O Estado de S. Paulo

Após polêmica, STF suspende portaria do trabalho escravo

Decisão liminar da ministra Rosa Weber ainda terá de passar pelo plenário do Supremo; Padilha admite que Temer pode revogar medida

- BRASÍLIA / BRENO PIRES, CARLA ARAÚJO, ISADORA PERON E RAFAEL MORAES MOURA

A ministra do STF Rosa Weber suspendeu liminarmen­te ontem a portaria que mudou as regras para fiscalizaç­ão do trabalho escravo. Ela afirmou que a norma pode compromete­r o resultado de anos de “políticas públicas de combate à odiosa prática”. O ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, disse também ontem que Michel Temer pode revogar a portaria. A determinaç­ão teve repercussã­o negativa desde que foi publicada, no dia 16.

A ministra Rosa Weber, do Supremo Tribunal Federal (STF), suspendeu, em decisão liminar, a portaria do Ministério do Trabalho que modificou as regras de combate ao trabalho escravo. Editada no último dia 16, a portaria, que, segundo os críticos, dificultou a punição dos infratores, causou polêmica e mobilizou, inclusive, entidades internacio­nais. A procurador­a-geral da República, Rachel Dodge, chegou a dizer ao ministro do Trabalho, Ronaldo Nogueira, que considerav­a a portaria um “retrocesso à garantia constituci­onal de proteção à dignidade à pessoa humana”.

Diante das reações negativas, o presidente Michel Temer admitiu rever as novas normas, que receberam elogios de ruralistas, como o ministro da Agricultur­a, Blairo Maggi. Ontem, o ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, disse que o presidente pode mesmo revogar a portaria: “O presidente tinha pedido e o ministro do Trabalho estava negociando com Raquel Dodge um texto novo. A negociação prossegue”.

A decisão da ministra Rosa Weber ainda terá de passar por referendo do plenário do Supremo. Rosa é relatora da ação de autoria da Rede Sustentabi­lidade, que pede que a portaria seja declarada inconstitu­cional.

Segundo a ministra, a portaria “atenua fortemente o alcance das políticas de repressão, de prevenção e de reparação às vítimas do trabalho em condições análogas à de escravo”. Ela justi- ficou a liminar afirmando que há “elevado risco de comprometi­mento dos resultados alcançados durante anos de desenvolvi­mento de políticas públicas de combate à odiosa prática de sujeitar trabalhado­res à condição análoga à de escravo”.

A portaria, de acordo com a ministra, “vulnera princípios basilares da Constituiç­ão, sonega proteção adequada e suficiente a direitos fundamenta­is nela assegurado­s e promove desalinho em relação a compromiss­os internacio­nais de cará- ter supralegal assumidos pelo Brasil e que moldaram o conteúdo desses direitos”.

Lista suja. A ministra Rosa Weber criticou também as mudanças trazidas no ato em relação à “lista suja do trabalho escravo”. A portaria determinav­a autorizaçã­o prévia do ministro do Trabalho para inclusão do empregador na “lista suja” e a divulgação da relação. Para ela, essas são medidas administra­tivas que limitam e enfraquece­m as ações de fiscalizaç­ão, “ao contrário de promoverem a diligência necessária para a adequada e efetiva fiscalizaç­ão”.

“Ainda constituem medidas que condiciona­m a eficácia de uma decisão administra­tiva a uma vontade individual de ministro de Estado, que tem notório viés político. Lógica que inverte a postura técnica pela postura política em matéria de conteúdo técnico-jurídico”, disse.

Também ontem, o juiz titular da 11.ª Vara da Justiça do Trabalho do Distrito Federal, Rubens Curado Silveira, determinou

“O presidente Michel Temer tinha pedido e o ministro do Trabalho estava negociando com Raquel Dodge um texto novo. A negociação prossegue.” Eliseu Padilha

MINISTRO DA CASA CIVIL

que o ministro do Trabalho e a União estão obrigados a publicar a “lista suja” do trabalho escravo. O descumprim­ento da medida sujeitará o ministério à aplicação de multa diária no valor de R$ 10 mil. A lista foi criada há cerca de 13 anos e não era publicada desde julho de 2014.

Segundo o magistrado, “o Ministério do Trabalho tem o dever e a responsabi­lidade pela publicação do Cadastro, mas não a sua propriedad­e”.

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WILTON JUNIOR/ESTADÃO Nomes. Rosa Weber criticou a não divulgação da ‘lista suja’

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