Os limites para a queda do desemprego
“São 13 milhões de desempregados! ”, berra o deputado na tribuna. É uma frase de efeito e choca. No entanto, é enganosa. Ao citar o número de desocupados, o orador procura dramatizar a situação, passando a ideia de que, não fossem os erros do governo – falo em tese, não me refiro a um governo específico –, não haveria desempregados. Claro, isso é falso. A taxa de desemprego jamais poderá ser zero. No mínimo haverá o chamado desemprego friccional, ou seja, aquele decorrente da rotatividade da mão de obra. No Brasil, a questão é mais séria, como veremos.
São considerados desempregados os indivíduos em idade ativa que, estando desocupados, declararam que procuraram emprego e não encontraram, no período relevante para a pesquisa. Esse conceito é importante para o que será discutido a seguir.
Edmund Phelps, Prêmio Nobel de Economia, desenvolveu o conceito da taxa de desemprego não aceleradora da inflação, ou, na sigla em inglês, Nairu (non-accelerating inflation rate of unemployment). Quando a taxa de desemprego cai abaixo da Nairu, os salários tendem a crescer mais rapidamente que a produtividade, gerando pressões inflacionárias. Ou a inflação se acelera, corroendo o valor real dos salários ou o BC eleva o juro, o que contrai a atividade econômica até que a taxa de desemprego volte à Nairu.
A Nairu não pode ser observada diretamente. Ela é estimada por modelos estatísticos e nós, economistas, apenas temos uma ideia aproximada de sua ordem de grandeza. Mas tudo indica que essa taxa no Brasil seja muito elevada.
Durante os 10 anos que durou o boom das commodities (2004-2013), decorrente do crescimento explosivo da China, o desemprego no Brasil registrou taxas anormalmente baixas, não sustentáveis. Nossa relação de trocas (preço das exportações sobre preço das importações) atingiu picos históricos, valorizando o real. A renda gerada no setor de commodities, e em toda cadeia produtiva a ele ligada, aumentou o consumo e o investimento, aquecendo o mercado de trabalho, sem grandes pressões inflacionárias, pois a queda da taxa de câmbio compensava a pressão de custo salarial para as empresas. Com isso, os modelos estatísticos subestimavam a Nairu.
Nossas estimativas atuais, expurgando o efeito China e incluindo os dados recentes do IBGE, mostram que a Nairu no Brasil se situa pouco acima de 10%. É muito superior ao padrão internacional. Mais uma jabuticaba. Uma das prováveis causas dessa anomalia é a baixa qualificação da mão de obra. Muitas pessoas que tentam se colocar não possuem as habilidades mínimas exigidas. As inovações tecnológicas e o maior uso de máquinas e equipamentos digitais exigem trabalhadores mais treinados, mesmo para o chamado trabalho não qualificado. Ou seja, há um contingente de pessoas que aparecem nas estatísticas de desemprego, mas que, por falta de qualificação, provavelmente jamais serão contratadas.
A segunda razão é o nosso sistema de proteção social ao desempregado. A liberação do Fundo de Garantia, acrescido por 40% de multa no caso de demissão sem justa causa (ou quando esta é simulada, o que é comum) e as regras relativamente generosas do seguro-desemprego fazem surgir a figura do “falso desempregado”, ou seja, aqueles que se declaram sem emprego e informam que procuraram colocação, mas, na verdade, pouco se empenharam para conseguir um novo trabalho.
A conclusão é que, uma vez superado o ciclo recessivo, o recuo da taxa de desemprego tende a ser bem menor do que muitos esperam, talvez algo em torno de 2 a 3 pontos porcentuais em relação ao patamar atual. Não serão mais 13 milhões, mas ainda assim 10 ou 11 milhões de desempregados. Qual é a receita para superar isso e aumentar a empregabilidade sem pressões inflacionárias? Uma revolução, para melhor, na educação e na preparação da mão de obra para o mercado de trabalho é, sem dúvida, o mais importante passo.
Há um contingente de pessoas que, por falta de qualificação, provavelmente jamais serão contratadas