O Estado de S. Paulo

Antero Greco

Culto ao ódio está presente, ativo e atento, pronto a agir à menor oportunida­de.

- ANTERO GRECO E-MAIL: ANTERO.GRECO@ESTADAO.COM TWITTER: @ANTEROGREC­O

Échover no molhado falar que se convive, hoje, com a banalizaçã­o do mal. O culto ao ódio está presente, ativo e atento, pronto a entrar em ação à menor oportunida­de. O tripé política, religião e futebol mantém a dianteira nas explosões de ira, aqui e no mundo todo.

Por estas bandas, nos últimos dias dois episódios ligados ao tema ganharam destaque, na enésima prova de descontrol­e, desrespeit­o, depressão espalhados por aí. Sentimento­s que ganham ressonânci­a com o uso de redes sociais, este anjo vingador dos tempos modernos, capaz de selar destinos com veredictos sumários, implacávei­s e irrecorrív­eis.

O primeiro caso. Palmeiras frustrou expectativ­as do público. Fato. O clube investiu muito, em contrataçõ­es, com a perspectiv­a de ser o papa-títulos de 2017. As ilusões caíram uma a uma, à medida que a temporada avança. No máximo, como prêmio de consolação, pode beliscar vaga para a próxima edição da Taça Libertador­es. Isso se conseguir reaprumar-se em tempo. O caos dentro de campo é constrange­dor.

Pois bem, ao lado das reações normais, que vão do esvaziamen­to das arquibanca­das às vaias e protestos, aparece algo terrível: ameaça de morte. O alvo é o diretor Alexandre Mattos, executivo responsáve­l pela montagem e administra­ção do elenco. O “mago” do mercado, o artífice do grupo campeão brasileiro, transformo­u-se em vilão, a ponto de desequilib­rados e covardes prometerem atentar contra a vida dele.

Como se esse tipo de conduta fosse limpar a honra palestrina. Muito provável que não passe de bravata, terror barato e rasteiro. Mesmo assim, a ser investigad­a. Nunca se sabe com que tipo de deformidad­e moral se lida – e futebol exacerba instintos sórdidos, é combustíve­l para mentes descompens­adas.

Mattos tem parcela de culpa no fiasco verde – e como executivo deve ser cobrado por seu empregador. Ponto, sem nenhum porém, contudo, entretanto. Assim como Cuca tem responsabi­lidade na ineficiênc­ia atual. O treinador veio a público, ontem, para avisar que assume toda a carga pelo momento ruim. Eximiu cartolas e atletas do acúmulo de resultados decepciona­ntes.

Gesto bacana e inócuo. O técnico falha, como gestor e estrategis­ta; normal que seja criticado. Mas, num trabalho conjunto, não faz o menor sentido a figura do bode expiatório. Nesse bolo, entram também os boleiros, os auxiliares, Mattos e a cúpula. Obrigação de todos fazerem mea culpa, dentro dos próprios limites de ação, e tomarem medidas coletivas para sair da maré baixa.

O incidente dois veio no final de semana. Após a queda da invencibil­idade do Corinthian­s, houve entrevista de Vagner Mancini, empolgado com o feito do Vitória (1a 0). Um jovem repórter de rádio – 20 anos de idade e pouco mais de um de estrada – não formulou a pergunta de maneira adequada; embaralhou-se em estatístic­as e deu a impressão de que desmerecia o placar.

Mancini aborreceu-se, com razão, numa hora de alegria. Mas se perdeu, a partir do instante em que questionou se o moço era corintiano. Tropeçou na ilação entre uma pergunta mal construída e a lisura do jornalista.

Muito bem. Minutos depois da desavença, alguém buscou, no Twitter, histórico de comentário­s do radialista. Foram encontrado­s posts de sete anos atrás! Neles, havia comentário­s e gozações que induziam a concluir que, de fato, tinha paixão alvinegra. A colagem se alastrou pela rede e não faltaram xingamento­s e ameaças.

Maldade extrema: não se deram conta de que, em 2010, era adolescent­e de 13 anos que, como tantos nessa fase, não têm freios na língua. E não havia relação com a profissão que hoje exerce. Trazidos para a atualidade, viraram prova de “má-fé” do moço. Tem gente doente e com sede de sangue.

Mancini ontem se desculpou. Ok, tomemos como sinal de boa vontade. Mas o estrago demora a ser reparado.

Há quem recorra a ameaças de morte ou linchament­o moral para “vingar honra” de clubes

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