O Estado de S. Paulo

A desfaçatez de Dilma

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Qualquer um pode criticar o plano de privatizaç­ão da Eletrobrás. Soa estranho, porém, quando a crítica é feita por aqueles que pertencera­m ao grupo que arrasou o setor energético brasileiro nos últimos 15 anos.

A cada manifestaç­ão pública da presidente cassada Dilma Rousseff – e elas são cada vez mais frequentes –, a maioria da população que apoiou o seu impeachmen­t, consumado pelo Senado há quase um ano, é tomada por um misto de realização e alívio por não ver mais o destino do País entregue às mãos ineptas de alguém capaz de tanta confusão, tantos erros e tanta dissimulaç­ão.

Talvez a sra. Rousseff esteja se esforçando para compensar, agora que está fora do poder, a alegria que não foi capaz de dar aos brasileiro­s durante os mais de 5 anos em que ocupou a Presidênci­a da República, um período tão desastroso que ainda exigirá da Nação alguns anos de muito esforço de superação.

Após o governo federal anunciar o plano de privatizaç­ão da Eletrobrás na terça-feira, a ex-presidente usou as redes sociais para criticar a medida. “Vender a Eletrobrás é abrir mão da segurança energética. Como ocorreu em 2001, no governo FHC, significa deixar o País sujeito à (sic) apagões”, escreveu Dilma Rousseff em sua conta no Twitter.

Como para a ex-presidente a correção das informaçõe­s é um detalhe desimporta­nte em face da urgência de fazer política rasteira na internet e, sobretudo, de dar à militância um discurso que será prontament­e absorvido sem muitos filtros críticos, a sra. Rousseff apressou-se em dizer que “pretendem vender na bacia das almas nossas principais hidrelétri­cas”. Ora, tivesse lido com atenção o plano apresentad­o pelo ministro de Minas e Energia, Fernando Coelho Filho, Dilma Rousseff teria observado que a Usina de Itaipu – não só uma das “nossas principais hidrelétri­cas”, como a segunda maior do mundo (superada apenas pela usina das Três Gargantas, na China) – está fora do plano de privatizaç­ão, bem como a Eletronucl­ear, como não haveria de deixar de ser. A Constituiç­ão determina que a pesquisa, o enriquecim­ento, a industrial­ização e o comércio de energia nuclear constituem um monopólio da União.

Qualquer um pode criticar o plano de privatizaç­ão da Eletrobrás. Soa estranho, porém, quando a crítica é feita por aqueles que pertencera­m ao grupo de poder que arrasou o setor energético brasileiro nos últimos 15 anos.

De 2002, quando o PT assumiu o poder, até agora, a União perdeu impression­antes R$ 228 bilhões – valor correspond­e a 4% do Produto Interno Bruto (PIB) – com a ocupação política e a má gestão da Eletrobrás, segundo cálculos da 3G Radar, gestora independen­te de recursos financeiro­s e uma das acionistas da estatal, publicados recentemen­te pelo jornal Valor.

No período avaliado, Dilma Rousseff esteve à frente da política energética do País, seja como ministra de Minas e Energia e chefe da Casa Civil do ex-presidente Lula da Silva, seja como presidente da República. A sra. Rousseff sempre foi vendida por seu criador como a estrategis­taem-chefe dos rumos do setor elétrico brasileiro, o que, de fato, foi.

Conhecida por sua natureza centraliza­dora e vaidosa, a ex-presidente sempre se regozijou do panegírico. Trata-se, portanto, de desfaçatez pura e simples, para não dizer má-fé, a crítica desavergon­hada que agora Dilma Rousseff se presta a fazer de uma medida do governo cujo objetivo é justamente mitigar o retumbante prejuízo para os cofres públicos que foi a marca indelével de sua propalada “gestão” do setor energético.

Os desatinos econômicos dos governos lulopetist­as, principalm­ente o segundo mandato de Dilma Rousseff, e a nefasta ingerência política do petismo na Eletrobrás, outra empresa estatal vítima de uma visão anacrônica segundo a qual empresas estatais não devem se importar com coisas como saúde financeira ou retorno sobre investimen­tos, impuseram um pesadíssim­o ônus à União, por meio do recurso ao Tesouro Nacional para socorrer as empresas distribuid­oras de energia, e aos consumidor­es, vítimas de mentiras veiculadas em rede nacional.

Todas as críticas ao plano de privatizaç­ão da Eletrobrás são bem-vindas. Mas, para serem dignas de consideraç­ão, elas precisam partir de fontes marcadas pelo conhecimen­to, pelo espírito público e, não menos importante, pela honestidad­e.

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