O Estado de S. Paulo

O tempo na política

A um ano das eleições, a maré parece favorecer quem consolida a imagem aos poucos.

- VERA MAGALHÃES E-MAIL: VERA.MAGALHAES@ESTADAO.COM TWITTER: @VERAMAGALH­AES POLITICA.ESTADAO.COM.BR/BLOGS/VERA-MAGALHAES/

Michel Temer ganhou tempo. É provável que a decisão apertada da Câmara pelo arquivamen­to da segunda denúncia de Rodrigo Janot tenha lhe garantido a conclusão do mandato, em dezembro de 2018. Mas esse tempo é suficiente para que o vice que ascendeu ao poder após a queda de Dilma Rousseff deixe algum legado capaz de apagar a impopulari­dade recorde e o “feito" de ter sido o primeiro e único presidente denunciado por crimes supostamen­te ocorridos no exercício do mandato? Difícil.

Um ano é pouco para pôr em mar- cha uma agenda legislativ­a ambiciosa e uma administra­ção eficiente e inovadora. Por outro lado, pode ser uma eternidade para alguém que terá de monitorar o humor de aliados de toda uma vida que estão presos e podem resolver falar.

O tempo na política não é linear, e, se não é usado com sabedoria, pode ser fatal para reputações, mandatos e pretensões eleitorais. Temer não é o único político a ter a ampulheta como ameaça. Basta ver o exemplo de Aécio Neves. Saiu fortalecid­o das urnas em 2014, com mais de 49 milhões de votos, disposto a levar a cabo uma ação para cassar Dilma Rousseff e creden- ciado para liderar a oposição.

Três anos depois, tenta se reestrutur­ar para disputar uma eleição de deputado federal que lhe garanta foro privilegia­do para responder às graves acusações que pesam contra ele, depois de escapar de ser afastado do mandato. E mesmo o projeto “humilde” de voltar à Câmara parece arriscado para alguém que viu corroída sua credibilid­ade na velocidade da luz.

Ainda no PSDB há outro exemplo de como o mau gerenciame­nto do “timing” pode levar a pique até projetos eleitoralm­ente viáveis. Parece ser esse, hoje, o caso do prefeito paulistano João Doria Jr. – cujo perfil, escrevi mais de uma vez neste espaço, tinha tudo para encaixar no que o eleitorado parece buscar em 2018.

Mas a pressa e a inexperiên­cia política fizeram com que Doria “acelerasse” demais, abusando do próprio bordão. O prefeito queimou a largada e ameaça bater no muro caso não saiba replanejar a corrida.

Recém-eleito no primeiro turno numa cidade com gestão mais complexa do que um bom networking pode garantir, Doria se pôs sem disfarçar em campanha à Presidênci­a, passando ao seu eleitor a ideia de que quer se livrar do pepino e ao padrinho, Geraldo Alckmin, a mensagem de deslealdad­e. Uma combinação fatal.

Tomou o risco baseado numa expectativ­a, que lhe foi vendida pelos acólitos e por um time já designado para 2018, de que viraria sensação nacional e rapidament­e “escalaria” nas pesquisas. Pode até ter se tornado mais conhecido fora de São Paulo, mas isso não se rendeu imediatame­nte altos índices de intenção de votos capazes de desafiar a primazia de Alckmin no partido.

Mais experiente, ainda que menos vistoso, o governador fez o oposto do pupilo e soube usar o tempo a seu favor. Seu mandato não tem bordão nem grandes marcas, mas tem o alicerce de uma longa dinastia tucana no mais poderoso Estado do País.

Alckmin também não foi afoito ao tentar queimar Aécio na fogueira partidária — algo que provavelme­nte o mineiro teria feito, se as posições estivessem invertidas. Com isso, conseguiu se aproximar de seu grupo e aumentar sua antes limitada influência interna.

A um ano das eleições a maré parece favorecer quem vem consolidan­do uma imagem aos poucos, e de forma persistent­e. Os menos de 12 meses que nos separam das urnas vão mostrar como cada um dos atores da sucessão – do próprio presidente aos contendore­s – vão se firmar ou virar pó numa realidade política que muda cada vez mais rápido, mas na qual às vezes correr demais não é o mais indicado.

Ele não é linear e, se não é usado com sabedoria, pode ser fatal para reputações e pretensões

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