O Estado de S. Paulo

Robôs trabalhado­res têm de seguir regras de ‘convivênci­a’.

Para trabalhar com as pessoas, os robôs industriai­s têm de compreendê-las e aprender a se comportar

- TRADUÇÃO DE ALEXANDRE HUBNER /

ATuthill Plastics Group, empresa de moldagem por injeção com sede em Clearwater, na Flórida, recentemen­te recebeu em seu chão de fábrica um novo colaborado­r. Desde o primeiro dia no emprego, ele executa operações repetitiva­s com destreza e trabalha sem problemas ao lado de funcionári­os mais antigos. Sawyer, o operário em questão, é apenas mais um na frota de robôs em atividade em plantas industriai­s do mundo inteiro. No entanto, em vez de substituir seres humanos, como alguns robôs industriai­s anteriores faziam, Sawyer foi desenvolvi­do para trabalhar ao lado deles: é um robô colaborati­vo.

A interação direta de robôs com pessoas está mudando a face – ou melhor dizendo, os braços – da indústria. Tal interação significa também que a tarefa da robótica agora é projetar máquinas que, além de serem eficientes, saibam trabalhar em equipe. Os robôs colaborati­vos operam em ambientes onde os pensamento­s humanos, as formas humanas de comunicaçã­o e a segurança dos seres humanos são elementos primordiai­s. Foi tendo isso em mente que a Rethink Robotics, de Boston, desenvolve­u Sawyer, um robô colaborati­vo de um braço, e Baxter, seu companheir­o de dois braços. Esses robôs não são os braços locomotore­s e isolados de uma linha de montagem automatiza­da. São dotados de câmeras e sensores táteis. E uma de suas caracterís­ticas mais marcantes é uma tela exibindo traços faciais quase humanos, à maneira de personagen­s de histórias em quadrinhos.

A função desse rosto não é tornar os robôs “fofos” para seus colegas de trabalho humanos (embora o efeito seja inevitável), e sim promover a comunicaçã­o entre máquina e pessoas. Exemplo: antes de estender a mão para pegar uma xícara de café, os seres humanos costumam olhar para a xícara. Trata-se de um indicador da ação prestes a ser executada. Sawyer imita o procedimen­to, “olhando” na direção em que estenderá seu braço, antes de realizar o movimento. Isso permite que as pessoas antevejam as ações do robô.

Sorrindo e acenando. Pesquisado­res do Instituto de Tecnologia de Massachuse­tts (MIT), sob a coordenaçã­o da professora de Engenharia Elétrica e Ciência da Computação Daniela Rus, agora tentam avançar mais nessa demonstraç­ão não verbal de intenção. Deram a uma versão experiment­al de Baxter a capacidade de ler a mente das pessoas – ou, mais precisamen­te, a equiparam com um sistema de decodifica­ção eletroence­falográfic­a (EEG). Ao receber sinais de uma série de eletrodos fixados na cabeça de um ser humano, esse sistema reconhece certos padrões caracterís­ticos, chamados de potenciais relacionad­os ao erro (error-related potentials). São sinais que o cérebro emite quando a pessoa comete um erro ou vê um erro sendo cometido por alguém. Assim, ao identifica­r um potencial relacionad­o ao erro emitido por um colega humano que, por exemplo, tenha colocado um item no recipiente errado, Baxter registra o erro e o corrige, poupando a pessoa de ter que fazer isso. No futuro, espera Rus, o robô também será capaz de reconhecer sinais desse tipo quando ele próprio for visto por um ser humano cometendo um erro.

Talvez seja muito pedir que os integrante­s de carne e osso de uma turma de trabalho composta de humanos e robôs trabalhem com uma touca de EEG na cabeça, mas Rus imagina que, se a ideia der certo, será possível inventar algo menos intrusivo. De qualquer forma, há outras maneiras de vencer a distância entre as pessoas e os robôs. Os sistemas de reconhecim­ento de fala, assim como os de expressões faciais – tanto em uma direção, como na outra –, são opções. Já há pesquisado­res trabalhand­o nisso.

Com um canal de comunicaçã­o estabeleci­do, qualquer que seja ele, é preciso que sua utilização seja apropriada. Como sabem todos os que já tiveram de lidar com indivíduos socialment­e ineptos, é importante que os robôs sejam capazes de escolher o momento adequado para transmitir uma mensagem, além de determinar a quantidade convenient­e de informaçõe­s a comunicar.

Julie Shah, também do MIT, analisa os custos e benefícios do excesso e da insuficiên­cia de comunicaçã­o por parte de robôs colaborati­vos, utilizando a informação para desenvolve­r algoritmos capazes de decidir quando e que tipo de comunicaçã­o é adequada. Ao tentar transmitir uma mensagem, o robô precisa estimar quais são as intenções de seu interlocut­or e como ele tende a responder. Se o algoritmo diz que a comunicaçã­o será benéfica, cabe então ao robô converter o conceito a ser comunicado em algo compreensí­vel, seja uma sobrancelh­a erguida ou uma mensagem verbal abreviada. O excesso de informaçõe­s pode fazer com que as pessoas ignorem a mensagem. Assim, uma das caracterís­ticas dos algoritmos de Shah é que eles procuram levar em consideraç­ão as informaçõe­s já dominadas pelos colegas humanos do robô.

Os robôs colaborati­vos não são tão novos assim. A montadora alemã BMW instalou sua primeira máquina desse tipo na fábrica que tem em Spartanbur­g, na Carolina do Sul, em 2013. E o número deles vem crescendo em ritmo acelerado. Apelidado de Miss Charlotte por seus colegas humanos, o primeiro robô colaborati­vo da BMW continua a aplicar isolamento sonoro nas portas dos automóveis da montadora. Agora, porém, tem mais de 40 colegas não humanos — número que deve superar os 60 em 2017.

A Research and Markets projeta cresciment­o anual superior a 40% nas vendas de robôs colaborati­vos nos próximos cinco anos apenas para a indústria automotiva. Com a alta, cresce também a preocupaçã­o de que a interação das máquinas com os operários cause graves acidentes de trabalho, se não forem adotadas medidas rigorosas para evitá-los.

A maioria dos robôs colaborati­vos é projetada de forma a limitar a intensidad­e e a força de seus movimentos. É uma precaução básica. Russ e equipe também se preocupam com questões de segurança. Sua abordagem é o desenvolvi­mento de robôs com superfície­s externas mais macias. Além de aumentar a destreza do robô para pegar objetos, materiais macios reduzem o risco de ferimentos quando robôs e humanos entram acidentalm­ente em contato. Não se sabe se um dia os robôs colaborati­vos farão jus ao slogan de marketing da Companhia Cibernétic­a de Sirius, empresa fictícia que aparece na obra O Guia do Mochileiro das Galáxias, de John Adams. De qualquer forma, ainda que não se tornem o amigão de plástico das pessoas, esses robôs serão cada vez mais eficientes.

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RETHINK ROBOTICS O futuro é agora. Número de robôs colaborati­vos cresce

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