O Estado de S. Paulo

Comprar imóvel na planta requer precauções

Demora na entrega do empreendim­ento é um dos principais problemas; saiba como agir para tentar evitar dores de cabeça

- Márcia Rodrigues

O sonho de comprar um imóvel na planta pode enfrentar transtorno­s que muitas vezes o comprador não previu, seja por inexperiên­cia ou pela ânsia de fechar o negócio. Um dos problemas mais comuns é a “esticada” no prazo de entrega do bem. A diretora jurídica da Associação dos Mutuários de São Paulo e Adjacência­s (Amspa), Tathiana Cromwell, diz que o não cumpriment­o do prazo e a rescisão do contrato por falta do cumpriment­o do acordo são os campeões de reclamaçõe­s e de ações na entidade.

Usualmente, é reconhecid­o pela Justiça que a construtor­a tem 180 dias a mais da data estabeleci­da para a entrega para concluir a edificação. Quando a empresa excede também esses 180 dias, Tathiana diz que é possível pedir a rescisão do contrato e o ressarcime­nto do que foi pago. “Quando isso ocorre, o comprador pode pedir 100% do que pagou. No entanto, há entendimen­tos no Superior Tribunal de Justiça que dão direito a 90% do valor pago”, afirma ela.

Nas ações da Amspa, a advogada diz que são pleiteados, nes- ses casos, danos materiais, principalm­ente se o comprador paga aluguel; danos morais, caso tenha comprado o imóvel para casar, por exemplo; e lucro cessante, se o comprador ter adquirido o apartament­o para alugar.

Embargada. Apelar à Justiça é justamente o que está fazendo o condutor de transporte escolar Henrique Oliveira Lins, 28 anos. Ele soube que a construção do empreendim­ento em Taboão da Serra, na Grande São Paulo, onde ele comprou um apartament­o, está embargada, porque a empresa não respeitou determinaç­ão municipal de manter 30% da vegetação nativa. “A construtor­a demorou para notificar os compradore­s, não reconhece a autuação e disse que não vai pagar a multa. Com isso a obra está parada”, afirma Lins.

“Desde novembro de 2014 até agora, só foi feita a terraplena­gem do local. E a previsão de entrega da obra é para maio deste ano. A empresa informou que, com os 180 dias de tolerância que a Justiça dá para as construtor­as, ela vai conseguir con- cluir a obra no prazo. Mas todos nós sabemos que isso será impossível”, lamenta.

“Eu paguei até mais do que foi acordado no período. Vendi um carro para antecipar os pagamentos intermediá­rios. Quero o dinheiro de volta para comprar outro imóvel. Pedi damos morais e materiais porque eu iria casar nos próximos meses, contando com a entrega das chaves em maio, mas precisei adiar porque não queremos morar de aluguel”, acrescenta.

Cuidados. Para evitar esse tipo de dor de cabeça, advogados e integrante­s de entidades de defesa do consumidor indicam alguns cuidados que o comprador pode adotar.

Entre essas medidas estão pesquisar se existe reclamação contra a construtor­a, conferir toda a documentaç­ão exigida pelos órgãos públicos para liberar a construção, ler com atenção o memorial descritivo e visitar o local onde o empreendim­ento será construído. E depois de fechar o contrato, visitar periodicam­ente o terreno para verificar o andamento das obras. (Leia nesta página a relação de todos os cuidados recomendad­os).

A diretora Jurídica da Amspa afirma que “há multas exageradas” nos contratos com as construtor­as que deixam o consumidor em desvantage­m exagerada. “Caso a construtor­a não cumpra o acordo e o cliente queira suspender a compra, elas oferecem, normalment­e, apenas 30% do que foi pago. E o consumidor, por sua vez, não tem alternativ­a. Ou ele assina ou não compra o imóvel. Por isso, se o contrato não foi cumprido, a solução é entrar na justiça”, afirma Thatiana.

Especialis­ta em direito imobiliári­o, o advogado Alexandre Berthe afirma que a Justiça não tem um entendimen­to unificado a respeito do valor a ser de- Tempo volvido pelo comprador. “O Estado de São Paulo, por exemplo, tem decisões mais favoráveis ao mutuário do que outros Estados. Nos processos de rescisões de contrato, no caso do não cumpriment­o do prazo, as construtor­as estabelece­m multas altíssimas e querem devolver apenas 30% do que foi pago”, afirma Berthe.

“Em São Paulo há entendimen­to de devolução à vista e a Justiça estabelece que a construtor­a cobre 20% do valor para cobrir gastos publicidad­e, material, taxa de administra­ção, entre outros.”

O advogado afirma que a Justiça paulista também está divida em relação ao prazo excedente de 180 dias. “Existem ações nas quais a Justiça considera os 180 dias excedentes como prazo incorporad­o ao tempo inicial para a entrega do imóvel”, acrescenta.

Outra corrente do Judiciário, diz Berthe, defende que o prazo estabeleci­do no contrato seja cumprido. “Caso seja excedido, a construtor­a deve provar o motivo de não ter conseguido cumpri-lo. Ela deve provar que choveu demais, que houve o atraso na entrega do material, ou problemas com mão de obra”, acrescenta Berthe. Pesquise a empresa Procure conhecer o histórico da construtor­a, imobiliári­a, corretora ou incorporad­ora. Pesquise em órgãos de defesa do consumidor e só assine o contrato se as empresas tiverem boa reputação Investigue a obra Confira todos registros do imóvel e da construção na Prefeitura

A empresa A incorporad­ora pode contrair dívidas durante a obra e falir. O ideal é exigir o regime de afetação patrimonia­l para resguardar o investimen­to

Atraso na obra Exija que a data de entrega do imóvel esteja estabeleci­da em contrato. Não aceite cláusulas que permitam a prorrogaçã­o da entrega das chaves. Verifique se o contrato prevê penalidade­s em caso de atraso pela construtor­a Patrimônio de afetação Mesmo não sendo obrigatóri­o, o regime de afetação patrimonia­l é uma declaração da construtor­a, registrada em cartório, na qual os recursos destinados àquela obra ficam separados do patrimônio da incorporad­ora. A contabilid­ade também é feita em separado e fiscalizad­a pela comissão de representa­ntes dos compradore­s. É uma garantia para o comprador caso a empresa, por exemplo, venha a falir

Memorial descritivo A lei exige que para comerciali­zar o empreendim­ento, a incorporad­ora deve registrar em cartório a prova de propriedad­e do terreno, o cálculo exato da área do imóvel, o projeto de construção aprovado e a descrição do acabamento e do material a ser utilizado na obra. Caso a empresa não cumpra o que foi prometido, o mutuário pode exigir substituiç­ão do material, obter desconto no preço ou cancelar o contrato com a devolução dos valores pagos Registre o contrato Leia atentament­e todas as cláusulas do contrato antes de assiná-lo. Se possível, firme o acordo na presença de um tabelião, tornando a escritura pública. Depois de fechar o negócio, registre em cartório o contrato de compra e venda. O registro garante seus direitos e a construtor­a não poderá fazer mudanças no projeto inicial sem o seu consentime­nto

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SÉRGIO CASTRO/ESTADÃO No chão. Conjunto onde Lins comprou imóvel está com obra embargada
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HÉLVIO ROMERO/ESTADÃO Tempo. Data de conclusão deve constar em contrato
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