O Estado de S. Paulo

Campo minado no pré-sal

- ADRIANA FERNANDES E-MAIL: ADRIANA.FERNANDES@ESTADAO.COM ADRIANA FERNANDES ESCREVE AOS SÁBADOS

Ogoverno entra em campo completame­nte minado na disputa com a Petrobrás pela revisão do contrato de exploração de 5 bilhões de barris fechado com estatal e a venda do excedente de óleo do pré-sal.

A cessão onerosa foi a parte mais importante do processo de megacapita­lização da Petrobrás, há sete anos, para preparar a empresa para os investimen­tos bilionário­s nas áreas descoberta­s na região marítima do pré-sal.

Mas a operação em 2010 (ainda no governo Lula) acabou se transforma­ndo no marco inicial de sucessivas e danosas manobras contábeis patrocinad­as pelo ex-secretário do Tesouro Nacional, Arno Augustin. Esses truques na contabilid­ade foram responsáve­is em boa parte pela crise fiscal brasileira de hoje, uma vez que mascararam a verdadeira fotografia das contas do governo por anos.

A partir da capitaliza­ção da Petrobrás, a porteira da contabilid­ade criativa nas finanças do setor público ficou escancarad­a de vez, culminando mais tarde nas “pedaladas fiscais” que serviram de arma para tirar Dilma Rousseff da Presidênci­a da República.

Uma complexa engenharia financeira foi desenhada naquele ano pela equipe do Tesouro, combinando a capitaliza­ção da Petrobrás com a cessão onerosa do pré-sal. Tudo para “turbinar” o superávit das contas do governo. Ao final, o superávit foi reforçado em R$ 31,9 bilhões, permitindo o cumpriment­o da meta fiscal de 2010.

O governo recebeu R$ 74,8 bilhões pela cessão, sem licitação, dos 5 bilhões de barris de petróleo e, de outro, pagou R$ 42,9 bilhões para comprar ações da estatal. BNDES, Caixa e o Fundo Soberano foram usados como “braços” financeiro­s da operação para permitir a entrada do dinheiro como receita no caixa da União.

Leis, portarias e decretos foram aos poucos sendo escritos e editados sem a mínima transparên­cia exigida dos atos públicos para dar o embasament­o legal à operação.

Na época, a meta fiscal era de superávit de 3,3% do Produto Interno Bruto (PIB). Mas a equipe econômica vivia já a desconfian­ça do mercado em relação às regras de abatimento que permitiam reduzir o esforço fiscal sem descumprir a meta.

Hoje, o drama fiscal é explosivo. Os tempos de superávit ficaram para trás. O País vive anos de déficits em magnitudes nunca antes experiment­adas e o governo luta para não deixar que o rombo das contas públicas vá além de R$ 159 bilhões no ano que vem.

Muita gente boa de conta no mercado e dentro do governo não acredita que a revisão da meta de déficit de R$ 129 bilhões para R$ 159 bilhões será suficiente, já que o rombo potencial no cenário atual é estimado num patamar de R$ 180 bilhões.

E não é que mais uma vez a venda da cessão onerosa aparece como salvadora da pátria e embaralha novamente o jogo, justamente no momento em que a petrolífer­a tenta limpar a sua biografia da mancha da interferên­cia política na sua gestão depois da operação Lava Jato? A crise fiscal é tão aguda que o governo tenta pescar em tudo que é laguinho que encontra na frente para aumentar a arrecadaçã­o. No caso aqui, trata-se de um “marzão” de petróleo, com cifras bilionária­s.

No dia da divulgação da revisão das metas fiscais de 2017 e 2018, na última terça-feira, a equipe econômica bem que quis tentar incluir a venda do excedente na lista de concessões previstas para 2018. Tanto que o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, e o presidente da Petrobrás, Pedro Parente, se reuniram poucas horas antes do anúncio. Não deu.

Tesouro e Petrobrás se dizem credores e a disputa está só começando. Cada lado, com suas responsabi­lidades e compromiss­os. A companhia e o governo têm interesse no acordo porque precisam de dinheiro em caixa. A empresa, assim como o governo, tem alto nível de endividame­nto e precisa investir. Estaria tudo certo se as negociaçõe­s não estivessem sendo atropelada­s pela urgência fiscal em cumprir a meta. Não dá para tirar esse pano de fundo da nova negociação. Todo cuidado é pouco. Os olhos dos investidor­es estarão bem abertos diante do histórico recente.

Dream Team. Depois da difícil decisão de revisão das metas, que colocou em evidência o espaço limitado do ajuste fiscal pela equipe econômica, o mercado financeiro acompanha com lupa o movimento do grupo dos principais secretário­s de Henrique Meirelles, apelidado de “Dream Team” no início do governo. Analistas querem saber como se comportará daqui para a frente esse time se novas concessões políticas de aumento de gastos forem aceitas pelo ministro à medida que o debate eleitoral de 2018 ganhar força. Baixas na equipe já estão sendo esperadas e podem trazer turbulênci­as.

 ??  ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil