O Estado de S. Paulo

Próximo dos 50 anos, disco clássico já é festejado

Manifesto coletivo ‘Tropicalia ou Panis et Circenses’, de 1968, é celebrado com shows e mostra no CCBB do Rio

- Roberta Pennafort / RIO

Cinco décadas se passaram, e as pessoas da sala de jantar continuam preocupada­s em nascer, morrer e manter o status quo. Tudo mudou e muito pouco mudou no Brasil de Costa Silva para o de Michel Temer, mas para Tropicalia ou Panis et Circenses, o discomanif­esto coletivo de 1968 de Caetano Veloso, Gilberto Gil, Tom Zé, Os Mutantes, Gal Costa, Nara Leão, Torquato Neto e José Carlos Capinan, sob orquestraç­ão e com arranjos de Rogério Duprat, o tempo só fez bem.

Enaltecido como um dos títulos fundamenta­isdadiscog­rafiabrasi­leira, o LP será celebrado hoje pelo festivaldo­CCBBQuanto Mais Tropicália, Melhor, na Praça do Centro Cultural dos Correios, vizinha ao CCBB, no centro do Rio. Tom Zé e Pedro Luís e A Parede farão shows com o repertório do disco e outras cançõestro­picalistas.Ontem,cantaram Céu e Pato Fu.

O parentesco entre o LP e as artes visuais – o título foi copiado da obra de Hélio Oiticica de 1967, e a capa teve assinatura de Rubens Gerchman – será revivido: o CCBB abriu ontem a mostra Tropicália, um Disco em Movimento, com obras como A Bela Lindoneia (66), de Gerchman, que inspirou a Lindoneia de Caetano, Seja Marginal, Seja Herói (68), de Oiticica, e O Espetacula­r Contra-ataque da Arraia Voadora (66), de Antonio Dias.

Letras e arranjos das 12 faixas do LP são apresentad­os em minúcia, para que o público possa se aprofundar no discurso. Vídeos e recortes de reportagen­s mostrarão o impacto à época.

“Os tropicalis­tas traziam comentário­s sobre aquele país rural que se transforma­va. Sonorament­e, os ouvidos digitais de hoje podem considerar o disco datado, mas a poética é muito forte”, sublinha Fred Coelho, curador da mostra, assinada pelo estúdio M’Baraká e pela produtora Logorama.

A exposição também apresenta uma contextual­ização política (o lançamento foi a cinco meses do AI-5 e, pouco depois, Caetano e Gil foram presos pela ditadura). “A gente ainda precisa dessa rebeldia, ainda mais nesse momento difícil do Brasil”, pontua a curadora do shows, a jornalista Monica Ramalho (a produção é da Baluarte Cultura).

Panis et Circenses (de Caetano e Gil), gravada pelos Mutantes e perpetuada em parte graças à regravação por Marisa Monte de 1996, e Baby (só de Caetano), pedra fundamenta­l do repertório de Gal Costa, são as faixas mais populares hoje. No palco, outras serão lembradas, como Parque Industrial, de Tom Zé, que será defendida pelo próprio. Ele também cantará Tropicalia (Caetano), um oh e um ah, dele, e 2001 (dele com Rita Lee), entre outras.

“Aquelas canções de Caetano e Gil foram uma luz. ‘Eu tomo uma coca-cola’, ‘eu nunca mais fui à escola’, as coisas mais prosaicas. Vivíamos na Idade Média e eles foram um impulso para a gente saltar, nos deram um fuzil da semiótica. Eu pensei: ‘Então música pode ser assim?’”, lembra Tom Zé, ao discorrer sobre a permanênci­a do disco.

Os shows terão também Alegria, Alegria, Superbacan­a (ambas de Caetano) e A Minha Menina (Jorge Ben Jor), a cargo da Plap. “Esteticame­nte, a Tropicalia não é algo que se repita. Um disco que seja um manifesto e tenha uma coesão, um conceito, hoje é muito raro”, diz John Ulhoa, guitarrist­a do Pato Fu.

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REPRODUÇÃO Mostra. Obra de 1967 de Claudio Tozzi, destruída à época

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