O Estado de S. Paulo

Azar da Copa

- MARÍLIA RUIZ E-MAIL: MARILIA.RUIZ@ESTADAO.COM FACEBOOK: FACEBOOK.COM/MARILIARUI­Z TWITTER: TWITER.COM/MARILIARUI­Z

Passamos semanas lamentando o quão quase dolorido seria o Mundial da Rússia se Cristiano Ronaldo e Messi não se classifica­ssem. Como se o futebol fosse um esporte individual, as estrelas mais brilhantes do esporte mais popular do mundo ofuscaram o possível fiasco das suas próprias seleções. Não aconteceu. Portugal e Argentina lá estarão como protagonis­tas. Chegarão altivos. No caso da Argentina, chegará como uma das favoritas.

A Copa do Mundo é um show. O maior evento esportivo do mundo. É feita de estrelas. Cria heróis. Mas futebol não é apenas o que acontece durante 90 minutos dentro de um campo de grama. Não são as 17 regras frias aplicadas por um sujeito de preto.

As classifica­ções do Egito, da Costa Rica, da Islândia (o país com mais talentos per capita do mundo) e do Panamá (!!!) criaram histórias que serão contadas e recontadas. A desclassif­icação da Síria idem. Essa é uma daquelas “injustiças” que serão corrigidas em um universo alternativ­o.

Eu gosto de acreditar que existe uma dimensão paralela em que os deuses do futebol consertam o que nós humanos deixamos passar porque somos fa- lhos. Lá Zico venceu a Copa de 1982. Falcão venceu duas (a de 1978 também). Sócrates foi campeão do mundo. A Holanda ganhou a Copa de 1974 e Portugal, a de 1966. O Brasil não ganhou em 1994. Também não chegou nas semifinais em 2014: perdeu do Chile nas oitavas, que perdeu para a Colômbia nas quartas.

No mundo onde nossas falhas foram consertada­s (sem a necessidad­e do árbitro de vídeo), não existe discussão sobre quem foi o melhor jogador da história. A Fifa etérea é presidida por um conselho de “velhinhos” da Internatio­nal Board: Puskas, Di Stefano, Cruyff e Carlos Alberto Torres. Não existem confederaç­ões nem federações. Técnicos e jogadores sabem falar, pensar, articular pensamento­s e se organizar. Azar da Copa do Mundo ela não ser assim.

Azar de ela ser um evento que faz pulsar o coração de bilhões de torcedores de uma forma tão inacredita­velmente emocionant­e (recomendo os muitos ví- deos que viralizara­m aqui e acolá), mas corrompido por suspeitas de compra de votos, corrupção e propina em todas as pontas que envolvem a sua organizaçã­o, por um sistema de classifica­ção no mínimo estranho, que tem um ranking “com brechas”, e que é feita para gerar bilhões para uma instituiçã­o privada (ainda que de interesse público).

Enquanto só se falava sobre Messi e CR7, azar da Copa que a Síria não se classifico­u

Não, não é possível separar o orgulho patriota que a camisa amarela pode gerar de tudo isso. É muito fácil ter admiração pelo time que Tite formou. Fluem os adjetivos superlativ­os para elogiar a campanha e estar otimista com as chances reais do hexacampeo­nato.

Mas fico muito constrangi­da como brasileira com o pacote futebol jogado e, digamos, futebol arquitetad­o. Imagine na Copa.

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