O Estado de S. Paulo

Um retrato dramático do ensino

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Divulgados pelo Ministério da Educação (MEC), os números da terceira edição da Avaliação Nacional da Alfabetiza­ção (ANA) de 2016 são desalentad­ores, principalm­ente quando se consideram temas como o cresciment­o do País, a redução das desigualda­des sociais e econômicas e a conquista de melhores padrões de bem-estar. A avaliação consiste em duas provas – uma de leitura e escrita e outra de matemática – que foram aplicadas em 14 e 15 de novembro de 2016 a 2,1 milhões de alunos de 48 mil escolas da rede pública de ensino fundamenta­l. Aprovado em 2014, o Plano Nacional de Educação prevê a alfabetiza­ção de todas as crianças até o final do terceiro ano desse ciclo educaciona­l. O que as autoridade­s educaciona­is esperam desses alunos é que eles sejam capazes de entender o sentido dos verbos, reconhecer participan­tes de diálogos em entrevista­s ficcionais e reconhecer a relação de tempo em verbos.

O resultado da avaliação é assustador, mostrando que o Brasil continua perdendo a corrida educaciona­l, dado o fosso entre essas metas e a dramática realidade do ensino fundamenta­l oferecido pelo poder público às novas gerações. Segundo a ANA, mais da metade dos alunos avaliados – dos quais 90% eram crianças de oito anos de idade – mos- trou-se incapaz, mesmo tendo passado por três anos de escolariza­ção, de ter a proficiênc­ia esperada para sua faixa etária. Os números mostram que não sabem localizar, ler e compreende­r informaçõe­s constantes de textos de literatura infantil, de entender anedotas desenhadas em tirinhas e de realizar as operações aritmética­s mais simples, como soma e subtração.

Mais grave ainda, os níveis de alfabetiza­ção desses estudantes está estagnado no mesmo padrão de insuficiên­cia de dois anos atrás. Em matemática, por exemplo, 54,5% dos estudantes do terceiro ano do ensino fundamenta­l revelaram baixo nível de proficiênc­ia em 2016, ante 57% na segunda edição da ANA, que foi realizada em 2014. Eles não conseguem nem mesmo ler horas num relógio analógico, nem somar duas parcelas. Em leitura, 54,7% das crianças revelaram baixo nível de proficiênc­ia no ano passado, ante 56,1% na avaliação de dois anos atrás. E, em escrita, 34% dos alunos avaliados mostraram não saber redigir corretamen­te palavras com diferentes estruturas silábicas.

Já o número de alunos que demonstrar­am capacidade considerad­a suficiente de leitura passou de 43,83% para 45,27% do total de matriculad­os no terceiro ano do ensino fundamenta­l. Em matemática, o número de alunos com proficiênc­ia adequada para a faixa etária passou de 42,93% para 45,53%, entre 2014 e 2016. Na prova que avalia o desempenho na escrita, um terço dos alunos do terceiro ano mostrou desempenho insuficien­te. O quadro também é desolador em termos de comparação regional. A avaliação mostrou que, nas Regiões Nort e e Nor d e s t e , 7 0 , 2 1 % e 69,15% dos estudantes, respectiva­mente, têm nível insuficien­te em leitura. Nas Regiões Sudeste e Sul, os números são de 43,69% e 44,92%, respectiva­mente.

Resultante­s de décadas de políticas marcadas por prioridade­s equivocada­s e orientação populista, que arrasaram a rede pública de ensino fundamenta­l, os números da terceira edição da ANA voltam a mostrar um grave gargalo do sistema educaciona­l brasileiro. Deixam claro que, nos anos seguintes ao terceiro ano do ensino fundamenta­l, esses estudantes com baixíssimo nível de proficiênc­ia em escrita, leitura e matemática não terão preparo e habilidade­s básicas para aprender outras disciplina­s, como química, física, biologia e estatístic­a.

Esses estudantes não terão a formação necessária para romper o círculo vicioso do atraso cultural, da desigualda­de socioeconô­mica e da pobreza, nem para dotar o País do capital humano de que ele tanto necessita para retomar o cresciment­o e passar a níveis mais sofisticad­os de produção.

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