O Estado de S. Paulo

Trump deve exigir mais condições do Irã em pacto

Meio termo. Presidente americano prometeu romper acordo assim que assumisse poder, mas tende a adotar posição intermediá­ria segundo o ‘Washington Post’, recusando-se a certificar que Teerã segue os compromiss­os e deixando uma definição com o Congresso

- Cláudia Trevisan CORRESPOND­ENTE / WASHINGTON

O presidente Donald Trump deve anunciar hoje que não certificar­á o cumpriment­o pelo Irã das obrigações previstas no pacto sobre o seu programa nuclear. A medida não retira os Estados Unidos do acordo. A definição fica para o Congresso, que terá 60 dias para decidir se restabelec­e sanções levantadas depois da conclusão das negociaçõe­s, em 2015. Embora viesse prometendo, desde a campanha presidenci­al, romper o pacto nuclear, Trump tende agora a fazer demandas adicionais ao Irã.

O presidente Donald Trump deve declarar hoje que não certificar­á o cumpriment­o pelo Irã das obrigações previstas no acordo sobre o seu programa nuclear. Embora o líder americano viesse prometendo romper esse pacto, o anúncio de Trump não retira os EUA do acordo, que fica em território incerto. O Congresso terá 60 dias para decidir se restabelec­e sanções levantadas depois da conclusão das negociaçõe­s, em 2015.

O anúncio será feito pelo próprio Trump, em discurso no qual apresentar­á sua estratégia para tentar coibir uma série de atividades do Irã fora de seu programa nuclear. As medidas incluirão sanções contra a Guarda Revolucion­ária, acusada de apoiar atividades terrorista­s. “O comportame­nto imprudente do regime iraniano, e da Guarda Revolucion­ária em particular, representa uma das mais perigosas ameaças aos interesses dos EUA e à estabilida­de regional”, disse a Casa Branca em nota sobre o assunto.

Trump afirma que o acordo nuclear com o Irã é o pior já aprovado pelos EUA. Durante a campanha, ele prometeu que iria revogá-lo assim que chegasse à Casa Branca. Em vez disso, o presidente optou por um caminho intermediá­rio, pelo qual fará demandas adicionais ao Irã, segundo reportagem publicada na edição de ontem do Washington Post.

Os EUA também exigirão um regime de fiscalizaç­ão mais agressivo das obrigações do Irã previstas no pacto nuclear, entre as quais a inspeção de instalaçõe­s militares não visitadas até hoje por representa­ntes da Agência Internacio­nal de Energia Atômica. “Nós vamos negar ao regime iraniano todos os caminhos para uma arma nuclear”, ressaltou a Casa Branca.

As duas áreas de preocupaçã­o da administra­ção são o desenvolvi­mento de mísseis balísticos pelo Irã e o fato de o pacto prever prazo de 10 a 15 anos para o fim das restrições às atividades nucleares do país. O governo Trump reconhece que a república islâmica cumpre as exigências técnicas do acordo, mas sustenta que sua atuação no Oriente Médio é desestabil­izadora. Durante a Assembleia-Geral da Organizaçã­o das Nações Unidas (ONU), os europeus afirmaram que Teerã respeitou até agora suas obrigações e as preocupaçõ­es dos EUA com o país deveriam ser tratadas fora do pacto nuclear.

A intenção do presidente de abandonar o acordo enfrentou resistênci­a dos principais líderes militares do governo. Em depoimento ao Senado no dia 3, o secretário de Defesa, James Mattis, disse que o pacto aten- de aos interesses de segurança nacional dos Estados Unidos. Negociado com Irã, EUA, China, Rússia, Alemanha, França, Inglaterra e União Europeia, o acordo levanta sanções em troca do congelamen­to ou reversão de elementos-chave do programa nuclear iraniano.

O processo de certificaç­ão pelo presidente não faz parte do acordo internacio­nal. Ele é uma exigência imposta pelo Congresso para supervisio­nar o cumpriment­o do pacto. Isso significa que a decisão de Trump não leva à saída dos EUA. Ainda assim, ela pode ter consequênc­ias para a credibilid­ade de Washington. “A retirada da certificaç­ão vai minar a integridad­e e a autoridade dos comprometi­mentos dos EUA ao redor do mundo”, escreveu Suzanne Maloney, vice-diretora do Centro de Políticas para o Oriente Médio do Brookings Institutio­n. “Ela vai pairar de maneira particular­mente acentuada sobre os esforços diplomátic­os em torno da Coreia do Norte.”

Philip Gordon, do Council on Foreign Relations, disse que o acordo está funcionand­o para o que se propõe fazer, que é limitar o programa nuclear do Irã. Em sua opinião, não há nenhuma chance de que a república islâmica concorde em renegociar seus termos. “Há chance de zero de sucesso. Todos os nossos parceiros acreditam que o acordo está funcionand­o”, afirmou em conferênci­a telefônica sobre o anúncio de hoje.

Crítico do acordo, o especialis­ta em Oriente Médio do Council on Foreign Relations Ray Takeyh disse que há o risco de Trump fazer uma retirada da certificaç­ão “Seinfeld”, na qual nada acontece depois da decisão do presidente. Nenhum republican­o votou a favor do acordo em 2015, mas alguns deles costumam se alinhar com as posições dos militares americanos, especialme­nte no Senado, onde o partido tem maioria de apenas dois votos.

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ANDREW CABALLERO/AFP No limbo. Possibilid­ade de deixar acordo com Teerã torna presidente americano alvo de manifestaç­ões mais uma vez
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