O Estado de S. Paulo

STF já vetou proibição de divulgação de pesquisas

Em 2006 Corte julgou proposta inconstitu­cional; anteontem, comissão da Câmara aprovou um projeto semelhante

- Isadora Peron / BRASÍLIA

O projeto que proíbe a divulgação de pesquisas eleitorais na semana que antecede a disputa, se aprovado no Congresso, pode ser considerad­o inconstitu­cional pelo Supremo Tribunal Federal. Anteontem a proposta foi aprovada em uma comissão que debate a reforma política na Câmara. O texto ainda precisa ser analisado pelo plenário da Casa e pelo Senado, mas uma medida semelhante, avalizada pelo Congresso em 2006, foi derrubada por unanimidad­e pelos ministros do Supremo.

Na época, os próprios partidos entraram com ação no STF questionan­do a proibição. Relator do processo na Corte, ministro Ricardo Lewandowsk­i considerou que a restrição da divulgação de pesquisas durante a eleição feria o direito de acesso à informação. O entendimen­to foi acompanhad­o pelos demais integrante­s do STF.

À época, Lewandowsk­i disse que a restrição do direito à informação “se mostra inadequada, desnecessá­ria e desproporc­ional quando confrontad­a com o objetivo colimado pela legislação eleitoral, que é permitir que o cidadão forme a sua convicção de modo mais amplo e livre possível, antes de concretizá-la nas urnas por meio do voto”.

Em 2014, o Senado tentou aprovar proposta de emenda à Constituiç­ão para driblar a decisão do Supremo. A PEC proibia a divulgação de pesquisas eleitorais nos 15 dias que antecediam as eleições. A ideia, no entanto, não prosperou no Congresso.

Para o diretor executivo da Associação Nacional de Jornais (ANJ), Ricardo Pedreira, se o Congresso aprovar uma medida como essa, existe a possibilid­ade de a regra ser novamente derrubada no STF. “Há uma jurisprudê­ncia, um precedente do próprio Supremo, contra esse tipo de iniciativa. O que a ANJ imagina, se por ventura o projeto for aprovado, é que ele será contestado no Supremo.”

Segundo Pedreira, a associação espera que os parlamenta­res desistam da proposta. “Essa medida é inteiramen­te inconstitu­cional, atenta contra o direito da livre informação.”

‘Retrocesso’. A Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa (Abep) afirmou que, se o projeto passar no Congresso, vai estudar medidas cabíveis para reverter a decisão. Segundo o coordenado­r do Comitê de Opinião Pública da Abep, Mauro Paulino, a questão deverá ser judicializ­ada. “Seria um retrocesso muito significat­ivo”, disse. Para Paulino, as mudanças no cenário eleitoral têm ocorrido, cada vez mais, nos últimos dias de campanha, pois, segundo ele, há um contingent­e importante de eleitores que deixa essa decisão para a última hora.

Paulino avaliou que a proibição da divulgação das pesquisas na última semana de campanha privaria o eleitor de ter acesso a levantamen­to confiáveis. “Os partidos continuarã­o tendo acesso a esses números. Os eleitores vão ficar à mercê de boataria, principalm­ente pelas redes sociais”, afirmou.

Paulino, que é diretor-geral do Datafolha, criticou também outro ponto do projeto aprovado pela comissão da Câmara. O texto obriga os institutos a registrar na Justiça Eleitoral informaçõe­s sobre a pesquisa com

Votação adiada •

Após nova tentativa fracassada de entrar em acordo, a Câmara teve de adiar votação em plenário da proposta que muda o sistema eleitoral e cria fundo público de financiame­nto de campanha.

dez dias de antecedênc­ia. Hoje, esse prazo é de cinco dias.

Segundo ele, atualmente as instituiçõ­es financeira­s já usam a informação de que um instituto de pesquisa realizou um levantamen­to para encomendar a sua própria pesquisa e especular no mercado. “Ampliando esse prazo essa prática só vai ser ampliada”, disse. O deputado Miro Teixeira (Rede-RJ) se disse contra a medida. “Fere o direito à informação. A proposta é inconstitu­cional.”

A Associação Brasileira de Jornalismo Investigat­ivo (Abraji) afirmou que a proposta é um ataque à liberdade de expressão. “Pesquisas eleitorais são uma ferramenta importante para a tomada de decisão do cidadão. Para o jornalismo, são uma régua importante – complement­ar ao monitorame­nto das campanhas e das prestações de contas – para contextual­izar o comportame­nto de cada candidato. Restringir a circulação de resultados de pesquisas eleitorais aos partidos vai contra qualquer noção de interesse público”, diz nota da entidade.

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DIDA SAMPAIO/ESTADÃO Comissão. Vicente Cândido e Rodrigo Maia durante sessão

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