Álvaro de Moya, salto qualitativo da cultura
Jornalista, escritor, produtor, ilustrador, que morreu no dia 14 de agosto, deixou seu nome inscrito na arte nacional
Há alguns meses, após o lançamento de um livro aqui em São Paulo, eu jantava num restaurante com um grupo de intelectuais, artistas e jornalistas. Lá pelas tantas, Ziraldo, um dos presentes, se dirigiu a todos e disse: “Vejo muita gente importante ao redor dessa mesa. Não arriscaria dizer quantos ou quais de vocês terão seus nomes marcados na história. Um nome, porém, eu tenho certeza que sim: Álvaro de Moya”.
Em seguida, Ziraldo justificava sua afirmação lembrando o fato de Moya ter realizado em 1951 no Masp a primeira exposição de histórias em quadrinhos do mundo. Arcando com as consequências dessa polêmica ousadia, a da exposição de um objeto de cultura de massa gráfica num espaço tão nobre, cultura essa tida por muitos como descartável, Moya assumiu praticamente a liderança internacional na defesa dessa arte popular. Publicando mais de 10 livros sobre a matéria – Shazan, talvez o mais importante – e frequentando constantemente exposições, simpósios internacionais, congressos, ele e seus escritos se tornaram referência sobre o assunto. Manteve também um estreito relacionamento com editoras e desenhistas famosos dos mais populares comics – sobretudo os norte-americanos – que se apoiavam em suas teses para conferir uma espécie de status cultural a essas revistinhas criadas por eles e adquiridas por poucos centavos em bancas de jornais das ruas do planeta.
Moya esteve bom tempo nos EUA estudando culturas de massa – sobretudo cinema e TV – razão pela qual ele foi encarregado de estabelecer o perfil de programação na fundação da TV Excelsior de São Paulo, em 1960. Aí, ocorre o grande salto qualitativo de nossa TV. Enquanto na Europa a implantação do novo veículo deitava raízes em formas de expressões culturais tradicionais – literatura, teatro, concerto, cabaré, etc. –e a TV americana ia buscar suas ferramentas principais num outro veículo de massa e igualmente audiovisual, o cinema, no Brasil nossa TV foi moldada com os elementos de um veículo mais recente, igualmente eletrônico e quase psicodélico, o rádio brasileiro do passado. Toda aquela vibração positiva que esses radialistas passaram para a TV brasileira dos primeiros 10 anos, foi encampada pela linguagem da TV Excelsior.
Nas novelas da TV Excelsior era possível assistir pela primeira vez à realidade brasileira, distantes daqueles dramalhões cubano-mexicanos da TV anterior. Na programação de cinema, selecionada pelo próprio Moya e devidamente por ele comentada, se assistiam aos melhores filmes.
Durante toda sua vida, Moya espraiou seus conhecimentos das mais diversas maneiras, inclusive como professor da USP por décadas.
Não tenho dúvidas que Ziraldo tinha razão quando fez aquela afirmação. Aliás, esse artigo já é uma contribuição para que seu nome fique, de fato, eternamente marcado em nosso patrimônio cultural.