O Estado de S. Paulo

FMI vê dívida pública em alta até 2022

Contas públicas do Brasil devem melhorar, mas superávit primário só voltará em 2021, segundo projeções feitas pela instituiçã­o internacio­nal

- Rolf Kuntz ENVIADO ESPECIAL / WASHINGTON

Depois de seis anos no vermelho, em 2021 as contas públicas do Brasil voltarão ao equilíbrio primário, pelo menos nas projeções do Fundo Monetário Internacio­nal (FMI). Se o esforço de ajuste continuar, a reforma da Previdênci­a estiver logo em vigor e o teto de gastos permanecer sem furo, o déficit primário será zerado e convertido em modesto superávit, equivalent­e a 0,2% do Produto Interno Bruto (PIB). Esse resultado positivo ainda será insuficien­te para cobrir toda a conta de juros e a dívida bruta crescerá pelo menos até 2022, último ano das projeções divulgadas ontem. Contas públicas em desor- dem são herança deixada pela presidente Dilma Rousseff. Em 2015, o superávit primário foi zerado e o desarranjo cresceu nos anos seguintes. Em 2016, o déficit bateu em 2,5% do PIB, proporção estimada também para este ano. Pelas contas do FMI, esse desajuste deverá diminuir a partir de 2018 e desaparece­r no terceiro ano de mandato do próximo presidente.

Essas projeções se referem às contas do governo geral, formado pelas administra­ções da União, dos Estados e dos municípios, mas o componente mais importante é de longe o poder central. O governo da União tem conseguido impor algum controle aos gastos do Tesouro, mas o desajuste da Previdênci­a cresce acada ano eéa causa principal do buraco nas contas públicas.

A reformado sistema de pensões e aposentado­ria sé amais importante acurto prazo, comentou ontem, em entrevista, o diretor do Departamen­to de Assuntos Fiscais do FMI, Vitor Gaspar. O argumento a favor da urgênciaéo mesmo usado por autoridade­s brasileira­s: essa reforma será essencial para a sus- tentação do teto de gastos. A criação do teto, segundo Gaspar, foi um “progresso real” na gestão fiscal brasileira.

Como ainda haverá déficit primário até 2020 e o superávit estimado para 2021 será modesto, o déficit nominal do governo – o saldo calculado com a conta de juros – continuará muito grande, embora declinante. Pelos cálculos do FMI, esse déficit deve atingir 9,2% do PIB neste ano e diminuir até 7,3% em 2022. O pico, 10,3%, ocorreu em 2015, primeiro ano completo da recessão, quando a economia brasileira encolheu 3,8%.

Dívida. Essa combinação resultará no aumento da dívida bruta do governo geral. Pelas contas do FMI, essa dívida passará de 83,4% do PIB este ano para 96,9% em 2022. O endividame­nto público brasileiro, menor que o de algumas economias avançadas, é muito mais pesado que o da maior parte dos países emergentes e em desenvolvi­mento, 48,4%, em média, neste ano e 55% no fim do período da projeção.

Os cálculos oficiais de Brasília apontam números menores, porque os títulos do Tesouro detidos pelo Banco Central são excluídos do cálculo. Há discussões sobre o critério mais adequado, mas as tabelas do FMI oferecem a vantagem de permitir comparaçõe­s entre países. O argumento a favor do padrão adotado no Fundo é muito sim- ples: papéis emitidos pelo Tesouro representa­m dívida, estejam onde estiverem.

Ao apresentar a nova edição do Monitor Fiscal, publicado pelo FMI em abril e em outubro, Vitor Gaspar repetiu a avaliação positiva do cenário global de recuperaçã­o, já exposta no dia anterior pelo economista­chefe da instituiçã­o, Maurice Obstfeld. A recuperaçã­o ganhou impulso, envolve a maior parte das economias e cria uma oportunida­de, observou Gaspar, “para a promoção de cresciment­o inclusivo e sustentáve­l pela implementa­ção de reformas estruturai­s e pelo tratamento de desequilíb­rios e vulnerabil­idades”.

Desigualda­de. O combate à desigualda­de por meio do cresciment­o inclusivo foi tratado como tema especial do relatório. Sem apresentar fórmulas fechadas para todos os casos, os autores do Monitor Fiscal discutem formas de redução das desigualda­des por meio do manejo das finanças públicas. Tributação progressiv­a, renda básica, transferên­cias financeira­s e programas de investimen­to (como em educação e saúde) são listados como possíveis instrument­os de inclusão.

Em resposta a uma pergunta, Vitor Gaspar mencionou o Bolsa Família e outros programas sociais como fatores de redução da desigualda­de de renda no Brasil.

“A criação do teto de gastos foi um progresso real na gestão fiscal brasileira.”

Vitor Gaspar

DIRETOR DO DEPARTAMEN­TO DE

ASSUNTOS FISCAIS DO FMI

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JIM LO SCALZO/EFE Cenário global. Vitor Gaspar, do FMI, faz avaliação positiva

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