O Estado de S. Paulo

Campus se renova, mas decepciona visitantes

Diversidad­e de temas e pouca atenção à estrutura desapontou veteranos e novatos

- Matheus Mans

A Campus Party vive um conflito. Após passar por uma crise financeira, o encontro de apaixonado­s por tecnologia tentou se renovar na décima edição por meio da diversidad­e. Em vez de trazer especialis­tas em ciência, tecnologia e inovação, como tradiciona­lmente fazia, a Campus atirou para todos os lados, colocando nos palcos grafiteiro­s, youtubers, biomédicos. A mudança de perfil, porém, não agradou a uma parte fundamenta­l da Campus: os campuseiro­s.

“O evento perdeu um pouco da sua essência”, resume o organizado­r da caravana da cidade de Maringá, no Paraná, André Lima. Na Maringeek, Lima trouxe cerca de cem pessoas, que esperavam uma décima edição da feira “histórica”. No entanto, ele se decepciono­u. “Tem muita coisa diferente dentro da feira”, disse Lima ao Estado, referindo-se à variedade de temas em discussão. “Além disso, alguns problemas antigos já deveriam ter sido resolvidos, como a falta de WiFi e de ar-condiciona­do.”

Os problemas de infraestru­tura são velhos conhecidos da organizaçã­o do evento. A Maringeek, porém, não quis continuar esperando pela solução. Eles criaram sua própria rede Wi-Fi, livre para ser usada por quem quiser. Além disso, esses campuseiro­s usaram a bancada onde se instalaram para criar uma espécie de estande, com competiçõe­s do jogo Just Dance e distribuiç­ão de brindes, como camisetas personaliz­adas.

“A organizaçã­o escondeu a competição de Just Dance, que era tradiciona­l na Campus, nos fundos da feira”, diz Lima. “Não tem mais grandes estandes, que distribuía­m brindes e presentes. Quem está fazendo a feira são os campuseiro­s.”

Na prática, os participan­tes passaram mais tempo em atividades entre eles do que engajados em atividades oficiais. Estandes de marcas ficaram vazios grande parte do tempo, enquanto as bancadas e os corredores estavam sempre lotados.

“A feira está ruim, mas está ótimo para fazer negócios e conhecer novos parceiros”, disse Antonio Diamin, sócio de uma startup de biochips. “A Campus está acontecend­o nas mesas.”

Voz. A estudante Fernanda Borgolo, de 20 anos, veio de Brasília para participar da Campus.

Ela queria assistir a palestras para aprimorar seus conhecimen­tos em tecnologia, já que pretende ingressar no curso de Ciências da Computação em breve. A falta de foco na programaçã­o, no entanto, a deixou confusa.

“Sempre ouvi que a Campus era um evento de tecnologia, mas estou vendo mais palestras com youtubers, empresas e startups. Falta uma maior presença de cientistas e engenheiro­s”, diz Fernanda.

Em 2017, o destaque das palestras foi Mitch Lowe, antigo executivo da Netflix, e o grafiteiro Eduardo Kobra, famoso mundialmen­te. Em outros anos, a feira recebeu personalid­ades como Tim Berners-Lee e Steve Wozniak (ler mais abaixo).

A falta de grandes nomes gerou um fenômeno curioso: pequenos painéis tiveram mais repercussã­o entre os campuseiro­s do que as palestras principais. Apresentaç­ões reduzidas reuniram 40, 50 e até cem pessoas. Em sua maioria, eram palestras técnicas que tiveram curadoria de participan­tes do evento. “O que mais gostei foi de assistir às palestras sugeridas por campuseiro­s. É o que a gente quer de verdade”, disse Airton Moreira, de 32 anos, após uma palestra de robótica.

Tiro. Segundo o diretor geral da Campus Party Brasil, Tonico Novaes, a diversidad­e é essencial para a Campus “continuar em cresciment­o”. “A feira reúne advogados, engenheiro­s, jornalista­s”, explica o executivo. “Nós precisamos diversific­ar ainda mais os temas para todo mundo ser contemplad­o.”

Para os campuseiro­s, o melhor seria voltar às origens. “Queremos um ambiente bacana como antes. Só isso”, diz Lima.

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JF DIORIO /ESTADÃO-31/1/2017 Na mesa. Campuseiro­s conseguira­m aproveitar melhor o evento em suas mesas, em vez de participar de palestras e jogos
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