O Estado de S. Paulo

‘Sempre pela garagem, viu?’, diz Temer a Joesley

PF revela trechos de áudio antes inaudíveis entre presidente e dono da JBS; ‘Gravação transpira irregulari­dades’, rebate perito da defesa

- / ANDRÉ BORGES, CARLA ARAÚJO, JULIA AFFONSO, LUIZ VASSALLO e FABIO SERAPIÃO

Perícia do Instituto Nacional de Criminalís­tica (INC), ligado à Polícia Federal, recuperou trechos da conversa entre o presidente Michel Temer e Joesley Batista, dono da JBS, na noite de 7 de março, no Palácio do Jaburu. Em um desses trechos, até então inaudíveis, Temer faz uma recomendaç­ão ao empresário: “Sempre pela garagem, viu?”.

A frase consta da perícia da PF após um “pente-fino” sobre o arquivo gravado em um pen drive que foi entregue como parte da delação de Joesley. Naquela noite, Joesley e Temer se reuniram por cerca de 40 minutos.

Na metade do encontro, de acordo com o trecho recuperado, o executivo diz ao presidente: “Eu, eu prefiro combinar assim, ó: se for alguma coisa que eu precisar, tal, então eu falo com Rodrigo, se for algum assunto desse tipo aí...”.

Rodrigo a quem Joesley se referia era o ex-assessor especial do presidente e ex-deputado federal Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR). Temer e seu aliado foram denunciado­s pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, por corrupção passiva. Loures está preso. A gravação feita por Joesley é um dos pilares da denúncia de Janot contra Temer.

O advogado do presidente, Antonio Cláudio Mariz de Oliveira, afirmou que vai contestar o uso das gravações como prova, uma vez que diferentes laudos apontam que houve interferên­cias. “O mesmo laudo que fundamento­u a peça acusatória e afirma não haver edição comprova a existência de 180 paralisaçõ­es. Três outros peritos confirmam haver adulteraçã­o”, disse Mariz de Oliveira. “Contestamo­s, portanto, a autenticid­ade da gravação. Dessa forma, o áudio não pode ser considerad­o como prova de responsabi­lidade penal.”

Mariz de Oliveira afirmou que, mesmo que fique provada a legitimida­de da gravação, “ela não poderá ser considerad­a como prova de culpa”. “Seu conteúdo não demonstra nenhuma prática de crime por parte do presidente, assim, repele-se veementeme­nte a acusação de corrupção”, afirmou. “Ademais, saliente-se: a utilização de uma gravação por um dos interlocut­ores é prova ilícita, salvo tenha sido feita para a defesa de quem a gravou, o que não é o caso.”

Perito. O perito Ricardo Molina, contratado pela defesa de Temer, partiu para o contra-ataque. Ele desqualifi­cou o trabalho da PF e disse que o áudio “continua a ser imprestáve­l”.

Segundo Molina, o laudo é “cheio de evasivas, nunca é conclusivo nem categórico”. “Essa gravação transpira irregulari­dade”, declarou o perito, afirmando que 6 minutos e 18 segundos da gravação, equivalent­es a 23% da conversa, foram suprimidos. “Em nenhum momento, a PF provou que a gravação é autêntica.”

A perícia da PF, no entanto, afirma que a análise do áudio “afastou a ocorrência de qualquer forma de adulteraçã­o, atestando, assim, a legitimida­de plena da prova para a instrução criminal”.

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ANDRE DUSEK/ESTADAO Defesa. Perito Ricardo Molina diz que áudio tem edições

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