Vera Magalhães
Maia foi habilidoso ao aproveitar o período de negociação da votação para, diferentemente da denúncia anterior, se mostrar como antípoda de Temer.
As avaliações quanto ao placar pelo qual a Câmara vai arquivar a segunda denúncia contra Michel Temer oscilam como a cotação da Bolsa, a depender da variação do preço das commodities da vez, a saber, os deputados. O que é constante, no entanto, é que o presidente dependerá sempre e cada vez mais do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEMRJ), para levar a cabo alguma agenda, por mínima que seja, após ser salvo pela segunda vez.
Maia foi habilidoso ao aproveitar o período de negociação da votação para, diferentemente da denúncia anterior, se apresentar como espécie de antípoda de Temer. Toda a indignação com a ofensiva do PMDB sobre deputados almejados pelo DEM era fachada de um propósito maior: sabedor da absoluta falta de popularidade de Temer e da impossibilidade de ele recuperá-la até as eleições, Maia desenhou um arranjo em que quer fazer vigorar um parlamentarismo na marra.
O veto à discussão de novas medidas provisórias e a conversão de MPs importantes – como a da leniência dos bancos e a das medidas que visam a assegurar a meta fiscal – em projetos de lei que são votados em período recorde nada mais são do que formas de o deputado mostrar que pode atuar como primeiro-ministro de um presidente algo decorativo. Ao negociar diretamente com Maia temas como a reforma da Previdência, o próprio ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, parece transferir a ele parte das prerrogativas de seu chefe de ditar qual será a agenda do “day after”.
A ordem entre os ministros é evitar bolas divididas com o comandante da Câmara até se efetivar o esperado sepultamento da denúncia. Depois disso, auxiliares de Temer acham que ele deve fazer valer o peso do presidencialismo para cortar as asas de Maia. O problema é que, ainda que seja de fato grande o poder do Executivo num regime presidencialista, ele é um tanto menor no caso de um presidente que tem menos de um ano de mandato pela frente, foi alvo de duas denúncias, tem menos de 4% de apoio popular e chegou ao cargo após um impeachment que dividiu o País.
Graças a essa hipossuficiência política, dificilmente Temer poderá retaliar os que votarem contra o governo – como tem ameaçado sem assustar ninguém – ou prescindir de um bom relacionamento com Maia para chegar sem mais sobressaltos ao fim de 2018.