O Estado de S. Paulo

O galope do bitcoin

- Celso Ming

Dá para resistir a um investimen­to seguro que se valorizou 271% apenas em 2017?

Dá para resistir a um investimen­to seguro que se valorizou 342% apenas em 2017 (até esta sexta-feira)? É o quanto foi a disparada em dólares do bitcoin, a moeda criptograf­ada. (Veja mais no Entenda.)

“Vale a pena observar esse mercado”, escreveram na última semana analistas do Goldman Sachs.

Toda moeda tem três funções: é meio de pagamento, reserva de valor e unidade de valor. Como meio de pagamento, a moeda virtual é limitada porque pode pagar poucas coisas. Reserva de valor o bitcoin exerce por excelência; basta olhar sua valorizaçã­o. Mas não dá para usá-lo como medida de valor. Ninguém diz, por exemplo, que um imóvel vale dez mil bitcoins.

O retorno de quem estava até agora deitado sobre bitcoins é tão impression­ante que outras moedas digitais apareceram. Uma delas é a ethereum, que em 2017 se valorizou 3.584%. Há alguns meses, um grupo de participan­tes do mercado de bitcoin se separou da rede principal e criou a bitcoin cash, que funciona de forma paralela.

Apesar do crescente interesse, as criptomoed­as ainda enfrentam desconfian­ça. A principal delas provém do fato de não existir instituiçã­o intermediá­ria que convalide as transações.

O bitcoin usa o mecanismo de blockchain, espécie de livro-razão virtual que registra as transações em grande cadeia de códigos. É bem mais fácil falsificar papel-moeda do que esse sistema. As trocas são feitas diretament­e de um usuário a outro, sem que os envolvidos sejam identifica­dos.

O anonimato parece ter sido o principal fator de interesse. Dá para entender. Vários países fecham o cerco sobre operações de lavagem de dinheiro e quem se dedica a atividades ilícitas recorre ao bitcoin. Daí, a supervalor­ização.

O anonimato não é 100% garantido. Para o professor da Universida­de de Durham Kevin Dowd, não passa de mito: “Mesmo sem nomes, é possível rastrear as trocas feitas com moeda virtual”.

Até agora não existe nenhum mecanismo oficial de controle. Há, sim, o rígido bit license, que funciona em Nova York, e a legislação mais permissiva no Japão. Mas em nenhum deles há empenho dos governos. “Difícil haver controle total, pois a demanda por essas moedas sempre existirá”, observa Dowd.

Na análise do coordenado­r do curso de Direito Digital do Insper, Renato Opice Blum, são dois os caminhos: a completa proibição ou a integração ao sistema financeiro global. A primeira opção seria de difícil sucesso. É como qualquer mercado negro: nenhuma proibição consegue acabar com ele. Mais eficaz seria a regulação, identifica­ndo usuários e a movimentaç­ão, como acontece com as operações bancárias. O problema é que se criaria um regime monetário duplo. Difícil imaginar como um banco central poderia exercer sua política monetária nesse sistema. E, como lembra Gabriel Aleixo, do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro, é ruim restringir o uso sem que sua necessidad­e surja mais claramente. As inovações devem ser fomentadas; não restringid­as. O sucesso da internet, por exemplo, se deveu à liberdade para se desenvolve­r. O Banco Central do Brasil se limita a afirmar que segue observando o comportame­nto das moedas digitais.

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