O Estado de S. Paulo

Com festa de luxo, Fifa tenta abafar sua crise

Na cerimônia de escolha do melhor do mundo, ‘nata’ da entidade ostenta e se cala sobre escândalos

- Jamil Chade

Às vésperas de começar a conhecer seu destino nos tribunais dos Estados Unidos, com os julgamento­s dos dirigentes em Nova York, a nobreza do futebol se reuniu segunda-feira em Londres para uma milionária festa de gala da Fifa. O que estava em jogo não era apenas o troféu ao melhor jogador do mundo, mas a ima- gem de uma entidade que tenta convencer o planeta de que superou seus problemas.

Oficialmen­te, a corte formada por cartolas, donos de televisões, treinadore­s, patrocinad­ores e agentes estava proibida de falar sobre os últimos escândalos, como as suspeitas sobre contratos para as Copas de 2026 e 2030 e no Catar. A ordem era a de passar a mensagem de unidade sob a presidênci­a de Gianni Infantino, que te- ria, segundo sua versão, virado a página da crise na Fifa. A estratégia envolvia dar nova imagem para a entidade, mais perto do público e menos arrogante.

Mas, mesmo no pequeno palácio usado para a festa, a reportagem do Estado se deparou com hierarquia­s bem estabeleci­das, uma opulência inabalada e dúvidas sobre qual seria o impacto do recente escândalo entre uma emissora do Catar, a Fifa e o Mundial de 2022.

Maradona posava de rei, exigindo um canto separado no local da recepção para receber aqueles que iam literalmen­te beijar sua mão, entre eles o todo-poderoso presidente do Real Madrid, Florentino Pérez. Como um pajem, Trezeguet acompanhav­a dom Diego de perto, num clima de nobreza que deixava súditos como Catheri- ne Zeta-Jones, Plácido Domingo, o prefeito de Londres, Sadiq Khan, e Andrew Llyod Weber como ilustres desconheci­dos.

A ostentação era a regra, no constante vai e vem de champanhe, nos trajes dos craques, nos quatro brincos de brilhantes de Neymar, nos vestidos de supermodel­os ou nos carros de luxo que os aguardavam. Para a imprensa, a Fifa vendia a preço de ouro espaços no “tapete verde’’ para que os repórteres pudessem entrevista­r os astros.

O local também permitia encontros insólitos. Neymar e seu pai tiveram de esbarrar e dar as mãos ao presidente do Barcelona, Josep Bartomeu, a quem enfrentam na Justiça. No lobby do hotel, crianças de dirigentes árabes usavam peças de arte do local como um parque de diversões, para desespero de seus seguranças privados.

Com ou sem crise, a pompa jamais deixou de existir na Fifa. Não era por acaso que, antes de o evento começar a ser transmitid­o ao mundo ao vivo, o apresentad­or dava orientaçõe­s ao público sobre como se comportar na festa.

Pedindo que mesmo a nobreza londrina ficasse de pé, o anfitrião “ensinava” a aplaudir forte – e que todos fossem aplaudidos, claro. “Pessoal da área vip, tomem mais álcool”, gritava.

Maradona, que depois de chamar Infantino de traidor durante a campanha eleitoral, se transformo­u no melhor amigo do cartola, encerrou o evento com o slogan que a Fifa quer passar ao mundo. “Estamos refundando uma nova Fifa do futebol”, disse, entusiasma­do. Só não se sabe ainda se a Justiça americana – e mesmo a Suíça – concorda.

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JAMIL CHADE/ESTADÃO - 24/10/2017 Reizinho. Maradona parecia ser ainda o dono da bola

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