O Estado de S. Paulo

Juiz italiano critica ‘refúgio’ de Battisti

Presidente da seção criminal da Corte de Cassação da Itália, Piercamill­o Davigo, ressalta que condenação ocorreu de forma ‘inapelável’

- / VITOR MARQUES, CARLA ARAÚJO, RAFAEL MORAES MOURA e BRENO PIRES

O presidente da seção criminal da Corte de Cassação da Itália (Suprema Corte italiana), Piercamill­o Davigo, disse ontem ser “inconcebív­el” que Cesare Battisti seja considerad­o um refugiado. “Cesare Battisti foi condenado de forma inapelável na Itália, ou seja, sentença transitado em julgado. Perdeu seu recurso até mesmo na Corte Europeia de Direitos Humanos, em Estrasburg­o. Para a Itália, é inconcebív­el que ele seja considerad­o um refugiado”, disse o magistrado, que participou do Fórum Estadão Mãos Limpas e Lava Jato, promovido pelo Grupo Estado.

A afirmação de Davigo, um dos magistrado­s que participar­am da Operação Mãos Limpas, na Itália, ocorreu no dia em que a Justiça brasileira proferiu duas decisões que beneficiam Battisti: a reautuação do habeas corpus impetrado pela defesa em reclamação, o que na prática dá mais tempo ao italiano, e a confirmaçã­o do Tribunal Regional Federal da 3.ª Região de que ele poderes ponderem liberdadeà ação em queéac usado de evasão de divisas.

Battisti foi condenado em 1993 na Itália à prisão perpétua por terrorismo, pela participaç­ão em quatro homicídio socorridos na década de 1970, quando era militante do grupo de extrema esquerda Proletário­s Armados pelo Comunismo (PAC). Ele chegou a ser preso na Itália, mas fugiu e, após passar por alguns países, vive no Brasil desde 2007. Dois anos depois, o Supremo Tribunal Federal autorizou a extradição de Battisti, atendendo a um pedi- do do governo italiano, mas determinou que a decisão final sobre o assunto era do presidente da República.

Em 2010, no último dia de seu governo, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva autorizou a permanênci­a do italiano no Brasil. Em junho de 2011, o Supremo entendeu que a decisão de negar a extradição foi um “ato de soberania nacional”.

No começo deste mês, Battisti foi preso em Corumbá, em Mato Grosso do Sul, perto da fronteira com a Bolívia, sob a acusação de evasão de divisas, pois tinha em seu poder US$ 6 mil e ¤ 1,3 mil. Ele afirmou à Polícia Federal, porém, que ia pescar no país vizinho, mas as autoridade­s brasileira­s viram na viagem uma tentativa de fuga do País. O ministro da Justiça, Torquato Jardim, chegou a afirmar que houve “quebra de confiança” com o italiano.

Reclamação. Ontem, ao julgar o habeas corpus ajuizado pela defesa para evitar a extradição de Battisti, o ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal, decidiu reautuar o processo como uma reclamação do governo italiano à decisão de Lula. Com isso, o julgamento que ia acontecer ontem na Primeira Turma da Corte foi adiado por tempo indetermin­ado. Fux já havia decidido que uma eventual extradição não poderia ocorrer enquanto não for julgado o mérito do habeas corpus, transforma­do agora em reclamação.

Na véspera, em manifestaç­ão encaminhad­a ao STF, a Advocacia-Geral da União (AGU) havia defendido o direito do presidente Temer de rever a decisão de Lula com o argumento de que extradição é “ato eminenteme­nte político”. A AGU pediu a rejeição do habeas corpus ajuizado pela defesa do italiano.

Apelo. A defesa de Battisti também encaminhou anteontem ao STF uma manifestaç­ão na qual argumentou sobre a necessidad­e da permanênci­a do italiano no Brasil, para sustentar sua família. Sua ex-mulher Priscila Pereira enviou uma carta à presidente da Corte, ministra Cármen Lúcia, narrando “a aflição que possui sobre eventual extradição do paciente, consideran­do a dependênci­a econômica e afetiva de seu filho”.

Sobre a decisão do STF de reautuar o processo sobre o pedido de extradição, o advogado Igor Tamasauska­s disse que prefere aguardar os desdobrame­ntos da condução no Supremo. Sobre a decisão do TRF-3 de permitir que o italiano responda em liberdade pelo crime de evasão, a defesa de Battisti afirmou que ela “exerce importante controle de legalidade, afastando a arbitrarie­dade da prisão a que - Battisti foi submetido”.

O advogado lembrou que, apesar de responder em liberdade nesse caso, Battisti terá de se apresentar mensalment­e às autoridade­s e necessita de autorizaçã­o judicial para deixar acidadede Cananeia, no litoral paulista, onde reside desde o episódio em Corumbá.

“Battisti foi condenado de forma inapelável na Itália, ou seja, sentença transitado em julgado, e perdeu recurso na Corte Europeia de Direitos Humanos, em Estrasburg­o. Para a Itália, é inconcebív­el que ele seja considerad­o um refugiado”. Piercamill­o Davigo PRESIDENTE DA SEÇÃO CRIMINAL DA CORTE DE CASSAÇÃO DA ITÁLIA

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GABRIELA BILO/ESTADÃO–11/10/2017 Decisão. TRF-3 confirmou ontem que Battisti pode responder em liberdade a ação em que é acusado de evasão de divisas

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