O Estado de S. Paulo

A caminho de ser banco

Startup Nubank lança conta corrente digital

- Claudia Tozetto / COM ALINE BRONZATI E BRUNO CAPELAS

Com um discurso de oposição aos grandes bancos, a startup brasileira Nubank, que desenvolve­u um cartão de crédito controlado por aplicativo, anunciou ontem que vai oferecer uma conta corrente digital. O serviço será oferecido nas próximas semanas para alguns dos atuais 2,5 milhões de clientes, mas a empresa pretende abrir o cadastro para qualquer brasileiro até o primeiro trimestre de 2018. Mais do que apenas um novo serviço, a NuConta mostra que a startup brasileira começou a trilhar um longo caminho para transforma­r-se em um banco, com diversos serviços financeiro­s.

Porém, a NuConta está longe de ser uma conta bancária completa. Por ora, os correntist­as conseguem transferir dinheiro para quem tem conta da empresa e também para outros bancos, por meio de TEDs gratuitos, além de pagar a fatura de seu cartão de crédito Nubank. A lista de funções que faltam é extensa: não há cartão de débito, não é possível depositar ou sacar dinheiro em um caixa eletrônico nem pagar boletos.

“Eles estão lançando o MVP de uma conta corrente”, explica Mike Ajnsztajn, fundador da acelerador­a Ace, em referência à sigla em inglês para produto mínimo viável, nome dado ao protótipo de um serviço que pode ser testado pelo público, mas ainda está em processo de desenvolvi­mento. “O teste é o início de muitas coisas. O Nubank quer aprender a operar como um banco.”

O próprio Nubank tem ciência das limitações e pretende adicionar novos recursos nos próximos meses. “Se percebermo­s que (o cartão de débito) é importante para nossos clientes, vamos lançar”, disse o cofundador e presidente executivo do Nubank, David Vélez. “Somos uma startup com uma visão de muito longo prazo e, no futuro, o dinheiro será digital.”

Poupança melhorada. Para atrair interessad­os, a Nubank tenta fazer o dinheiro dos clientes “render”. A empresa vai aplicar os valores depositado­s na conta em títulos do Tesouro Direto baseados na Selic, a taxa básica de juros da economia, que está em 8,25% ao ano. O rendimento, porém, será repassado ao consumidor a uma taxa equivalent­e a 99% do CDI (Certificad­o de Depósito Interbancá­rio). A diferença será usada pelo Nubank para cobrir custos operaciona­is do serviço. “Não queremos ganhar dinheiro”, diz Vélez, afirmando que pretende tornar a NuConta uma opção para 60 milhões de brasi- leiros que não têm acesso a serviços bancários em todo o País.

Segundo o diretor de inovação da consultori­a Accenture, Guilherme Horn, a estratégia vai ajudar a Nubank a conseguir novos clientes, em especial os que já têm conta em outro banco. “Isso tira a resistênci­a em abrir uma conta, pois eles remuneram melhor o dinheiro”, diz.

Para o professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV-SP), Adrian Kemmer Cernev, a Nubank conseguiu tirar algo positivo de uma restrição que tem por ser instituiçã­o de pagamento e não banco – a empresa já pediu, há dois anos, uma licença ao Banco Central para operar como banco, mas ainda não recebeu aval. Por isso, ela é obrigada a depositar os valores dos clientes no Banco Central ou comprar títulos públicos. “O Nubank inova ao devolver essa remuneraçã­o para seu cliente”, diz Cernev. “Não vi nenhum rival fazendo isso.”

Regulação. Vélez descartou que o lançamento da NuConta seja uma forma da empresa captar recursos e se preparar para uma eventual mudança no setor de cartões com a redução do prazo de pagamentos ao lojista, de 30 dias para dois dias.

Em debate no ano passado, comentava-se que a mudança traria impactos para empresas como o Nubank, que não conta com recursos para fazer frente ao pagamento imediato. Cristina Junqueira, cofundador­a do Nubank, garantiu que esse tema não está em discussão, afirma que esteve em Brasília e que mantém conversas com o Banco Central. “O lançamento da Nu Conta não tem necessaria­mente relação com eventual mudança (no prazo de pagamento ao lojista)”, explicou, em conversa com jornalista­s.

A empresa aproveitou o lançamento para reafirmar sua posição contra os bancos tradiciona­is. “Ao criar a conta, começamos com uma página em branco”, disse Vélez. “Imaginamos algo para os dias de hoje, sem burocracia e taxas abusivas.”

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TIAGO QUEIROZ / ESTADÃO Alternativ­a. Vélez, do Nubank, quer atingir os 60 milhões de brasileiro­s sem acesso a serviços bancários
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