O Estado de S. Paulo

‘O RACISMO NO BRASIL É TÃO DISFARÇADO QUE É DIFÍCIL LUTAR’

- Historiado­ra da Howard University Ana Lucia Araújo

1.É possível imaginar que os esportista­s brasileiro­s protestem como os norte-americanos? Embora sejam espaços de luta política em geral, os esportes não têm sido um espaço de protesto individual e coletivo historicam­ente no Brasil. O câncer do mito da democracia racial está tão impregnado que leva muitos brasileiro­s, inclusive negros, a ignorar o racismo. O racismo à moda brasileira sempre foi tão disfarçado que até lutar contra ele é difícil porque se manifesta de um modo muitas vezes sutil. No Brasil, embora grande parte dos jogadores famosos e de clubes importante­s seja formada por afrodescen­dentes, em função de sua posição social privilegia­da muitas vezes não se veem como negros e não se identifica­m com os homens e mulheres negros e negras que no dia a dia são vítimas da violência policial mortífera e que compõem a maior parte da população carcerária. A razão pela qual os jogadores da NFL, dos EUA, protestam não é fruto de um problema de injúrias raciais em campo. É parte de uma reação à revitaliza­ção da supremacia branca e aos casos frequentes de violência contra jovens negros.

2.Quais as estratégia­s de superação do racismo? Qual é o papel do esporte nisso? Nos dois países, as organizaçõ­es negras devem pautar as estratégia­s para lutar contra o racismo. Educação é fundamenta­l. A legislação brasileira já prevê o ensino de história afro-brasileira, por exemplo. A ampliação das ações afirmativa­s para ingresso nas universida­des públicas, cotas para concursos de docentes no ensino superior e para o acesso geral ao serviço público também são estratégia­s. O reconhecim­ento público de que a violência policial tem como alvo principal os negros e a criação de medidas para remediar essa situação que, no caso do Brasil, beira a definição de genocídio, é outra medida. A descrimina­lização do uso de drogas e a reforma do sistema penitenciá­rio são cruciais. O papel do esporte pode ser o de se tornar um espaço de promoção da diversidad­e racial e da tolerância.

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HOWARD UNIVERSITY Saída. Para Ana Lucia, esporte deve promover a diversidad­e

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