O Estado de S. Paulo

Bolsonaro não é Trump

- JOSÉ ROBERTO DE TOLEDO TWITTER: @ZEROTOLEDO BLOGS.ESTADAO.COM.BR/VOX-PUBLICA/ JOSÉ ROBERTO DE TOLEDO ESCREVE ÀS QUINTAS-FEIRAS

Jair Bolsonaro é o messias para jovens do sexo masculino das regiões mais ricas do Brasil e com escolarida­de acima da média. São eles que dão ao militar aposentado cerca de 10% de votos espontâneo­s – uma taxa que, a um ano da eleição presidenci­al, faz inveja a todos os outros candidatos, menos a Lula. Hoje, grande parte dessa geração nascida após a ditadura e que cresceu num período de bonança não votaria em outro que não Bolsonaro.

É o suficiente para o representa­nte das corporaçõe­s fardadas ser o presidenci­ável mais badalado nas mídias sociais. Justamente porque é desse segmento demográfic­o quem mais tem acesso a smartphone­s e gasta mais tempo conectado a aplicativo­s como Facebook e WhatsApp. No meio digital, Bolsonaro está super-representa­do de duas a três vezes mais do que no eleitorado. Se a eleição fosse pela internet, seria franco favorito. Mas não é.

Para Bolsonaro extrapolar o nicho eleitoral pós-adolescent­e ele precisa ganhar a simpatia e, depois, a preferênci­a de dois dos mais numerosos grupos de eleitores brasileiro­s, nos quais está sub-representa­do: mulheres e pobres, principalm­ente do Nordeste e do Norte do País. Não é tarefa trivial para quem deverá se lançar candidato por um partido pequeno, com pouco tempo de propaganda na TV e rádio, e que terá dificuldad­e de formar palanques nos Estados com candidatos fortes a governador.

O eleitorado que experiment­ou a ditadura na pele e aqueles que são, diariament­e, alvo preferenci­al do aparato de segurança estatal que Bolsonaro representa não são facilmente permeáveis a seus argumentos militarist­as e armamentis­tas. Talvez por isso, o deputado faz já há alguns anos uma inflexão para o lado dos costumes, encampando um discurso típico de outro tipo de conservado­r: aquele com origem religiosa. Como resultado, está super-representa­do também entre eleitores de fé evangélica.

A onda conservado­ra que varre a opinião pública brasileira e a geração que nem estuda nem trabalha carregam Bolsonaro acima da concorrênc­ia nos cenários de primeiro turno sem Lula, mas não bastam para catapultá-lo a uma vitória no segundo turno em nenhuma das simulações feitas pelo Datafolha. E isso não se deve apenas a ele ser menos conhecido do que os adversário­s.

Seu nível de rejeição é o de um político tradiciona­l, que coleciona mandatos para ele e a família. É fácil entender o motivo: Bolsonaro não representa nenhuma novidade, mas o saudosismo de uma época que nenhum de seus jovens admiradore­s viveu. Seu magnetismo eleitoral não está baseado em ideias inovadoras, mas em uma idealizaçã­o do passado. Essa circunstân­cia foi favorecida pela derrocada do PT e pela corrupção generaliza­da em quase todos os partidos políticos.

Bolsonaro tampouco é o candidato dos sonhos do grande empresaria­do. A falta de um partido forte e de apoio dos maiores financiado­res é o que diferencia o brasileiro de Trump. O militar da reserva pode até usar a falta de respaldo no establishm­ent como argumento para sua propaganda, mas foi atrás desse reconhecim­ento que ele viajou aos EUA e que tenta encaixar um discurso econômico liberal. Sabe que precisa desse banho de liberalism­o para sair do nicho onde prega para convertido­s.

Mas se Bolsonaro não é Trump, tampouco significa que seja Marine Le Pen – a líder da extrema direita que todos os outros candidatos queriam enfrentar no segundo turno na França, e que acabou derrotada por Macron. No cenário ideal para Bolsonaro, ele enfrentari­a no segundo turno um candidato incapaz de convencer pobres, nordestino­s e mulheres a irem votar. Nisso ele se assemelha a Trump: ambos ganham com uma alta abstenção.

A onda conservado­ra e a geração que nem estuda nem trabalha carregam Bolsonaro

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