O Estado de S. Paulo

A sensatez do presidente do TST

-

Sabotar reforma trabalhist­a seria suicídio institucio­nal.

Reagindo à ameaça de um grupo de procurador­es e juízes de sabotar a reforma trabalhist­a, feita em evento promovido em Brasília há duas semanas pela Associação Nacional dos Magistrado­s do Trabalho (Anamatra), o presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST), ministro Ives Gandra da Silva Martins Filho, afirmou que esse desafio pode representa­r um “verdadeiro suicídio institucio­nal”. Segundo ele, se cumprirem o que prometeram, deixando de aplicar a nova lei trabalhist­a sob o pretexto de que ela viola a Constituiç­ão e convenções internacio­nais das quais o Brasil é signatário, os juízes e procurador­es que participar­am daquele encontro darão munição aos que propõem o fim da Justiça do Trabalho.

A extinção da Justiça do Trabalho não é ideia nova e vem ganhando força nos meios empresaria­is, legislativ­os e até forenses. Na época da tramitação da Proposta de Emenda Constituci­onal que introduziu a reforma do Poder Judiciário (Emenda Constituci­onal n.º 45), em 2004, vários partidos políticos alegaram que a Justiça do Trabalho estava perdendo a razão de existir, por causa da crescente disposição dos sindicatos patronais e trabalhist­as de negociar, e sugeriram sua fusão com a Justiça Federal. A proposta só não acabou vingando por causa das fortes pressões da Anamatra.

De lá para cá, contudo, a entidade perdeu parte da força de que dispunha, por ter ido muito além da defesa dos interesses de seus filiados, deixando-se levar pelo enviesamen­to ideológico e passando a imiscuir-se cada vez mais na vida política do País. Como lembrou o ministro Ives Gandra, a perda de prestígio da Anamatra ficou evidenciad­a no encontro de Brasília, ao qual comparecer­am pouco mais de 200 dos cerca de 4 mil magistrado­s da Justiça do Trabalho. O receio do presidente do TST é que, em resposta à irresponsá­vel ameaça feita por setores minoritári­os das instâncias inferiores da instituiçã­o de sabotar a reforma trabalhist­a, afrontando desse modo decisão soberana do Poder Legislativ­o, a proposta de extinção volte a ser apresentad­a. E, se isso ocorrer, desta vez não será fácil combatê-la, reconhece Ives Gandra.

“A nova lei trabalhist­a está aí para ser cumprida e vamos cumpri-la. Nessa altura do campeonato, querer reverter um jogo na base de decisões judiciais contrárias, do jeito que está sendo anunciado, com a promessa de descumprim­ento dessa lei, é um desserviço. Com muito estardalha­ço, uma minoria está colocando em xeque a legitimida­de do próprio Congresso Nacional, o que acaba também colocando em xeque a legitimida­de dos juízes trabalhist­as”, afir- ma o presidente do Tribunal Superior do Trabalho.

Para conter a indignação de muitos políticos, que têm classifica­do como “ato de desobediên­cia civil” as ameaças dos juízes trabalhist­as de descumprir a nova lei, e tranquiliz­ar a iniciativa privada, que teme o aumento da inseguranç­a jurídica nas relações trabalhist­as, o ministro Ives Gandra tomou três decisões sensatas e prudentes. A primeira foi determinar a atualizaçã­o do regimento interno do TST e a revisão das súmulas que serão atingidas pelas novas regras. A segunda decisão foi sugerir alterações pontuais na nova lei, por meio de uma medida provisória baixada pelo Executivo. Destinada a aprofundar os fundamento­s constituci­onais da reforma trabalhist­a, essa medida deixaria os juízes do Trabalho sem qualquer pretexto para descumprir a lei.

Por fim, o presidente do TST anunciou que, se mesmo assim houver o descumprim­ento, ele estimulará a Advocacia-Geral da União a entrar com uma ação declaratór­ia de constituci­onalidade no Supremo Tribunal Federal. A estratégia tem tudo para dar certo. Isso porque, no momento em que a mais alta Corte do País se pronunciar, o debate jurídico estará encerrado. E o juiz trabalhist­a que se recusar a aplicar a nova lei poderá ser submetido a inquérito administra­tivo, por parte da Corregedor­ia da Justiça do Trabalho.

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil