O Estado de S. Paulo

45 anos depois, muitas cicatrizes

Atentado ocorrido na Vila Olímpica que teve a morte de 17 pessoas ainda causa sofrimento em quem viveu de perto

- Paulo Favero

O dia 5 de setembro de 1972 ficou marcado na história pelo atentado terrorista nos Jogos de Munique, na Alemanha. Na ocasião, o grupo Setembro Negro entrou armado na Vila Olímpica e fez membros da delegação de Israel de reféns. Ligados à OLP (Organizaçã­o para a Libertação da Palestina), os terrorista­s queriam a libertação de 234 palestinos que estavam presos em Israel.

O triste episódio da história esportiva ainda entristece Luiz Cláudio Menon 45 anos depois. Ele foi o porta-bandeira da delegação brasileira nos Jogos de Munique. “Essa Olimpíada me traz uma ambiguidad­e de sentimento­s. Fui indicado para ser o porta-bandeira, uma honraria rara, para poucos atletas, e conseguir isso foi uma emoção muito grande para mim. Mas poucos dias depois houve aquele atentado que tirou o brilho da Olimpíada”, explica.

Na época o drama foi enorme porque a polícia alemã não divulgava detalhes do que aconteceu. “Evidenteme­nte que não foi só para nós da delegação brasileira esse temor, todos os atletas sentiram muito aquela manifestaç­ão terrorista contra atletas judeus, que foram assassinat­os”, diz. No total, 17 pessoas foram mortas, incluindo judeus, palestinos e até um policial alemão.

Diferentem­ente de hoje em dia, naquela época os Jogos Olímpicos não tinham uma preocupaçã­o grande com segurança. Os terrorista­s então pularam os muros do alojamento dos atletas, e quem viu não se deu conta de que era uma ação orquestrad­a para espalhar terror. Outro detalhe é que a segurança no interior da Vila Olímpica não era armada.

Dentro do alojamento, os terrorista­s usavam uniforme da delegação israelense e traziam nas mochilas granadas e fuzis Kalashniko­v. Conseguira­m chegar no local onde estava parte da delegação de Israel e mataram dois atletas, fazendo outros de reféns. A partir daí, começou uma longa negociação e o pedido de libertação de prisioneir­os teria de ser atendido até às 9h da manhã caso contrário os reféns seriam mortos.

Sem conseguir a aprovação da liberação dos prisioneir­os, os sequestrad­ores pediram então helicópter­os e avião para poder fugir para o Egito. Quando alguns deles faziam a inspeção na aeronave, franco-atiradores da polícia alemã dispararam contra eles. Houve troca de tiros e arremesso de granadas contra os helicópter­os. Todos os nove reféns morreram.

Tudo isso acabou com o clima festivo dos Jogos de Munique. “A morte de vários atletas judeus deixou a gente muito aborrecido. A alegria foi substituíd­a pela tristeza”, conta. Menon lembra que o impacto chegou até no time de basquete, que era candidato à medalha. “Todos nós ficamos muito aborrecido­s e nos ajudamos na tentativa de resolver aquela situação de angústia e tristeza. A equipe não estava bem em termos de relacionam­ento e esse fato talvez tenha ajudado um pouco na união do grupo. Tínhamos chance de medalha, mas os resultados foram pífios. Claro que, com esse episódio, as coisas se agravaram e não foi suficiente para ir ao pódio.”

Na época dos Jogos de Munique, Menon estava no segundo ano de residência em medicina. Por causa disso, não pôde viajar junto com a delegação brasileira e teve de ir para a Alemanha um pouco depois. Chegando lá, um carro com motorista esperava por ele e passaram o recado que o major Sylvio de Magalhães Padilha, chefe da delegação e presidente do COB (Comitê Olímpico do Brasil) na época, queria falar com ele.

“Cheguei lá e ele me disse que eu tinha sido escolhido por unanimidad­e para ser o porta-bandeira da equipe. E me falou algo que nunca esqueci: que eu tinha sido escolhido não apenas pelo que eu representa­va como atleta, mas porque eu sabia exatamente o que estava carregando. Conto essa história e me arrepio só de lembrar. Fiquei atônito e agradeci pela honra de ser o porta-bandeira”, revela.

Menon explica que a Olimpíada de Munique foi a primeira com television­amento ao vivo. Então sua família ficou feliz em vê-lo como porta-bandeira, mas depois preocupada com os ataques terrorista­s. “A alegria foi substituíd­a pela tristeza.”

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ACERVO/ESTADÃO-29/05/2012 Horror. Ataque da Organizaçã­o para a Libertação da Palestina surpreende­u o movimento olímpico e mudou o rumo dos Jogos

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