Após polêmica, STF suspende portaria do trabalho escravo
Decisão liminar da ministra Rosa Weber ainda terá de passar pelo plenário do Supremo; Padilha admite que Temer pode revogar medida
A ministra do STF Rosa Weber suspendeu liminarmente ontem a portaria que mudou as regras para fiscalização do trabalho escravo. Ela afirmou que a norma pode comprometer o resultado de anos de “políticas públicas de combate à odiosa prática”. O ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, disse também ontem que Michel Temer pode revogar a portaria. A determinação teve repercussão negativa desde que foi publicada, no dia 16.
A ministra Rosa Weber, do Supremo Tribunal Federal (STF), suspendeu, em decisão liminar, a portaria do Ministério do Trabalho que modificou as regras de combate ao trabalho escravo. Editada no último dia 16, a portaria, que, segundo os críticos, dificultou a punição dos infratores, causou polêmica e mobilizou, inclusive, entidades internacionais. A procuradora-geral da República, Rachel Dodge, chegou a dizer ao ministro do Trabalho, Ronaldo Nogueira, que considerava a portaria um “retrocesso à garantia constitucional de proteção à dignidade à pessoa humana”.
Diante das reações negativas, o presidente Michel Temer admitiu rever as novas normas, que receberam elogios de ruralistas, como o ministro da Agricultura, Blairo Maggi. Ontem, o ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, disse que o presidente pode mesmo revogar a portaria: “O presidente tinha pedido e o ministro do Trabalho estava negociando com Raquel Dodge um texto novo. A negociação prossegue”.
A decisão da ministra Rosa Weber ainda terá de passar por referendo do plenário do Supremo. Rosa é relatora da ação de autoria da Rede Sustentabilidade, que pede que a portaria seja declarada inconstitucional.
Segundo a ministra, a portaria “atenua fortemente o alcance das políticas de repressão, de prevenção e de reparação às vítimas do trabalho em condições análogas à de escravo”. Ela justi- ficou a liminar afirmando que há “elevado risco de comprometimento dos resultados alcançados durante anos de desenvolvimento de políticas públicas de combate à odiosa prática de sujeitar trabalhadores à condição análoga à de escravo”.
A portaria, de acordo com a ministra, “vulnera princípios basilares da Constituição, sonega proteção adequada e suficiente a direitos fundamentais nela assegurados e promove desalinho em relação a compromissos internacionais de cará- ter supralegal assumidos pelo Brasil e que moldaram o conteúdo desses direitos”.
Lista suja. A ministra Rosa Weber criticou também as mudanças trazidas no ato em relação à “lista suja do trabalho escravo”. A portaria determinava autorização prévia do ministro do Trabalho para inclusão do empregador na “lista suja” e a divulgação da relação. Para ela, essas são medidas administrativas que limitam e enfraquecem as ações de fiscalização, “ao contrário de promoverem a diligência necessária para a adequada e efetiva fiscalização”.
“Ainda constituem medidas que condicionam a eficácia de uma decisão administrativa a uma vontade individual de ministro de Estado, que tem notório viés político. Lógica que inverte a postura técnica pela postura política em matéria de conteúdo técnico-jurídico”, disse.
Também ontem, o juiz titular da 11.ª Vara da Justiça do Trabalho do Distrito Federal, Rubens Curado Silveira, determinou
“O presidente Michel Temer tinha pedido e o ministro do Trabalho estava negociando com Raquel Dodge um texto novo. A negociação prossegue.” Eliseu Padilha
MINISTRO DA CASA CIVIL
que o ministro do Trabalho e a União estão obrigados a publicar a “lista suja” do trabalho escravo. O descumprimento da medida sujeitará o ministério à aplicação de multa diária no valor de R$ 10 mil. A lista foi criada há cerca de 13 anos e não era publicada desde julho de 2014.
Segundo o magistrado, “o Ministério do Trabalho tem o dever e a responsabilidade pela publicação do Cadastro, mas não a sua propriedade”.