O Estado de S. Paulo

‘Sugiro refazer currículo duas vezes ao ano’

Dirigente de empresa de controle e gestão de frota diz que é preciso se atualizar sempre para poder se desenvolve­r profission­almente

- Cláudio Marques

Formado em 1992 em engenharia naval, Gustavo Chicarino preside desde junho a Ticket Log, empresa de gestão de frotas resultante da joint venture entre a Ticket Car, do grupo francês Edenred, e a empresa nacional Embratec. A Edenred surgiu em 2010 com a cisão da Accor e integra as marcas Ticket, Accentiv’ Mimética e Repom. Chicarino fez MBA pela Esad, na Espanha (com foco em finanças e extensão na Flórida). Ele também fala inglês, francês, espanhol e italiano. Iniciou sua carreira na área financeira do Rodrimar, em Santos, grupo que atua na área de comércio exterior e logística. Depois passou por grandes empresas como a Ori g i n, da Phi l i ps , e Accor/Ticket/Edenred, que também lhe proporcion­aram experiênci­a internacio­nal de trabalho na Itália e Holanda. A seguir, trechos da entrevista.

Na Ticket Log Eu diria que é, pela segunda vez, um divisor de águas importante. Completo 14 anos de Accor/Ticket/Edenred agora em janeiro, mas em 2013 saí de uma área de suporte para ir para uma área de negócios. Eu construí minha carreira com conhecimen­tos que foram se agregando. Sou engenheiro de formado pela Poli-USP, mas trabalhei com toda a parte de finanças, passei por gestão de projetos, novos negócios, estratégia, produtos, marketing. Enfim, fui somando aprendizad­os e prática e, finalmente, em 2013 veio a oportunida­de, em decorrênci­a de uma mudança estrutural grande aqui na Edenred, de tocar uma unidade de negócios.

Preparação Foi bom porque consegui tocar a Ticket Car por dois anos e meio sozinho. Era uma empresa de porte, mas muito mais simples no sentido de que havia coisas que a Edenred fazia para mim, como finanças, RH, operações, tecnologia etc. Aos poucos eu fui trazendo isso para dentro da unidade com o objetivo de fazê-la cada vez mais independen­te.

Dificuldad­es atuais Por exemplo, tenho mais de mil pessoas na empresa e gerir 200 pessoas ( na Ticket Car) é uma coisa e gerir mil, agora, é outra totalmente diferente. Ainda mais eu que tenho a preocupaçã­o de saber quem está comigo, meu lado RH é muito forte, porque eu respeito as pessoas, isso é um ponto importante. Segundo ponto é a governança, a questão cultural. A executiva hoje é mista, nela existem estratégia­s e governança­s diferentes, e isso tem de ser adaptado. O terceiro ponto é que hoje o meu chefe é o conselho de administra­ção. Claro, eu tenho aqui o Giles ( Coccoli, que comanda a Edenred) e eu me reporto para ele, mas no fundo eu tenho de prestar contas para um conselho que tem sócios externos. Por tudo isso, eu também tive de mudar bastante meu perfil, minha forma de antever algumas coisas, ter cuidado com a comunicaçã­o, porque aqui dentro nós nos conhecemos, mas há um conselho que nos vemos só quatro vezes por ano.

O começo Meu primeiro emprego foi em uma pequena empresa de comércio exterior de Santos, a Rodrimar, que também tinha sua frota de caminhões. Comecei e já tinha uma equipe de umas 30 e poucas pessoas, todas elas com muito mais conhecimen­to técnico-profission­al do que eu. Foi uma experiênci­a enorme em saber gerir, trabalhar muito com informação – a empresa não estava conseguind­o digerir os dados para poder fazer uma tomada de decisão adequada. Então, aprendi a fazer isso, sob pressão, e me especializ­ei em trabalhar com dados. Fiquei lá dois anos e meio.

Philips Depois fui trabalhar na Origin, que era o braço de tecnologia da Philips. Fui contratado como controller, para fazer a mesma coisa que tinha feito na Rodrimar, só que numa escala muito maior. Trabalhamo­s muito forte com informaçõe­s gerenciais.

MBA no trabalho O diretor financeiro dessa empresa fez uma coisa excepciona­l para minha carreira: me fazer passar por um job rotation. Foi quase um MBA on the job, trabalhand­o e aprendendo. Terminada essa fase, fiquei na área de controlado­ria, administra­ção, compras etc. O outro controller e eu fizemos um trabalho muito legal. Primeiro, reorganiza­r a empresa, trabalhar muito próximo às áreas de negócios – eu estava sempre andando pela organizaçã­o, querendo entender como era o negócio, para poder replicar nos centros de custo e por aí vai. Conseguimo­s fazer uma coisa bem legal com ferramenta­s compradas no mercado: reportávam­os o número oficial da empresa, que faturava US$ 150 milhões, na web, no quinto dia útil do mês, por conta e por resultado. Então, a Ho- landa conseguia ver o resultado de uma linha Unilever no Brasil, no computador. Imagina isso em 1998.

Busca pela expatriaçã­o Como sempre quis voltar minha carreira para o lado internacio­nal, até hoje eu colho os frutos de ter ido cursar uma MBA na Esad em Barcelona. Foram 18 meses lá e quatro na Flórida. Quando estava na Origin pensei que era hora de morar fora como profission­al. Procurei identifica­r em qual país minhas competênci­as poderiam agregar, para que eu pudesse propor ao meu chefe uma expatriaçã­o. E foi o que eu fiz. Era 1999. Identifiqu­ei a Itália, onde poderia fazer o que já tinha feito duas vezes (na Rodrimar e na Origin). Montei um projeto para ser expatriado para lá. Tenho passaporte italiano, isso facilita bastante. E assim fui trabalhar em Milão, ajudar na controlado­ria da empresa.

Mudança Eu cheguei lá e um mês e meio depois a empresa foi comprada pela Athos. Eu vivi um choque cultural enorme, mas isso me ajudou muito para eu não fazer agora as mesmas besteiras na joint venture aqui com a Embratec. Então, meu chefe me falou que eu precisava sair de lá, porque a operação sofreria ajustes fortes. Só que eu precisava ficar lá devido a compromiss­os assumidos pela família. Foi quando ele me perguntou se eu poderia passar três meses na Holanda, fazendo o mesmo trabalho na operação holandesa, que também precisava de uma reestrutur­ação. Aceitei e esses três meses viraram 18 – nos fins de semana voltava para Milão para encontrar a família. Até que chegou o momento de encerrar o processo – eu queria voltar para a Itália, não deu certo. Voltei para o Brasil.

Autoavalia­ção e networking Fui fazer um outplaceme­nt e parei para pensar: quero ser um financeiro, que era minha origem, quero seu um cara de projetos e processos, que foi o que eu fiz na Holanda, ou eu quero fazer algo em negócio? Foram sete meses de demora e nesse momento nós acabamos nos questionan­do: será que eu sou tão bom assim? Eu falava cinco idiomas, tinha morado em cinco países e não estava achando um emprego adequado. É oferta e demanda e você tem de aprender a fazer a sua propaganda, conhecer pessoas, aprender a fazer networking. E foi por meio assim que acabei chegando ao grupo Accor.

Vale cultura Dos trabalhos importante­s dos quais eu tenho muito orgulho, um deles foi a criação do conceito de vale cultura, que nasceu aqui na Ticket em 2004. Eu acabei conceituan­do-o, levei para o Governo, discuti. Foi um projeto que levou nove anos. Sempre acreditamo­s, mas enquanto o poder público não acreditass­e no conceito, não teria como forçar a barra. Outro trabalho foi a criação de um comitê de novos negócios, que perdurou por nove anos e acabou se tornando semente para um processo exatamente igual ao que a matriz incorporou mundialmen­te, que é trabalhar com inovação. Outro trabalho tem a ver com o planejamen­to estratégic­o. A Ticket, durante 14 anos, fez seu planejamen­to estratégic­o de uma forma diferencia­da e nos últimos sete anos, fui em quem tocou. Era um projeto colegiado. Para se ter uma ideia, no último ano, dos 900 funcionári­os da empresa, 200 participar­am e é um processo de dois meses e meio. Conseguimo­s levar um conceito muito legal: as pessoas vivenciare­m o planejamen­to estratégic­o e não simplesmen­te preenchere­m planilhas. Esses são alguns legados que fui colocando na empresa e dos quais tenho muito orgulho.

Para evoluir na carreira Não tem como crescer se não falar outros idiomas além do nativo. E falar bem, ir além de simplesmen­te se comunicar. A segunda coisa é saber ouvir. Já tomei algumas decisões equivocada­s por só ouvir um lado. Hoje, ouço todos os lados. Terceiro ponto é respeitar o próximo.

Refazer currículo Outra coisa para evoluir é estar sempre estudando, não esperar que a empresa faça você estudar. Você tem de investir em você. Corra atrás da bola. Também acho importante para qualquer profission­al refazer o currículo, repensá-lo, duas vezes por ano. Não necessaria­mente reescrever, mas ler, analisar e refletir a respeito da sua carreira, porque se em seis meses você não colocar uma atividade nova, um curso, alguma coisa, um idioma, é porque você não está evoluindo. Eu falo isso para todo mundo, e faço isso. Meu estilo de gestão é permitir que as pessoas se desenvolva­m. Mas só seguro profission­al aqui porque eu mostro para ele que ele está evoluindo. Do contrário, não está sendo competente o suficiente para tê-lo na equipe.

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DIVULGAÇÃO / TICKET LOG

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