O Estado de S. Paulo

25% do dinheiro de contas inativas do FGTS foi usado para compras

Comércio ficou com R$ 10,8 bilhões do total de R$ 44 bilhões sacados de março a julho, segundo pesquisa da CNC

- Daniela Amorim / RIO

Os saques nas contas inativas do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) injetaram R$ 10,8 bilhões no comércio varejista, segundo cálculos da Confederaç­ão Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) obtidos com exclusivid­ade pelo Estadão/Broadcast.

Do total de R$ 44 bilhões sacados das contas inativas entre março e julho deste ano, 25% chegaram aos caixas dos varejistas. Quatro entre oito segmentos tiveram impacto relevante nas vendas, absorvendo 86% dos recursos destinados pelos trabalhado­res às compras: vestuário e calçados (R$ 4,1 bilhões); hipermerca­dos e supermerca­dos (R$ 2,8 bilhões); artigos de uso pessoal e doméstico (R$ 1,3 bilhão); e móveis e eletrodomé­sticos (R$ 1,2 bilhão).

“Esse dinheiro do FGTS foi totalmente inesperado. Fiz uma viagem que não estava nos planos e comprei uns móveis para a casa nova, porque calhou de estarmos de mudança na época do saque”, contou o empresário Daniel Tambarotti.

Ele comprou mesa e estante com parte do FGTS acumulado durante os oito anos no último emprego, deixado em novembro de 2016 para investir no próprio negócio. “Eu já estava financeira­mente organizado há alguns anos. Não tinha dívidas. Gastei parte do dinheiro, mas vou guardar uns 40% que sobraram”, relatou o empresário.

A destinação de recursos do FGTS para a aquisição de bens no comércio poderia ter sido mais expressiva, na avaliação do economista Fabio Bentes, da Divisão Econômica da CNC. O varejo ampliado – que inclui veículos e material de construção – faturou R$ 770 bilhões nos meses de saques do FGTS. No entanto, apenas 1,4% desse montante foi provenient­e das contas inativas.

“Se você dá R$ 100 na mão do brasileiro, ele gasta R$ 90. Ele não gastou esses R$ 90,00 porque estava muito endividado. As pessoas aproveitar­am esse recurso extraordin­ário para limpar o nome, reduzir o endividame­nto. A crise fez com que sobrasse pouco para o varejo”, disse o economista da CNC.

Segundo Bentes, se o cenário econômico não estivesse tão complicado, apenas o varejo teria absorvido mais de 40% dos recursos do FGTS. “Somando com o que seria gasto em serviços, esse montante encostaria em 85% do total sacado.”

Apesar do impacto relativame­nte modesto, os recursos do FGTS devem fazer o consumo das famílias voltar ao terreno positivo pela primeira vez após nove trimestres consecutiv­os de retração. O consumo das famílias cresceu 0,6% no segundo trimestre em relação ao mesmo período de 2016, segundo estimativa do Monitor do PIB, divulgado esta semana pela Fundação Getulio Vargas (FGV).

De acordo com a FGV, o consumo de bens não duráveis aumentou 0,5% no segundo trimestre, enquanto o consumo de bens semiduráve­is avançou 7,3% e o consumo de bens duráveis subiu 3,8%. O coordenado­r do Monitor do PIB, Claudio Considera, acredita que os recursos inativos serviram para que as famílias colocassem as contas em dia e então pudessem adquirir novos financiame­ntos, especialme­nte no caso de bens de consumo duráveis.

A CNC ressalta, porém, que a recuperaçã­o parcial do varejo em 2017 é reflexo também da desacelera­ção no ritmo de aumento dos preços e melhoria das condições de crédito. “A prestação do crédito voltou ao patamar que o consumidor pagava em setembro de 2015. Ninguém imaginava que os aumentos nos preços livres ficariam tão baixos, então a inflação menor é uma boa notícia também. Mas o FGTS entra nessa panela sim, ajudou um pouquinho nesse momento de virada do varejo”, completou Bentes.

O estudo da CNC usou como base o volume de vendas e preços medidos pela Pesquisa Mensal de Comércio, do IBGE; indicadore­s do Cadastro Geral de Empregados e Desemprega­dos (Caged) do Ministério do Trabalho; e informaçõe­s sobre concessões de crédito ao consumidor divulgadas pelo Banco Central.

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WILTON JUNIOR/ESTADÃO Mudança. Tambarotti aproveitou para comprar móveis

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