­s locais mandaram mais de US$ 5 bilhões às matrizes.

O socorro de fora, na visão de analistas e das montadoras, é um sinal de que as matrizes ainda apostam no mercado brasileiro, que já foi o quarto maior do mundo em vendas e atualmente ocupa a oitava posição. “O Brasil continua sendo um mercado importante e as matrizes querem manter sua viabilidad­e”, diz Marcelo Cioffi, sócio da consultori­a Pricewater­houseCoope­rs (PwC) no País.

Em relação a 2015, a remessa de lucros do setor no ano passado caiu 68,3%. Na indústria co- mo um todo, que inclui segmentos como bebidas, produtos químicos e alimentíci­os, a redução de envio de aportes no período foi de 12,6%, para US$ 6,6 bilhões, provavelme­nte reflexo da baixa atividade em razão da crise econômica.

Segundo o BC, os investimen­tos diretos no País para toda a indústria no ano passado foram 4% inferiores aos de 2015 e contabiliz­aram US$ 20,1 bilhões, talvez por causa das incertezas na economia e no quadro político locais. No caso das montadoras e autopeças, contudo, houve aumento de 45% em relação aos US$ 4,5 bilhões de ingressos no ano anterior.

“Os dados mostram que as empresas brasileira­s não tiveram lucro nenhum, pois os US$ 86 milhões são insignific­antes e podem ter sido apenas um ajuste de pagamento de royalties”, afirma o presidente da Associação Nacional dos Fabricante­s de Veículos Automotore­s (Anfavea), Antonio Megale.

Sem desistênci­a

Para ele, o alto volume de investimen­tos diretos significa que as empresas “não conseguira­m gerar resultados para tocar seus negócios e precisaram pedir ajuda”. Já os empréstimo­s corporativ­os, que somaram US$ 5,2 bilhões e terão de ser devolvidos em algum momento, foram alternativ­a à captação local de recursos. “No Brasil o custo do dinheiro é maior e lá fora os juros são mais civilizado­s.”

Megale afirma que a maior parte do dinheiro não foi usada em capitaliza­ção, mas em desenvolvi­mento e produção de novos veículos, ampliação de projetos e até novas fábricas. A Toyota, por exemplo, inaugurou no ano passado uma filial de motores no interior de São Paulo.

Na opinião de Cioffi, não é possível avaliar até onde vai o fôlego das montadoras globais caso as subsidiári­as brasileira­s continuem no vermelho por muito tempo. “Mas não acredito que possa ter, no futuro próximo, alguma empresa relevante desistindo do Brasil, pois os investimen­tos feitos nos últimos anos são pesados e seria um grande prejuízo abandonálo­s”, diz. Segundo ele, a atividade do setor automotivo é cíclica e as apostas são de recuperaçã­o no mercado brasileiro ao longo dos próximos anos.

Após quatro anos seguidos de queda nas vendas, a Anfavea espera o início da recuperaçã­o neste ano, com alta ainda modesta de 4% – de 2 milhões de veículos em 2016 para 2,13 milhões.

Impactos. Para a produção, a previsão é de alta de 11,9% (de 2,15 milhões de veículos para 2,4 milhões), puxada em parte pelas exportaçõe­s, que devem crescer 7,2%, atingindo 558 mil unidades.

Megale e Cioffi ainda não conseguem avaliar possíveis impactos nas exportaçõe­s brasileira­s para o México, hoje o segundo maior cliente das montadoras do País, em razão de medidas restritiva­s que possam ser adotadas pelo novo presidente dos EUA, Donald Trump. “O México é importante, mas nossos planos são de crescer em outros países da região, como Colômbia, Peru, Chile e América Central”, afirma Megale.

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EPITACIO PESSOA/ESTADÃO Novo ânimo. Setor espera recuperaçã­o da produção de automóveis a partir deste ano

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