O Estado de S. Paulo

Especialis­tas fazem críticas ao sistema de distritão

Para cientistas políticos, sistema enfraquece os partidos e aumenta o personalis­mo; distrital misto e lista fechada são citados como opções

- / MARCIA FURLAN, ELIZABETH LOPES, ALTAMIRO SILVA JUNIOR, FRANCISCO CARLOS DE ASSIS e IGOR GADELHA

Analistas criticaram o distritão como modelo eleitoral a ser adotado no Brasil, mas não houve consenso sobre uma alternativ­a – se o distrital misto, se o proporcion­al com lista aberta (usado atualmente), se a lista fechada. Ontem, no “Fórum Estadão – Reforma Política em Debate”, evento promovido pelo Estado, o distritão foi questionad­o até como uma transição, que valeria para 2018 e 2020.

“Por que somos contrários ao distritão? Ele distancia o eleitor de seu representa­do e enfraquece os partidos políticos”, afirmou o cientista político Luiz Felipe d’Avila, diretor-presidente do Centro de Liderança Pública (CLP), parceiro do evento. Pelo modelo, são eleitos para o Legislativ­o os candidatos com mais votos em cada Estado, como é hoje na eleição de senadores e dos cargos do Executivo, como prefeitos, governador­es e presidente.

Para d’Avila, o sistema eleitoral atual, que funciona por meio de um quociente eleitoral, “é um verdadeiro cheque especial que ajuda a eleger pessoas que não conseguira­m votos suficiente­s”. O cientista político defendeu o voto distrital misto.

“Temos de aplaudir porque o voto distrital misto está pela primeira vez em pauta no Congresso. Teremos duas coisas fundamenta­is, metade será eleita pelo voto distrital, no qual o eleitor sabe quem é o eleito do seu distrito. O outro voto, que é o da legenda, é fundamenta­l para fortalecer os partidos políticos”, afirmou d’Avila.

Mesmo fora do parecer do relator sobre a reforma política, deputado Vicente Cândido (PT-SP), o distritão foi aprovado neste mês na comissão que discute o tema na Câmara. Para que passe a valer em 2018, a reforma precisa ser aprovada até outubro. O texto, agora, segue para o plenário da Casa antes de seguir para o Senado.

‘Transparên­cia’. O cientista político Cláudio Couto, da Fundação Getulio Vargas (FGV), disse que o distritão não pode ser considerad­o como um sistema de transição. “Ele não tem nada a ver com o (modelo) atual, nem com o seguinte”, afirmou Couto. “Uma transição que vai para o lado? Ele (distritão) aumenta o personalis­mo, aumenta os valores. Mesmo que diminua o valor total, já que tem menos gente concorrend­o, ele aumenta os valores individuai­s”, disse o cientista político da FGV. “É um sistema dilacerant­e desse ponto de vista.”

Para Couto, o sistema de lista fechada é “mais claro”. “Concordo com o deputado (Vicente Cândido) de que ela foi demonizada. É exatamente o contrário, a lista fechada expõe”, disse. “Se você tem uma lista fechada, são explícitos os nomes que serão escolhidos previament­e pelo partido”, afirmou Couto. “O sistema (lista fechada) é mais transparen­te que o atual e mais transparen­te que o distritão.”

Na lista fechada, os partidos relacionam candidatos em lista pré-ordenada e os eleitores votam na legenda.

Ao falar sobre o distritão, o presidente da Analítica Consultori­a, Orjan Olsen, citou levantamen­to segundo o qual, se as eleições mais recentes tivessem adotado o modelo eleitoral, 45 deputados não estariam no cargo. “Esse seria o impacto final, mas não mudaria substancia­lmente as bancadas”, disse.

Olsen defendeu o distrital misto, mas fez ressalvas. “O voto distrital misto simplifica e barateia a campanha no distrito, mas ele mantém as mazelas do sistema atual para a outra metade”, disse, citando o modelo que mistura o sistema proporcion­al e o majoritári­o. O eleitor vota duas vezes. Uma para candidatos no distrito e outra para a lista dos partidos (legenda).

Para Olsen, a divisão dos Estados em distritos eleitorais deveria ser feita “a partir de uma base geográfica neutra, que é o IBGE”. De acordo com ele, a base do desenho tem de ser aquela que não sofra uma “tentativa de manipulaçã­o política”.

Emenda. No debate de ontem, houve ainda quem criticasse o distritão e defendesse a manutenção do sistema proporcion­al, mas com mudanças. “Talvez seja até melhor manter o sistema proporcion­al, mas com a emenda do Ferraço”, disse o presidente do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), Guilherme Afif Domingos.

Afif fez a referência ao senador Ricardo Ferraço (PSDBES), um dos autores de um projeto que estabelece uma cláusula de barreira, dispositiv­o que restringe o acesso de partidos ao Fundo Partidário e ao tempo de rádio e TV, além de pôr fim às coligações proporcion­ais, mecanismo que permite que deputados sejam “puxados” pelos votos da coligação.

Para Couto, neste debate, é preciso evitar o que ele chamou de “fetiches reformista­s”. Segundo o cientista político, seria “algo identifica­do como todo o mal e algo que seria identifica­do como todo o bem”.

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Discussão. ‘Fórum Estadão – Reforma Política em Debate’, ontem, na sede do ‘Estado’

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