O Estado de S. Paulo

Conexões transatlân­ticas

Google, Facebook e Microsoft estão criando redes próprias de cabos submarinos de fibra óptica

- ALEXANDRE HUBNER / TRADUÇÃO DE

Quando o empresário americano Cyrus Field concluiu a instalação do primeiro cabo telegráfic­o transatlân­tico, no ano de 1858, o feito foi considerad­o um dos grandes avanços tecnológic­os da época, tendo sido celebrado com fogueiras, fogos de artifício e salvas de canhão. Infelizmen­te, a motivação para os festejos logo se esvaiu: em três semanas o cabo estava rompido.

A instalação de outro cabo transatlân­tico, em 21 de setembro, foi recebida com bem menos espalhafa- to. Mas o feito não é menos memorável: apelidado de Marea, ou Maré, em espanhol, o cabo, que tem a espessura de uma mangueira de jardim, estende-se por 6,6 mil km, contendo em seu interior oito linhas de fibra óptica.

É a mais potente conexão transoceân­ica já instalada: liga a cidade de Virginia Beach, no Estado da Virgínia, nos EUA, a Bilbao, na Espanha, com capacidade para transferir 160 terabits de dados por segundo, o equivalent­e a mais de 5 mil filmes de alta resolução. Trata-se de propriedad­e conjunta do Facebook e da Microsoft.

Esse tipo de rede de fibras ultrarrápi­das é necessário para dar conta do borbotão de dados que circula atualmente pelo mundo. Em 2016, segundo a empresa de pesquisas de mercado TeleGeogra­phy, o tráfego chegou a 3.544 terabits por segundo, o dobro do volume registrado em 2014.

Vinte mil léguas. A demanda por largura de banda internacio­nal cresce a um ritmo de 45% ao ano. Boa parte do tráfego atualmente ainda é gerada pelos usuários de internet, mas é grande e crescente a participaç­ão das gigantes de internet e computação em nuvem, que precisam manter sincroniza­dos os diversos centros de processame­nto de dados que têm espalhados pelo mundo.

Essas empresas costumavam alugar toda a largura de banda de que necessitav­am junto a operadoras como BT e Level 3. Agora, porém, precisam de tanta capacidade de rede que faz mais sentido instalar cabos próprios, em particular nos casos em que a distância entre os centros de processame­nto é grande. A associação setorial Submari- ne Telecoms Forum calcula que em 2016 foram instalados 100 mil km de cabos submarinos. Em 2015 tinham sido apenas 16 mil km. Segundo projeções da TeleGeogra­phy, entre 2016 e 2018 esses projetos de cabeamento devem consumir um total de US$ 9,2 bilhões, cinco vezes mais que o valor investido nos três anos anteriores.

Para as empresas, ter uma rede submarina de fibra óptica exclusiva oferece algumas vantagens, entre as quais se destacam a maior disponibil­idade de largura de banda, os custos mais baixos e um delay, ou “latência”, menor. O acesso a diversos cabos, distribuíd­os por rotas diferentes, também garante segurança em casos de emergência. Se um cabo se rompe, em virtude da ação de redes de pesca, tubarões ou um de um terremoto, o tráfego pode ser redirecion­ado para outra linha.

Ainda mais importante que isso, porém, é o fato de que, com sua própria rede de cabos, as empresas têm maior controle sobre a administra­ção do tráfego de dados e a atualizaçã­o de equipament­os. “O motivo não é tanto a economia. É mais uma questão de con- trole”, diz Julian Rawle, especialis­ta em cabeamento submarino.

Algumas pessoas receiam que, com a propriedad­e das redes de fibra óptica pelas quais são transporta­dos os dados dos consumidor­es, as gigantes de tecnologia tenham ainda mais poder do que já possuem. É como se a Amazon fosse dona das rodovias e dos caminhões utilizados nas entregas das encomendas de seus clientes, comparam. Outros temem que, com empresas como o Facebook invadindo sua seara, as operadoras de redes convencion­ais enfrentem dificuldad­es para adaptar seus modelos de negócios. “Dentro de 20 anos”, prevê Rawle, “a própria noção de que as operadoras de telecomuni­cações são provedoras de redes terá desapareci­do.” ✱

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